Na celebração Abril Indígena, a instituição apresenta oficialmente a plataforma digital com dicionários bilingues Kanoé-Português, Oro Win-Português, Puruborá-Português, Sakurabiat-Português, Salamãi-Português, Wanyam-Português e o dicionário de Lugares Sagrados do Povo Medzeniakonai. Eles estão disponíveis ao público a partir deste sábado (19), e também serão acessíveis de modo offline.
Agência Museu Goeldi – O Museu Paraense Emílio Goeldi – MPEG celebra o mês dos Povos Indígenas com uma programação diversificada entre os dias 16 e 19 de abril. Entre as novidades deste ano está o lançamento da plataforma digital Dicionários Multimídia para Línguas Indígenas, que será realizado no dia 19, sábado, às 10h, no auditório do Centro de Exposições do Parque Zoobotânico da instituição, com palestra da linguista, coordenadora do projeto e pesquisadora titular do Museu Goeldi, Ana Vilacy Galúcio.
Os dicionários multimídia são uma tecnologia social que contribui para o fortalecimento e revitalização das línguas indígenas. No Museu Goeldi, os estudos são direcionados especialmente para a Amazônia brasileira, lugar de grande diversidade linguística, mas que também sofre com a crescente redução do número de falantes das línguas.
A instituição científica sediada na Amazônia Paraense está tornando disponíveis sete dicionários bilíngues: Kanoé-Português, Oro Win-Português, Puruborá-Português, Sakurabiat-Português, Salamãi-Português, Wanyam-Português e o dicionário de Lugares Sagrados do Povo Medzeniakonai. E a equipe da Linguística do Museu Goeldi, sob a liderança de Ana Vilacy, já trabalha no desenvolvimento de mais três dicionários multimídia.
Na plataforma, é possível acessar os dicionários de modo online, mas também como aplicativos para Android, em HTML ou em arquivos no formato PDF. Estas opções possibilitam o uso da tecnologia mesmo quando não houver conexão com a internet. Cada dicionário possui particularidades de acordo com a língua em questão, apesar da metodologia aplicada ser a mesma para todos. Os dicionários são compostos por uma introdução sobre a língua, categorias de palavras, um campo de busca, a palavra em sua forma escrita, a transcrição fonética da palavra, um player em que é possível ouvir a pronúncia correta de cada palavra e uma imagem ilustrativa.
A pesquisadora do MPEG Ana Vilacy destaca o valor educacional dos dicionários para a sociedade em geral, e para os povos indígenas, em particular. “É uma forma de você trazer informações sobre as línguas, um pouco de conhecimento de forma lúdica também, para facilitar o acesso de uma forma geral e despertar a consciência para a variedade de línguas faladas no país”.
A produção dos dicionários multimídia ressalta a importância histórica do Museu Goeldi na pesquisa e documentação das línguas indígenas, na formação de novos pesquisadores na área da Linguística, na inovação tecnológica que viabilizou a elaboração dos dicionários e suas constantes melhorias, além do valor educacional, da conservação das línguas como principal meio de expressão dos povos indígenas e da riqueza multiétnica do Brasil.
Demanda dos Povos Indígenas – Enquanto tecnologia social, o projeto teve início em 2019, a partir de uma demanda vinda diretamente de José Augusto Kanoé, cacique da comunidade Kanoé, da Terra Indígena Rio Guaporé, no estado de Rondônia, para a equipe do Museu Goeldi. O pai do cacique foi um dos últimos falantes da língua Kanoé, e para incentivar e fortalecer o uso da língua pelos mais novos, a cooperação de mais de quatro décadas com o Museu Goeldi foi fundamental. A partir do trabalho de documentação feito por pesquisadores da instituição nos anos 1980 e 2000, foi possível elaborar o primeiro dicionário multimídia Kanoé-Português.
“Aqui a gente tá usando conforme vai falando com as crianças. E quando a gente não tem certeza que é aquela palavra, a gente vai e abre o dicionário. Quase todas as coisas eu sei falar, agora os meninos ainda precisam do dicionário. Mas todos eles têm o aplicativo do dicionário, nós daqui de casa temos e é muito bom. Está facilitando muito”, explica o cacique José Augusto Kanoé.
Metodologia – Os Dicionários Multimídia para Línguas Indígenas foram desenvolvidos utilizando softwares de códigos abertos (open source), de fácil acesso e que podem ser reaplicados para qualquer língua. O pesquisador e bolsista de capacitação institucional Saulo Brito é o responsável por desenvolver os protocolos de como utilizar a tecnologia social.
“A ideia é justamente essa, que seja uma opção de software livre, para qualquer pessoa que queira fazer um dicionário, não só na área de linguística. Então a gente tem um script em Python e aí a pessoa baixa esse script, também está disponível em uma versão em excel, caso a pessoa não saiba mexer com Python, para facilitar. E aí o que a pessoa precisa fazer é só abrir uma planilha, adicionar os dados da cada entrada lexical, de cada entrada do documento que ela está querendo produzir e organizar as mídias em pastas”, explica Saulo Brito. Ideia boa contagia e logo se espalha. Saulo, fala com vibração que outras instituições já estão reaplicando os protocolos desenvolvidos no Museu Goeldi para a produção de novos dicionários.
O pesquisador Matheus Soares, integrante da equipe, aplicou os protocolos para a elaboração do dicionário multimídia da língua Puruborá, como projeto de iniciação científica no Museu Goeldi e como Trabalho de Conclusão do Curso de Letras, na Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA). Matheus destaca a importância do projeto para a sua formação enquanto pesquisador em Linguística. “Quando a gente trabalha com dicionário, principalmente no dicionário de uma língua que não é a nossa, a gente mexe com muitos aspectos diferentes, então a gente tem que estar constantemente fazendo esse processo de formação. E trabalhando aqui [no Goeldi], desde a iniciação científica, a gente consegue ter esse contato maior e ampliar esses horizontes”, avalia Matheus.
A principal fonte de informação para a produção do dicionário Puruborá-Português foram os registros coletados com os anciãos do povo Puruborá, originário de Rondônia e que aguarda demarcação de seus territórios. Ana Vilacy explica que o processo iniciou com a contribuição de idosos já falecidos. “Muitas dessas pessoas já não estão mais aqui, já ancestralizaram, mas temos alguns registros que gravamos, documentamos. Então, a partir da oralidade dos anciãos, foi possível gravar algumas coisas e produzir esse material multimídia que traz a palavra escrita, o som, informações sobre categorias gramaticais e transcrição”, pontua a pesquisadora.
O professor Mário Puruborá, do Povo Puruborá, enfatiza como o uso do dicionário tem contribuído para o fortalecimento e revitalização da língua Puruborá entre as novas gerações. “Falo sempre assim, aquele material é muito bom para aprender. Se na minha época que eu comecei a aprender, se eu tivesse um material daquele porte, eu tinha desenvolvido mais rápido o aprendizado. Ele é muito completo, tem todas as informações ali”.
Com o uso dos dicionários, novas gerações de jovens indígenas estão podendo aprender a língua falada pelos seus ancestrais.
A programação completa do Abril Indígena é um diálogo com protagonistas indígenas do campo audiovisual (Pat-i Bepbere Kayapó), do conhecimento da flora amazônica, das práticas de saúde (Pedro Paulo Kayapó, Banhire Kayapó) com especialistas do Museu Goeldi (Pedro Glécio e Vilacy Galúcio) e da Universidade Federal do Pará, como o historiador Márcio Couto Henrique, editor associado do centenário Boletim de Ciências Humanas do Museu Goeldi e professor do Programa de Diversidade Sociocultural do MPEG. Veja abaixo a programação completa.
Programação Abril Indígena Museu Goeldi
16/04 (Campus de Pesquisa):
14h30 – Palestra “A câmera é nossa arma: os desafios atuais para os Mebêngôkre-Kayapó”, com Pat-i Bepbere Kayapó.
17/04 (Campus de Pesquisa):
9h – Palestra “Saberes Enraizados: A Botânica dos Povos Indígenas”, com Pedro Paulo Kayapó, Banhire Kayapó e Dr. Pedro Glécio.
14h – Atividade prática “Semeando Saberes”, com plantio de espécies amazônicas em frente ao Herbário.
19/04 (Parque Zoobotânico):
10h – Palestra sobre línguas indígenas e lançamento do site Dicionários Multimídia para Línguas Indígenas, com Dra. Ana Vilacy.
10:40h – Palestra “Identidades Indígenas na Belle Époque”, com Dr. Márcio Couto.
Texto: Denise Salomão / Edição: Joice Santos / Publicado em: Museu Goeldi lança plataforma com sete Dicionários Multimídias para Línguas Indígenas — Museu Paraense Emílio Goeldi – VER GALERIA DE FOTOS
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