Entenda a importância da iniciativa pioneira, que envolve parceria com a  Universidade de Stanford e Universidade Federal de Santa Maria.

Torre de fluxo em meio à floresta de várzea da Reserva Mamirauá. Foto: © Miguel Monteiro -Imagem postada em: Instituto Mamirauá

Despontando acima da copa das árvores da Reserva Mamirauá, uma estrutura metálica se destaca na paisagem amazônica. Trata-se da Torre de Fluxo do Mamirauá, que chega a 48 metros de altura e é equipada com sensores que irão monitorar pelos próximos anos as emissões de gases de efeito estufa pelas florestas de várzea, em especial o gás metano, importante gás no processo de aquecimento global.

Diante da necessidade de se compreender a dinâmica dos gases de efeito estufa a nível mundial, visto que têm impacto direto sobre as mudanças climáticas, pesquisadores do Instituto Mamirauá, Stanford University e Universidade Federal de Santa Maria formaram uma parceria para preencher uma importante lacuna de conhecimento. Apesar dos ecossistemas tropicais serem responsáveis pela emissão de 50-60% de todo o gás metano oriundo de áreas úmidas no mundo, existem poucas estações de medição e monitoramento deste gás nestas regiões, e nenhuma em florestas de várzea da Amazônia – até agora.

Com financiamento da Fundação Gordon & Betty Moore, o projeto realizou a construção de uma torre de fluxo que abriga instrumentos avançados de medição de gás metano, gás carbônico e vapor d’água, além de diversos outros equipamentos para medir variáveis hidrometeorológicas. A torre foi construída em meio à Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, maior área protegida de áreas úmidas continentais do Brasil, sendo também o primeiro sítio Ramsar do Brasil, reconhecida internacionalmente por sua importância ecológica.

Segundo Lady Custódio, pesquisadora do Instituto Mamirauá, “a fase de construção da torre enfrentou desafios devido às particularidades do ambiente de várzea. Foi necessário acompanhar cuidadosamente o ritmo da enchente para planejar a logística. Apesar das dificuldades, o sucesso da construção e a obtenção dos primeiros dados de monitoramento foram motivo de grande satisfação, marcando o início de uma etapa promissora para a pesquisa ambiental na região”.

O monitoramento dos gases de efeito estufa com a torre de fluxo permitirá, pela primeira vez, coletar dados sobre a emissão destes gases de maneira contínua em florestas de várzea, analisando a variação ao longo dos períodos de seca e cheia, onde o nível da água pode variar de 10 a 12 metros por ano.

“Existe uma discrepância muito grande entre o levantamento realizado por satélites da emissão de gases de efeito estufa em ambientes tropicais e as estimativas modeladas para essas áreas. Se sabe muito pouco sobre a dinâmica de gases de efeito estufa em áreas de floresta de várzea, especialmente do gás metano ”, comenta Ayan Fleischmann, pesquisador titular do Instituto Mamirauá e um dos coordenadores do projeto. “Por isso se faz necessário a construção da torre de fluxo e a integração destas medições com dados de abrangência mundial, para podermos avaliar melhor o papel que as florestas de várzea da Amazônia têm na dinâmica global de gases de efeito estufa”, ressalta.

Neste intuito, a Torre de Fluxo do Mamirauá fará parte de redes de torres espalhadas por todo o mundo, contribuindo com dados inéditos e essenciais oriundos de áreas úmidas da Amazônia. A torre irá integrar a Rede FLUXNET-CH4, um banco de dados internacional de torres de fluxo localizadas em diversos ecossistemas, e o LBA (Programa de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia) coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas na Amazônia, que há 25 anos busca compreender as dinâmicas ambientais da Floresta Amazônica e seu papel na regulação do clima, em escala regional e global.

Segundo Daniel Michelon, pesquisador do Instituto Mamirauá e da Universidade Federal de Santa Maria, “medir de forma contínua e precisa as trocas de metano entre o solo e a atmosfera fornece dados essenciais para entender as fontes e os processos de emissão nesse ecossistema específico. Além disso, esses dados ajudam a quantificar o impacto da região nas emissões globais de gases de efeito estufa, oferecendo informações valiosas para políticas de mitigação das mudanças climáticas e para o manejo sustentável da floresta”.

A Reserva Mamirauá, além de ser um excelente local para a construção da mais nova torre de fluxo, também abriga centenas de comunidades ribeirinhas e indígenas, cujos modos de vida estão intimamente ligados ao ciclo hidrometeorológico da região. Assim, o projeto da Torre de Fluxo do Mamirauá terá várias ações para engajar as comunidades locais, além da geração de renda proveniente do envolvimento de comunitários nas ações relacionadas à construção e manutenção da torre. O projeto prevê a participação da escola local de São Raimundo do Jarauá, comunidade mais próxima da torre, com atividades educativas diretamente na área da torre e trocas de conhecimento sobre mudanças climáticas e seus impactos na região com os estudantes e comunitários.

A Torre de Fluxo do Mamirauá é um importante marco no avanço do conhecimento sobre a dinâmica ambiental de áreas úmidas da Amazônia, ecossistema de grande relevância socioeconômica e biológica, porém sub-representado em pesquisas científicas. Os dados coletados também serão essenciais para melhor compreender quais serão os impactos e o papel da Floresta Amazônica nas mudanças climáticas. O apoio e participação de comunidades tradicionais, instituições nacionais e estrangeiras tornam o projeto ainda mais pertinente, solidificando o seu alcance local, regional e internacional.

Texto: Miguel Monteiro

FONTE: INSTITUTO MAMIRAUÁ – Instituto Mamirauá constrói a primeira torre da Amazônia a monitorar a emissão de gases de efeito estufa em florestas de várzea