Funai repudia declarações equivocadas e reafirma compromisso com a proteção dos direitos indígenas e a segurança de seus servidores

Em reunião deliberativa da Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, realizada em 30/10/2024, que tratou, dentre outras matérias, do porte de armas de fogo para integrantes da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em atividades de fiscalização, um dos membros da comissão proferiu uma declaração equivocada ao comentar os assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips. Esta nota visa dissipar tais inverdades e, mais uma vez, esclarecer o caso.

De acordo com o Art. 2º da PORTARIA Nº 666/2017, que aprova o Regimento Interno, a Funai tem por finalidade proteger e promover os direitos dos povos indígenas, em nome da União, assim como formular, coordenar, articular, monitorar e garantir o cumprimento da política indigenista do Estado brasileiro. Essa política é fundamentada nos princípios da garantia do direito originário, da inalienabilidade e da indisponibilidade das terras que tradicionalmente ocupam, assim como do usufruto exclusivo das riquezas nelas existentes.

A proteção territorial é um conceito fundamental que se refere à preservação e defesa das terras habitadas por comunidades indígenas. No Brasil, essa proteção é garantida pela Constituição de 1988, que reconhece o direito dos povos indígenas sobre suas terras tradicionais, as quais são essenciais para a manutenção de suas culturas, modos de vida e sustento. Essa proteção envolve diversas medidas, tais como o combate a invasões motivadas por uma gama variada de interesses econômicos, incluindo caça ilegal, extração de madeira e exploração mineral. Cabe ao Estado brasileiro atuar para garantir a segurança dessas áreas.

A Terra Indígena (TI) Vale do Javari compreende uma área homologada de 8.544.480 hectares, no extremo sudoeste do Estado do Amazonas, na zona trifronteiriça entre Brasil, Peru e Colômbia, entre os rios Javari, Curuçá, Ituí, Itacoaí e Quixito, além dos altos cursos dos rios Jutaí e Jandiatuba. Está inserida no território de sete municípios (Atalaia do Norte, Benjamin Constant, Eirunepé, Ipixuna, Jutaí, Tabatinga e São Paulo de Olivença) e é considerada a segunda maior terra indígena do Brasil, depois da TI Yanomami. O Censo Demográfico realizado pelo IBGE em 2022 contabilizou 5.519 pessoas das etnias Kanamari, Kulina, Pano, Matis, Matsés, Korubo, Tsohom Djapá e Marubo vivendo ali, além de povos isolados. O Vale do Javari é a região com maior concentração de povos isolados em todo o planeta, com 19 registros de indígenas isolados. A área, que tem quase o tamanho de Portugal, é rota de entrada de tráfico de drogas e sofre com pesca e caça ilegais, além do garimpo. Os ilícitos são organizados por quadrilhas armadas e influentes no poder local.

Foi nessa região que Bruno Pereira iniciou sua atuação no indigenismo de Estado, em 2010. Ele foi coordenador da unidade regional responsável pela TI Vale do Javari, onde atuou durante anos. Em 2018, assumiu a Coordenação Geral de Índios Isolados e Recém Contatados (CGIIRC) e chefiou uma importante expedição de contato com os Korubo. Bruno estava colaborando com a organização indígena Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari) no planejamento de ações de proteção do território quando foi brutalmente assassinado. Deixou um imenso legado para a política de proteção de indígenas isolados, área na qual se tornou um dos principais especialistas no país e na qual atuava com extrema dedicação. O indigenista era considerado uma grande referência, tanto por colegas quanto por indígenas.

É importante frisar que as mortes de Bruno Pereira e Dom Phillips não são casos isolados. Casos de ameaças à vida dos servidores desta Fundação, que atuam na proteção dos territórios indígenas, são recorrentes pelo país. Na região do Vale do Javari, percebe-se a escalada da violência especialmente a partir de 2018. Somente naquele ano, a Base de Proteção Etnoambiental da Funai, responsável por monitorar e controlar o acesso à TI Vale do Javari, situada na confluência entre os rios Ituí e Itaquaí, foi alvejada sete vezes. No ano seguinte, Maxciel Pereira dos Santos, ex-militar da Aeronáutica e servidor da Funai no Vale do Javari por mais de doze anos, com grande experiência em operações de combate ao garimpo, exploração ilegal de madeira, caça e pesca ilegais, foi executado aos 34 anos com um tiro na cabeça, no centro da cidade de Tabatinga/AM.

O caso, inicialmente investigado pela Polícia Civil do Amazonas, foi retomado pela Polícia Federal em 2022. Segundo uma nova linha de investigação, Maxciel teria sido executado pelo mesmo grupo de pesca ilegal e narcotraficantes que teriam emboscado e assassinado Bruno Pereira e Dom Phillips em 2022. Ambos os inquéritos ainda estão em curso.

A Funai reitera seu compromisso com a segurança e a integridade física de seus servidores, repudiando veementemente quaisquer ações de violência contra indígenas e indigenistas. A instituição não medirá esforços para garantir que os responsáveis por tais atos sejam devidamente responsabilizados.

Diretoria Colegiada da Funai – Funai repudia declarações equivocadas e reafirma compromisso com a proteção dos direitos indígenas e a segurança de seus servidores — Fundação Nacional dos Povos Indígenas

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