Desastre ambiental na Amazônia e violação de direitos indígenas facilitados por projetos de governança na BR-319

O Ministério dos Transportes planeja “reconstruir” a rodovia BR-319 (Manaus – Porto Velho) (Figura 1), uma estrada que foi abandonada em 1988, mas que desde 2015 vem sendo gradualmente melhorada sob um programa chamado de “manutenção”. A BR-319 agora é transitável, pelo menos na estação seca, mas a implementação do projeto de reconstrução para construir uma nova rodovia na mesma rota ainda não recebeu uma licença ambiental. A reconstrução da rodovia BR-319 conectaria a Amazônia central, que está relativamente intacta, ao notório hotspot de desmatamento conhecido como “AMACRO”, um nome composto pelas siglas dos estados do Amazonas, Acre e Rondônia.

Figura 1. Mapa de terras e comunidades Indígenas impactadas pela rodovia BR-319. – Postada em: Amazônia Real

A rota da rodovia BR-319 passa por um dos blocos mais preservados da floresta amazônica e as estradas planejadas conectando-se à BR-319 abririam a vasta área de floresta a oeste do Rio Purus que é paralela à BR-319. A rodovia também permitiria a migração de desmatadores do “arco do desmatamento” no sul da Amazônia para Roraima, que faz fronteira com a Venezuela no norte da Amazônia, bem como para outras áreas já conectadas a Manaus por estradas. No total, cerca de metade do que resta da floresta amazônica brasileira seria impactada, não apenas a beira da estrada da BR-319 em si, que é o foco do processo de licenciamento e dos esforços de organizações não governamentais (ONGs) para mitigar os impactos. Muito mais informações sobre os impactos do projeto e por que ele deve ser interrompido são publicas.

Um fator-chave que impulsiona o desastre ambiental e social que o projeto BR-319 representa vem de um setor inesperado: várias ONGs ambientais e as fundações que as apoiam. É difícil imaginar uma organização ambiental que não se oponha ao projeto da rodovia BR-319, e muitas, mas não todas, se opõem a ele. O Observatório do Clima, composto por 120 ONGs brasileiras, assumiu uma posição firme contra o projeto da BR-319 e moveu uma ação civil pública (ACP) contra as autoridades ambientais federais por terem concedido uma licença prévia para o projeto. A ação foi julgada favoravelmente em 25 de julho de 2024, suspendendo a licença prévia que havia sido concedida durante a administração presidencial de 2019-2022 de Jair Bolsonaro, e que havia ignorado os pareceres técnicos negativos da equipe de licenciamento para acomodar pressões políticas. A licença prévia não permite a construção da estrada, mas permite preparações significativas para obter uma licença de instalação que permitiria o início da construção da estrada.

ONGs que se recusaram a condenar o projeto da BR-319 assumiram a posição de que a aprovação e execução ambiental do projeto de reconstrução são inevitáveis e que as organizações devem, portanto, ser neutras sobre a questão de se a estrada deve ser construída e se concentrarem apenas em planos de governança depois que a estrada for construída. Desnecessário dizer que a estrada não é um fato consumado e presumir que o projeto é inevitável contribui para torná-lo uma profecia autorrealizável.

Por Lucas Ferrante, Philip M. Fearnside e Monica Piccinini – Amazônia Real 

Conteúdo na íntegra disponível em: Desastre ambiental na Amazônia e violação de direitos indígenas facilitados por projetos de governança na BR-319 – Amazônia Real (amazoniareal.com.br)    

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