BELÉM (PA) – Cerca de 450 famílias indígenas, quilombolas e ribeirinhas do Vale do Acará, localizado no município homônimo, no nordeste do Pará, ocupam a sede da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas), em Belém, nesta terça-feira, 24, como forma de protesto contra a multinacional Norsk Hydro e o governo do Estado. A manifestação ocorre no bairro do Marco, onde os grupos denunciam possíveis irregularidades no licenciamento ambiental concedido pelo governo, que, segundo eles, permite que a mineradora realize obras que impactam diretamente seus territórios sem a devida consulta e estudos de impacto socioambiental.
As comunidades afetadas afirmam que o mineroduto da Hydro passa por mais de 30 quilômetros de suas terras, com obras de manutenção que incluem a substituição de tubulações e a instalação de novas infraestruturas. A líder indígena cacica Mirian Tembé, em entrevista à CENARIUM, destacou o que ela diz ser um descaso da empresa e do governo estadual com os direitos dos povos tradicionais.
“A nossa principal reivindicação é que nossos direitos sejam respeitados. A mineradora entrou no nosso território sem consulta prévia e está destruindo nossas terras. Estamos aqui exigindo que essas licenças irregulares sejam revistas e que o governo nos dê uma resposta”, afirmou Mirian.
Além das comunidades indígenas Tembé e Turiwara, quilombolas da Amarqualta e ribeirinhos também participam da ocupação. Os manifestantes chegaram ao local por volta das 8h e impediram a entrada de alguns funcionários da Semas, segurando cartazes e entoando palavras de ordem contra a Hydro e o governo. O grupo tentou acessar o prédio para entregar suas demandas, mas foi barrado, levando a negociações com representantes da Secretaria e da Polícia Militar do Pará (PMPA) na parte externa do prédio.
Eliete Santos, representante das mulheres quilombolas, também expressou indignação com a situação. À reportagem, ela disse que, além de enfrentar o impacto ambiental, as comunidades sofrem com a ausência de serviços essenciais, como transporte escolar para seus filhos. “Estamos pedindo nossos direitos. Viemos para conversar com a Semas, mas fomos vetados na entrada. Eles estão liberando licenças para a mineradora sem consultar as comunidades, e isso está adoecendo nosso povo. Não vamos sair daqui até termos uma resposta”, afirmou.
A ocupação é mais um episódio na longa disputa entre as comunidades tradicionais e a Hydro, que já enfrenta acusações anteriores de contaminação e destruição ambiental na região amazônica. Segundo os manifestantes, a empresa tem contado com o apoio das forças policiais do Estado para garantir a continuidade de suas atividades, o que, para eles, representa uma violação de seus direitos.
As comunidades prometem manter a ocupação até que suas reivindicações sejam atendidas, exigindo que o governador Helder Barbalho e o secretário da Semas, Raul Protázio Romão, se posicionem e cessem as obras que, segundo eles, estão destruindo seus territórios. “Nós viemos para ficar”, enfatizou Eliete Santos.
A CENARIUM procurou a Semas, o governo do Estado e a Hydro para se pronunciar oficialmente sobre as alegações feitas pelas comunidades. Confira as notas a seguir:
Semas
“A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas) informa que a licença ambiental da empresa Norsk Hydro segue a legislação e está vigente”.
Hydro
“A Mineração Paragominas informa que segue buscando o diálogo aberto e transparente para promover o desenvolvimento sustentável da região onde opera. Em sinal de respeito aos direitos das comunidades, na manhã desta terça (24), foi realizada uma reunião de alinhamento com representantes das comunidades indígenas Turiwara para compreender as falas e pleitos apresentados. Esses princípios fazem parte dos valores fundamentais que norteiam a companhia.
A MPSA reforça que não compactua com atos violentos que coloquem em risco a segurança da comunidade, de seus empregados e contratados.
Desde o dia 13 de setembro, a manutenção preventiva do mineroduto em Acará (PA) foi paralisada após pessoas, que se identificaram como indígenas e que informam viver aos arredores da Terra Indígena Turé-Mariquita, impedirem o acesso de funcionários da Mineração Paragominas (MPSA) às suas faixas de servidão situadas na região do Acará. No dia 22 de setembro, foram identificados danos à infraestrutura elétrica e depredação de equipamentos da companhia.
A MPSA obteve junto à Justiça decisão judicial que garante o direito de acesso às suas faixas de servidão, assegurando o direito de realizar suas atividades de manutenção, essenciais para a segurança das operações, das pessoas e do meio ambiente dessa área. Esta manutenção é realizada nos limites das faixas de servidão do mineroduto e da linha de transmissão, que, nesta região, estão localizadas em área unicamente de plantação de dendê. No entanto, os bloqueios ilegais impedem tais atividades de manutenção de extrema importância.
A empresa ressalta que suas faixas de servidão do mineroduto e linha de transmissão não passam por território indígena e área de influência, conforme consulta à Funai no processo de licenciamento e legislação vigente. Além disso, o bloqueio foi realizado em via de livre trânsito ao público, cujo acesso é garantido a todos.
O mineroduto e a linha de transmissão são devidamente licenciados pelas autoridades competentes e suas respectivas atividades de manutenção obrigatórias à garantia do bom funcionamento e segurança do empreendimento, sendo certo que a SEMAS realiza constantes vistorias nas atividades desenvolvidas.
Sobre a questão quilombola da comunidade Amarqualta, a Mineração Paragominas informa que o Estudo de Componente Quilombola (ECQ) das comunidades da Amarqualta foi protocolado no Incra em agosto de 2023. Em paralelo, a MPSA tem buscado o diálogo com a comunidade para realização de obras em adição ao Plano Básico Ambiental Quilombola (PBAQ) e buscado antecipar a sua execução para mitigar qualquer impacto da manutenção preventiva do mineroduto.
Em outubro do mesmo ano, a autarquia reconheceu a regularidade da atuação da MPSA e o respeito dos interesses das comunidades quilombolas potencialmente afetadas pelo trabalho.
Todo o processo de elaboração do ECQ e PBAQ da Amarqualta está sendo devidamente acompanhado pelo Incra, observando as fases e requisitos impostos pela Portaria Interministerial n. 60/2015. A companhia executa regularmente o estudo e o PBAQ de acordo com a legislação aplicável e em conformidade com as exigências do licenciamento ambiental junto à Semas e o Incra.
A empresa reafirma seu compromisso com o respeito e o diálogo contínuo com as comunidades no entorno de seus empreendimentos, além de seu foco no desenvolvimento sustentável da região e no bem-estar de todos os envolvidos. A companhia continua dedicada a conduzir suas ações de maneira transparente e em conformidade com as normas ambientais e legais vigentes”.
Por: Fabyo Cruz – Editado por Adrisa De Góes – Comunidades tradicionais protestam contra Hydro e Governo do Pará (revistacenarium.com.br)
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