Lideranças de povos indígenas e de comunidades quilombolas da região do Baixo Amazonas, no Pará, reivindicam que o Poder Público tome medidas de resposta à seca com extrema urgência e em diálogo com as famílias impactadas. Essa exigência de efetivação de direitos foi feita por representantes das populações durante escuta pública realizada pelo Ministério Público Federal (MPF) nesta quarta-feira (21).

Foto: Jordanno Sousa/MPF

A seca de 2023 foi a pior dos últimos 120 anos e, enquanto os efeitos dessa megaestiagem ainda impactam a vida dos povos indígenas e comunidades tradicionais da Amazônia, a seca de 2024 está chegando antes do previsto e há chances de que ela seja ainda mais severa que a do ano anterior, apontam informações de estudos científicos e de indígenas e quilombolas compartilhadas durante o evento.

Na avaliação das lideranças ouvidas, a resposta à seca do ano passado foi praticamente nula: não houve consulta às populações impactadas, o apoio chegou tarde demais e as soluções não resolveram os problemas das famílias, configurando desperdício de recursos justamente em políticas públicas vitais, relacionadas à sobrevivência humana. Cestas básicas, por exemplo, foram entregues só em abril de 2024, muitas vezes com conteúdo estragado, e não houve perfuração de poços artesianos, criticaram as lideranças.

Além dos prejuízos e riscos socioambientais comumente associados à seca, indígenas e quilombolas enfatizam o aumento de invasões a seus territórios. Tendo em vista que a seca provoca a escassez de recursos naturais, como a caça e a pesca, na estiagem as terras indígenas e quilombolas passam a ser alvo de ainda mais invasões. Por isso, os representantes das populações violadas reivindicam medidas do Poder Público para a retirada desses invasores ilegais.

Soluções a curto e longo prazos – Para que este ano não se repita a precariedade da resposta do Poder Público à seca de 2023, indígenas e quilombolas do Baixo Amazonas reivindicam que haja um trabalho imediato, preventivo e planejado entre órgãos públicos de todas as esferas governamentais, com a participação das populações na definição dos objetivos e estratégias de atuação, para que as soluções propostas estejam de acordo com a realidade vivida pelas famílias.

As iniciativas não devem visar apenas à redução urgente dos impactos provocados pela seca, mas também o enfrentamento a longo prazo, com políticas públicas de convivência com a seca e de adaptação à crise climática, para que as famílias possam ter autonomia, indicam as lideranças. As iniciativas devem incluir ajustes em políticas de educação e saúde, destacam, relatando que a seca tem obrigado as famílias a deixarem os territórios para conseguir acesso a esses serviços, o que impacta diretamente no modo de vida dessas populações.

“Todos os dados indicam que a seca é um fenômeno que veio para ficar. As lideranças relatam que o agravamento da estiagem vem ocorrendo há cinco anos, pelo menos, e é inconcebível que o Poder Público não leve isso em consideração ao atuar na defesa das populações mais vulneráveis”, alerta o procurador da República Paulo de Tarso Moreira Oliveira, que convocou a escuta pública. O representante do MPF criticou, principalmente, a falta de participação, no evento, de Municípios convidados. Apenas o Município de Oriximiná contou com representante na escuta pública.

Participações – Além de representantes de lideranças indígenas e quilombolas e do MPF, a escuta pública contou com a participação de órgãos como o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Defesa Civil do Estado do Pará, Ministério Público do Estado do Pará, Município de Oriximiná, Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Secretaria de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária, Secretaria de Estado dos Povos Indígenas do Pará, Secretaria das Cidades e Integração Regional do Pará, Secretaria de Igualdade Racial e Direitos Humanos do Estado do Pará, Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade, Companhia Nacional de Abastecimento e a organização não governamental Comissão Pró-Índio de São Paulo.

A escuta pública foi convocada pelo MPF após associações quilombolas terem repassado à instituição, na 25ª Mesa Quilombola, informações de que as comunidades tradicionais da Calha Norte têm enfrentado uma série de dificuldades diante das periódicas crises ligadas a mudanças climáticas, que resultam em impactos ambientais, socioeconômicos e culturais que afetam seriamente as famílias.

 Assista à íntegra da escuta pública