O pesquisador Fábio de Oliveira Freitas, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF), realizou uma expedição do Alto Xingu ao noroeste de Mato Grosso, na aldeia da etnia Enawenê-Nawê, próxima ao rio Iquê. O objetivo da viagem, realizada de 2 a 14 de junho, foi buscar sementes de um milho tradicional plantado pela etnia Waurá, que vive no Alto Xingu.

Tapaiê Waurá na aldeia Enawenê-Nawê – Foto: Fábio Freitas

“Várias etnias que vivem na região cultivam esse milho tradicional, mas estavam com dificuldade para achar sementes, por uma série de fatores. Nesta última safra, por exemplo, houve um veranico e os Waurá perderam as sementes e não estavam conseguindo achar”, explica Freitas.

Foi Tapaiê Waurá, antigo parceiro da Embrapa e guardião de sementes da etnia, que procurou o pesquisador em busca de ajuda. “Aqui na coleção da Embrapa não tinha o milho que eles estavam procurando. Tem milho de outras etnias do Xingu, mas não o deles”, destacou Freitas.

Tapaiê Waurá fez contato então com os parentes Enawenê-Nawê, do mesmo tronco linguístico dos Waurá, que ainda têm esse milho tradicional e concordaram em fornecer as sementes. Participaram da expedição de quase 6 mil quilômetros, ida e volta, além de Freitas e Tapaiê Waurá, a servidora aposentada da Funai Joana Zelma, que trabalha há bastante tempo com essas comunidades indígenas. Todo o trajeto foi feito de carro.

“Os Enawenê-Nawê são uma etnia ainda bem preservada culturalmente. Nós recebemos amostras de milho de várias famílias. Parte desse material ficou com Tapaiê Waurá, para ele levar ao Alto Xingu e plantar já na próxima safra, e outra parte será conservada pela Embrapa”, assinalou o pesquisador.

Freitas conta que a viagem despertou o interesse de outras etnias do Xingu no milho tradicional. Mas apesar de os Enawenê-Nawê terem cedido uma boa quantidade de sementes, ainda não é o suficiente para atender a todos. “Por isso, Tapaiê Waurá vai primeiro plantar o que recebeu para multiplicar as sementes e distribuir no ano que vem para outras aldeias do Alto Xingu.”

A expectativa dos Waurá é plantar as sementes no segundo semestre. “Eles estão preparando as roças para plantar até setembro, outubro, talvez até um pouco mais para frente, a depender das chuvas, para garantir a multiplicação desse material e o milho para eles consumirem também”, afirma o pesquisador. Ao todo, são cerca de 250 pessoas na aldeia Waurá, mas nas aldeias de outras etnias do Alto Xingu vivem cerca de 2 mil indígenas que serão beneficiados com o trabalho.

Segurança cultural

De acordo com o pesquisador Fábio de Oliveira Freitas, a base da alimentação no Alto Xingu é a mandioca e o peixe. Milho e outras culturas são secundárias, mas também têm um papel importante na alimentação das etnias que vivem ali, além da importância cultural.

Ele explica que as principais diferenças entre o material tradicional e o material convencional estão no formato da espiga, no tamanho do grão, no sabor e, principalmente, na adaptação às condições ambientais locais. “É uma variedade indígena, portanto, não foi feito trabalho de multiplicação nem melhoramento genético convencional. Só o melhoramento natural e a seleção que eles fizeram ao longo dos séculos. Por outro lado, como é um material que está sendo plantado há muitas gerações no mesmo local, já está adaptado às condições da região”, diz Freitas.

Além do aspecto alimentar, o pesquisador ressalta a importância cultural do milho para os indígenas. “Até hoje, alguns tipos de milho só são usados por certas etnias para fins rituais: tem que ter aquele alimento feito à base daquele milho na cerimônia.” Os Guaranis, segundo ele, têm um milho branco que só é usado em rituais religiosos, por exemplo.

“Então, às vezes, ao perder uma variedade, uma espécie, está se perdendo junto uma série de componentes culturais que estão agregados ali. Por isso a necessidade dessa preservação aliando a segurança alimentar à segurança cultural”, finaliza Freitas.

Eduardo Pinho (MTb/GO – 1073)
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia – Expedição busca sementes de milho para a etnia Waurá, do Xingu – Portal Embrapa