Contrarrevolução de 64 – Parte XVIII

04.11.1964-Revista-Manchete-n°-625d

O Drama da Marinha

Tudo começou quando marinheiros e fuzileiros navais re­solveram comemorar o segundo aniversário de uma as­sociação da classe. O então ministro da Marinha, Almi­rante Silvio Mota, proibiu tal reunião. Rebelando-se, os marujos foram abrigar-se na sede do Sindicato dos Me­talúrgicos, situado a Rua Ana Néri. A concentração reu­niu 3.647 homens encabeçados pelo Cabo José Anselmo, que é também acadêmico de Direito. Ao fim de 90 minutos de debates, fizeram eles cinco reivindicações:

              • Não punição;
              • Reconhecimento da associação;
              • Libertação de todos os presos, inclusive os da Ilha das Cobras;
              • Humanização da marinha, e
              • Melhoria da alimentação nos navios e nos quartéis.

Com estes acontecimentos, criava-se na Marinha, uma crise semelhante à da revolta dos marinheiros, com João Cândido à frente, em 1910.

04.11.1964-Revista-Manchete-n°-625e

Durante Quase Três Dias, os Marujos e Fuzileiros Rebelados Transformaram o Palácio do Aço num Grande Acampamento Militar

Quando os marujos o fuzileiros se reuniram no Sindicato dos Metalúrgicos contra as determinações expressas do Almirante Silvio Mota, uma tropa de segurança do Corpo do Fuzileiros Navais foi enviada para desalojá-los e prendê-los.

04.11.1964-Revista-Manchete-n°-625f

Mas, ali chegando, em face dos apelos dos rebeldes, que cantavam o Hino Nacional e os incitavam à adesão, metade do contingente se despojou de suas armas e ingressou no sindicato, depois de abrir as blusas, imitando os que ali se achavam reunidos. O restante do contingente recebeu ordem de regresso e o então Ministro da Marinha pediu ao Exército que enviasse uma força motomecanizada, para pôr cerco ao Sindicato dos Metalúrgicos. O pedido foi prontamente atendido.

04.11.1964-Revista-Manchete-n°-625g

Enquanto o Exército Isolava o Sindicato, a Crise Abalava a Marinha e Levava o seu Ministro a Demitir-se 

Se alguns milhares de rebeldes se reuniam no Palácio da Rua Ana Néri, outros viram-se impedidos de alcançar esse local, por terem sido bloqueados, uns na Ilha das Cobras, outros no Arsenal de Marinha. Alguns, que tentaram romper a prontidão ordenada pelas altas autoridades navais, foram contidos por uma descarga de metralhadora. No auge da crise, o Almirante Silvio Mota expediu ordem de prisão contra o Almirante Aragão, comandante do Corpo de Fuzileiros Navais, acusando-o de ter abandonado o cargo. E mais tarde, julgando-se desprestigiado, o titular da Marinha apresentou por escrito ao chefe da Casa Civil da presidência da República o seu pedido de demissão, posteriormente aceito pelo Sr. João Goulart.

04.11.1964-Revista-Manchete-n°-625h

Entre as Vítimas da Rebelião Estavam as Intranquilas Famílias dos Marujos Rebelados 

Os rebeldes foram retirados, por fim, de seu reduto, da Rua Ana Néri, e levados para o quartel do Batalhão de Guardas. Esposas, irmãs e noivas de marujos e fuzileiros, presentes à saída destes, esperavam o pior e, por isso, não esconderam a forte emoção que as possuía. Houve longos abraços silenciosos, beijos e lágrimas. Preparados para deixar o Sindicato dos Metalúrgicos rumo ao Batalhão de Guardas, os marujos tinham a fisionomia tensa, numa atitude que contrastava com a exaltação das primeiras horas. No mesmo dia foram libertados. Serão agora submetidos a inquérito militar.

04.11.1964-Revista-Manchete-n°-625i

O Ministro do Trabalho, Senador Amauri foi ao Sindicato dos Metalúrgicos, a fim de Parlamentar com os Rebeldes, mas ia Sendo Barrado

Enquanto durou a permanência dos marujos rebeldes no Sindicato dos Metalúrgicos, não lhes faltou a visita e o incentivo de deputados esquerdistas, bem como de associações femininas e de estudantes, de igual tendência. Coletas de dinheiro foram feitas em benefício dos marinheiros e fuzileiros, que receberam também donativos de mantimentos e até diversões, proporcionadas pelo Centro Popular de Cultura, da UNE, que ali fez representações. Durante dias, o País inteiro ficou preso aos acontecimentos, cujas repercussões ainda se fazem sentir intensamente na Marinha como em outros meios militares.

04.11.1964-Revista-Manchete-n°-625j

Libertados, os Marinheiros Manifestaram a sua Alegria Numa Ruidosa Passeata. Ao Mesmo Tempo, a Alta Oficialidade Naval se Reunia Para Exprimir Desagrado, em Face da Solução Dada Pelo Governo da República ao Rumoroso Episódio

Enquanto eram grandes as expansões de alegria dos rebeldes, um movimento de reação se verificava entre a oficialidade naval, que não se conformava com a libertação, pura e simples, dos marinheiros.

Para ela, a Marinha tinha sofrido rude golpe, com a quebra da disciplina e o rompimento da hierarquia, que é a base das Instituições Militares. Reunidos no Clube Naval, órgão da classe, desde logo, em manifesto, os oficiais tornaram pública a sua insatisfação ante a solução dada ao episódio, que lhes parecia de natureza gravíssima e no qual identificavam influências comunistas. Mais tarde, idêntico pronunciamento foi feito pelo Marechal Augusto Magessi em nome do Clube Militar. Aliás o Marechal esteve numa das reuniões do Clube Naval, onde falou, de improviso, exprimindo sua solidariedade.

Um Almirante Reformado foi Convocado Pelo Presidente João Goulart Para Ocupar o Cargo Vago com a Demissão do Ministro Sílvio Mota 

Primando pela franqueza, o novo Ministro da Marinha declarou que a solução por ele dada à rebelião dos marinheiros causara “péssima repercussão” no almirantado. Mas parece disposto a contornar a crise, tendo, aliás, manifestado que sua permanência no cargo será condicionada pelo êxito de suas gestões no sentido de pacificar a Marinha. Ao mesmo tempo que ele era empossado, o ex-ministro Pedro Paulo de Araújo Susano assumia as funções de chefe do Estado-Maior da Armada.

04.11.1964-Revista-Manchete-n°-625k

A fim de tentar o apaziguamento, o novo ministro ordenou a abertura de dois inquéritos militares: um sobre a rebeldia dos marujos e outro para apurar as responsabilidades de quem comandou a rajada de metralhadora, no Arsenal de Marinha, contra um grupo de marinheiros rebeldes. (REVISTA MANCHETE N° 625, 11.04.1964)

Por: Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 21.06.2024 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;  

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTAP);
  • E-mail: [email protected]

Nota – A equipe do Ecoamazônia esclarece que o conteúdo e as opiniões expressas nas postagens são de responsabilidade do (s) autor (es) e não refletem, necessariamente, a opinião deste ‘site”, são postados em respeito a pluralidade de ideias