A exuberância cósmica das águas se mantém entranhada na alma das coletividades amazônicas. A sua desmesurada viscosidade natural corre de forma transcendental nas veias abertas dos povos da floresta que ao mesmo tempo são materialmente e espiritualmente alimentados pelos devaneios encantatórios de suas poetizantes encantarias.
As águas no autêntico leito divinal
Alimenta os povos da humanidade
E na sua imaculada liberdade
Se transforma numa alma cultural
Seu divino poder transcendental
Faz o boto adquirir nova existência
Esse rapaz de magnífica aparência
É dotado de amor e sedução
Se envolve no calor causticante da paixão
Reconstruindo seu novo espaço de vivência
João de Jesus Paes Loureiro nos diz que o boto epifanizado em rapaz vestido de branco, pode surgir em uma festa de dança, sem que ninguém o conheça ou o tenha convidado. Segundo Loureiro, ele se destaca pela habilidade na dança e pelas maneiras elegantes como se apresenta vestido. O mesmo autor ainda nos relata o seguinte:
“Ele pode, de outra maneira aparecer no quarto e deitar-se na rede com a mulher que pretende seduzir e amar. Pode também engravidar as mulheres que, estando menstruadas (ou enluadas, segundo a palavra da linguagem cabocla de origem indígena), o tiverem olhando de perto, seja de um tombadilho de um barco, seja de algum lugar à beira do rio”.
O imaginário privilegiado dos povos da floresta torna-se encantador e vivificante. São encantarias transcendentais que em devaneante estado de cosmogonialidade fazem parte relevante da organização do espaço vivido e que mitologicamente enriquecem as coisas da Amazônia.
Por: Marquelino Santana
FONTE: Correio Eletrônico (e-mail) recebido do autor
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