A exuberância cósmica das águas se mantém entranhada na alma das coletividades amazônicas. A sua desmesurada viscosidade natural corre de forma transcendental nas veias abertas dos povos da floresta que ao mesmo tempo são materialmente e espiritualmente alimentados pelos devaneios encantatórios de suas poetizantes encantarias.

Foto: Marquelino Santana

As águas no autêntico leito divinal

Alimenta os povos da humanidade

E na sua imaculada liberdade

Se transforma numa alma cultural

Seu divino poder transcendental

Faz o boto adquirir nova existência

Esse rapaz de magnífica aparência

É dotado de amor e sedução

Se envolve no calor causticante da paixão

Reconstruindo seu novo espaço de vivência

João de Jesus Paes Loureiro nos diz que o boto epifanizado em rapaz vestido de branco, pode surgir em uma festa de dança, sem que ninguém o conheça ou o tenha convidado. Segundo Loureiro, ele se destaca pela habilidade na dança e pelas maneiras elegantes como se apresenta vestido. O mesmo autor ainda nos relata o seguinte:

“Ele pode, de outra maneira aparecer no quarto e deitar-se na rede com a mulher que pretende seduzir e amar. Pode também engravidar as mulheres que, estando menstruadas (ou enluadas, segundo a palavra da linguagem cabocla de origem indígena), o tiverem olhando de perto, seja de um tombadilho de um barco, seja de algum lugar à beira do rio”.

O imaginário privilegiado dos povos da floresta torna-se encantador e vivificante. São encantarias transcendentais que em devaneante estado de cosmogonialidade fazem parte relevante da organização do espaço vivido e que mitologicamente enriquecem as coisas da Amazônia.

Por: Marquelino Santana

FONTE: Correio Eletrônico (e-mail) recebido do autor

Nota – A equipe do Ecoamazônia esclarece que o conteúdo e as opiniões expressas nas postagens são de responsabilidade do (s) autor (es) e não refletem, necessariamente, a opinião deste ‘site”, são postados em respeito a pluralidade de ideias