Relato Pretérito ‒ Laguna dos Patos
Domingos de A. e Silva (1865)
Patos (Lagoa dos –). Grande lagoa, situada na costa do Oceano Atlântico em um terreno arenoso, tendo 36 léguas de comprimento, a contar da ponta de Itapoã até o Estreito, e 14 de largura, contadas entre a Ponta Negra e o Saco de Cristovão Pereira; a sua profundidade varia no canal de Cangussu de 4½ a 8 braças, atingindo a 20 em Itapoã e descendo a 15 palmos no tempo das secas no Estreito. É semeada de baixios, sendo os principais: o dos Desertos ([1]), junto a Itapoã; o do Barba Negra, em frente a Itapoã; o de S. Simão, em frente aos Tapes; o dos Desertores, fronteiro à Ponta de Cristovão Pereira; o de D. Maria, que é o maior de todos, entre as Barras dos Arroios Velhaco e Guaraxaim; o do Quilombo, perto da Barra do Rio Camaquã; o do Vitoriano, em frente à ponta do Bojuru; e o da Feitoria, fronteiro à Ponta do Estreito: este grande número de baixios, unidos a outros menores que se acham dispersos pelo centro da Lagoa, torna a sua navegação difícil e perigosa. (SILVA)
Barquinho ‒ Canal da Fz Guarida (08.03.2016)
O Supremo Tribunal Federal [STF] publicou o rito do impeachment, que valerá para o pedido da oposição, contra a Presidente Dilma Rousseff. Com a publicação do resultado do julgamento, o Supremo Tribunal Federal confirmou as regras estabelecidas pela maioria dos Ministros no fim do ano passado. Eles definiram que cabe ao Senado dar a palavra final, ou seja: confirmar, ou não, o prosseguimento do processo de impeachment.
(Gioconda Brasil ‒ do G1, Brasília, DF, 08.03.2016)
Partimos às 07h00 e às 10h00 fizemos uma breve parada no Farol Cristóvão Pereira (31°03’45,6” S / 51°09’56,7” O). A ausência de ventos facilitava a progressão, a superfície espelhada das águas encrespava suavemente apenas quando acariciava sensualmente os bancos de areia e embalava os esguios juncos. Aportamos, às 16h30, no canal de irrigação da Fazenda Guarida (31°14’15,5” S / 51°09’25,7” O), onde fomos autorizados, pelo Sr. Roberto, a montar acampamento. Coloquei a rede na boca do canal e fui tarrafear, guiado pelo Sr. Roberto.
Nas proximidades de uma dessas bombas peguei mais de 130 lambaris com apenas uma tarrafeada, um recorde até então. O acampamento era bastante agradável e limpo e ficava a apenas 8,6 km do Farol Capão da Marca, onde eu originalmente planejara acampar. As condicionantes relativas ao local onde o veleiro pode aportar limitam bastante as opções de parada. Tínhamos navegado apenas 37,6 km, totalizando 178,3 km de jornada.
Fazenda Guarida ‒ Barra Falsa (09.03.2016)
Nos últimos dias, aliados de Lula e integrantes do primeiro escalão voltaram a defender que o ex-Presidente assuma uma cadeira na Esplanada dos Ministérios para ganhar novamente o foro privilegiado, que faria com que as investigações sobre o suposto envolvimento dele na Lava Jato fossem transferidas de Curitiba para Brasília.
(Gustavo Garcia ‒ G1, Brasília, DF, 09.03.2016)
Partimos depois das 08h00 e, às 09h30, aportei no Farol Capão da Marca (31°18’56,7” S / 51°09”49,4” O). O Farol, inaugurado em 25.03.1881, que apresentava, em 12.04.2011, excelente estado de conservação tinha sido arrombado e sua porta metálica e equipamentos eletrônicos roubados, um retrato vivo do descaso e do vandalismo que grassa impune em uma sociedade moral e espiritualmente derruída. A outra parada, às 13h30, foi numa das falésias da Baía do Bojuru, onde os criminosos ralis aceleram as erosões provocando a queda das belas e centenárias figueiras.
Partimos, às 14h20, aproados diretamente para as ruínas do Farol do Bojuru (31°29’09,56” S / 51°25’14,24” O), a meio caminho surgiram, à bombordo, pesados “cumulonimbus” pressagiando mau tempo forçando-me a picar a voga pois estávamos muito afastados da costa. Abandonei a ideia de fazer uma breve parada no Farol e rumamos direto para a Barra Falsa, passando incólumes pelas chuvas que assolavam todos os quadrantes. Passamos à cavaleiro da bela Ponta do Bojuru, sem dúvida a região mais bela de toda Costa Oriental da Laguna dos Patos, onde também tive de desistir de aportar.
Chegamos, finalmente, à Barra Falsa (31°34’20” S / 51°27’37,32” O) acompanhados de uma chuva fina e mais uma vez conseguimos abrigo, depois de contatar o Gerente da Fazenda São Pedro, Sr. Ranir Cézar Goulart Barcellos, e o seu Chefe do Escritório, Sr. Natanael Porto Santos, que já tinham sido alertados pelo proprietário Sr. Paulo Santana atendendo pedido do Coronel Pastl. Tínhamos navegado 57,6 km, totalizando 235,9 km de jornada.
Barra Falsa (10 a 12.03.2016)
Na quinta-feira, dia 10, os ventos de SE a 40 km/h e a garoa fina durante todo o dia forçaram-nos a permanecer acantonados na Fazenda. Aproveitamos para pescar e passear pelos arredores quando não estava chovendo. O simpático Sr. Erci Rodrigues de Lima permitiu que fizéssemos uso de sua geladeira onde pude acondicionar os peixes que havíamos pescado no canal da Fazenda Guarida.
Na sexta-feira, dia 11, com a previsão de ventos de SO a 25 km/h e 26 mm de chuva, o Norberto achou melhor permanecermos na Fazenda. Decidi, então, visitar a Ponta do Bojuru, conhecida pelos “hablocs” (habitantes locais) como Ilha do Bojuru. A vegetação nativa e, em particular, as centenárias figueiras me encantam e eu não ia perder a oportunidade de revê-las. Desta feita, passeei pelo local revendo velhas amigas, descobrindo novas paisagens e novos ângulos. As cheias que assolaram o Rio Grande do Sul, no segundo semestre de 2015, atingiram, no final do ano, impiedosamente os Mares de Dentro causando enormes transtornos e prejuízos à população ribeirinha, ao agronegócio e à pesca. Podemos afirmar que estes impactos foram maximizados em virtude da construção de estradas e eclusas que alteram significativamente a dinâmica das águas impedindo que estas sigam seu curso normal.
Embora a margem Oriental sofra menos impacto das ondas nestes períodos de cheias em virtude da predominância dos ventos do quadrante Este (NE, ENE, Este, SE e SSE) observamos na Ponta do Bojuru pequenos danos provocado pelas intempéries na vegetação. Relata-nos Barbosa Lessa:
Hoje a gente sabe que as águas que a Lagoa dos Patos lança ao oceano vêm de muito longe, desde os altos na divisa de Santa Catarina [Rio das Antas], desde a fronteira de São Gabriel [Rio Vacacaí], desde a fronteira de Bagé [Rio Camaquã], e isso sem falar no Rio Jaguarão, na Lagoa Mirim e no Canal de São Gonçalo, que também tem só um lugar de desaguar. Só o Rio Jacuí, com seus 750 km de extensão, já é um negócio muito sério. E todo esse horror de água precisa sair ao Mar!
Acontece, porém, que o desnível é mínimo desde a ponta de ltapuã ou desde a Lagoa Mirim – correspondendo à mesma planície rasa que se vê do Mar – e em grande parte das vezes é o Oceano que está entrando até metade da Lagoa. Massas de água salgada se atiram contra a boca larga e rasa da barra, revolvendo areias.
Mas as águas da Lagoa voltam a atirar as areias contra o Mar. Com a mudança dos ventos aumenta a confusão. Se sopra o vento Sul numa hora de maré-cheia a Lagoa não consegue sair; e se, por acaso, vence, vibra que nem pororoca botando escarcéu no ar. (LESSA, 1984)
Nesta visita mágica à fantástica Ponta do Bojuru encontrei um grupo de Imbé acampado sob uma figueira, visitei e documentei minhas belas, velhas e ancestrais amigas arbóreas que me receberam com seu contumaz carinho. Retornei encantado ao nosso acantonamento enfrentando uma garoa fria. Naveguei 10,0 km, totalizando 245,9 km de jornada.
No sábado e domingo (12 e 13.03.2016), como a previsão de ventos de SE era de 35 km/h, resolvemos permanecer na Barra Falsa.
Minha memória engarupada na memória fez-me recordar a viagem de Saint-Hilaire, nos idos de 1821, quando foi igualmente obrigado a permanecer ancorado nesta região em decorrência dos ventos.
Relato Pretérito ‒ Bojuru
Auguste de Saint-Hilaire (1821)
SACO DO BOJURU, 22 de junho (1821). – Durante a noite rompeu violenta tempestade. O iate balançou furiosamente sobre as âncoras e parecia ameaçar de abrir-se ao meio ou naufragar. O patrão não sabia onde estávamos e esperava impacientemente o dia raiar. Ao surgir o Sol ele reconheceu que nos achávamos somente a uma légua de uma pequena enseada vizinha da estância Bojuru e também chamada, por esse motivo Saco do Bojuru. Levantamos âncora e viemos, malgrado a tempestade, procurar este abrigo. O vento se fazia sentir com muito menos intensidade; ancoramos aqui e ainda estamos às 20h00. Durante esse tempo, o vento se acalmou e espero que amanhã nos poderemos por em marcha. Os passageiros foram obrigados a ajudar a equipagem, que se compõe de cinco pessoas apenas, incluindo o patrão. […]
SACO DO BOJURU, 23 de junho (1821). – O vento permaneceu contrário o dia todo, e ficamos ancorados. O patrão enviou seus negros para cortar lenha nas margens do Rio, e eu os acompanhei. Durante muito tempo, passeei pelos terrenos que margeiam a Lagoa, encontrando-os arenosos e entrecortados de pântanos e de poças d’água. Árvores raquíticas, como as Myrsinaceaes e Myrtaceaes, entrelaçam-se sobre a praia, vendo-se sobre as águas, ou em suas vizinhanças, numerosas aves aquáticas, como garças brancas, gaivotas, baiacus (?) e cegonhas; os colimbos ([2]) e diversas e diversas espécies de marrecos e patos selvagens. A vegetação continua idêntica à que descrevi no ano passado, nessa mesma época.
O capim tem coloração amarelada e apenas se percebe, de longe em longe, algumas flores que escaparam à má estação.
Entre Porto Alegre e Itapuã, encontram-se na Lagoa algumas balizas fincadas, aqui e ali, por patrões bem intencionados. Contou-me o patrão do iate que, há cerca de dois anos, um engenheiro oferecera ao comércio indicar o canal por meio de duas linhas de balizas, à direita e à esquerda, mediante certas condições; mas eles recusaram. É verdadeiramente inconcebível que o Governo não tenha tomado absolutamente, até agora, nenhuma medida para tornar menos perigosa uma navegação tão útil e que tanto contribui para a riqueza da Capitania.
Há alguns práticos, que se encarregam de conduzir os barcos de Rio Grande, e vice-versa, mas não são revestidos de nenhum caráter legal, correndo-se o risco de pegar algum incompetente.
Além da enseada onde ancoramos, as embarcações podem ainda achar abrigo junto a Cristóvão Pereira; aliás, não existem outros, entre Itapuã e o Rio (Canal) São Gonçalo. (HILAIRE)
Galeria de fotos
Por: Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 10.05.2024 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.
Bibliografia
HILAIRE, Auguste de Saint-. Viagem ao Rio Grande do Sul – Brasil ‒ Rio de Janeiro, RJ ‒ Companhia Editora Nacional, 1939.
LESSA, Luiz Carlos Barbosa. Rio Grande do Sul, Prazer em Conhecê-lo ‒ Brasil ‒ Porto Alegre, RS ‒ AGE ‒ Assessoria Gráfica e Editorial, 1984.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
- Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
- Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
- Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
- Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
- Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
- Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
- Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;
- Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
- Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
- Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
- Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
- Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
- Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
- Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
- Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTAP);
- E-mail: [email protected]
[1] Desertos: hoje das Desertas. (Hiram Reis)
[2] Os colimbos: mergulhões. (Hiram Reis)
Nota – A equipe do Ecoamazônia esclarece que o conteúdo e as opiniões expressas nas postagens são de responsabilidade do (s) autor (es) e não refletem, necessariamente, a opinião deste ‘site”, são postados em respeito a pluralidade de ideias