Jornada Patriótica – 3ª Perna
S. Vitória do Palmar ‒ Veleiros Saldanha da Gama
Lagoa Mirim
(Jilnei Brasil Rodrigues)
O embalar das tuas águas
Murmurantes e tão calmas
São restos de lágrimas
De muitas restingas.
De arroios e sangas
Para o Leste andantes
São às vezes saudades
De verões do passado.
Deixadas em remanso
Por ventos passantes.
O azul do teu céu
Enfeitado de aves
Que revoam e cantam
Na tarde cadente. […]
S. Vitória do Palmar – Ponta Canoa (28.03.2016)
Felicíssima Páscoa
(Felipe Moura Brasil)
Coelhinho da Páscoa
Que trazes pra mim?
A queda da Dilma
E do Lula, enfim.
Coelhinho da Páscoa
Pra onde ele vai?
Direto pra cela do amigo Bumlai…([1])
(Revista Veja, São Paulo, SP, 28.03.2016)
Na noite de ontem (27.03.2016), disse ao caro amigo Gustavo Rodrigues Gonzalez que precisávamos partir cedo na manhã seguinte, pois, a jornada até a Ponta Canoa era muito longa e que, se as condições meteorológicas previstas realmente se concretizassem, levaríamos em torno de dez horas para chegar ao nosso destino.
Como o Sol nascia às 06h44 e se punha às 18h38 e não podíamos contar com a luz da Lua, que só surgiria às 22h00, era importante partir logo após a alvorada, pois precisávamos contar com certa margem de segurança para possíveis contratempos, montagem do acampamento, preparação do rancho e banho.
Precisávamos transportar as embarcações, de madrugada, até o Porto, montar o mastro do veleiro e aparelhar o “Corais” e o “Argo II”. Ao mostrar ao Gustavo, no GPS, que distância da residência dos seus pais até a Ponta Canoa era de 51,0 km “em linha reta”, o amigo ponderou que a casa ficava a 6,3 km do Porto de SVP “em linha reta”, e que, em consequência, nosso trajeto poderia ser um pouco inferior aos 51,0 km.
A questão consistia, então, apenas em verificar a diferença entre as Latitudes do Porto e da morada dos progenitores do Gustavo – a Latitude do Porto foi determinada como sendo de 33°29’55” O e a Latitude da casa dos Gonzalez de 33°30’57” O. Como cada grau corresponde a 111,12 km, e cada minuto (milha náutica) a 1.852 m e cada segundo a 30,87 m e considerando que as diferenças entre as Latitudes dos dois pontos (Porto e Residência dos Gonzalez) era igual à 01’02”, calculamos que a distância entre essas Latitudes era de 1.913,74 m (aproximadamente 2 km), encurtando, portanto nosso percurso para uns 49 km “em linha reta”.
Ao contornarmos uma margem como a de Santa Vitória à Ponta Canoa esta distância linear sofre um acréscimo de 6 a 8%, uma previsão de 51,94 a 52,92 km – uma longa marcha, portanto, a empreender. O Gustavo chegou pontualmente, como combináramos, às 04h00, e, às 04h30, ele e o Renato (caseiro da residência dos Gonzáles e amigo da família, mais conhecido na cidade como Maçã) nos levaram até o Porto de Santa Vitória do Palmar onde encontramos o grande parceiro Carlos Moreira Cabreira. Os formidáveis companheiros nos ajudaram a aparelhar o veleiro e largamos, exatamente às 07h00, levando muita saudade no coração e guardando eternamente caras lembranças na garupa da memória.
A costa entre SVP e a Ponta dos Afogados não apresenta muitos atrativos e é, sem sombra de dúvida, a mais pobre em belezas cênicas, flora e fauna de toda a Mirim. Fiz duas paradas para me hidratar, uma delas à 300 m da margem, e, outra, às 13h00, quando chegamos à Ponta Sul da Ilha dos Afogados.
Abandonamos a ideia de o Norberto conhecer o belo Arroio dos Afogados em virtude dos enormes bancos de areia que bloqueavam o acesso do veleiro pelo Sul e contornamos, então, a Ilha pela margem Oeste. Às 16h15, aportamos na baía da Ponta Canoa (33°03’44,8” S / 53°19’22,9” O). Montamos acampamento, debaixo de uma garoa fina e fria, contatei os familiares do alto de um cômoro de onde avistei rastros e dejetos recentes de capivaras adultas. Percorrêramos 52,7 km com ventos fracos de SO.
² 1° Perna Total = 349,1 km.
² 2° Perna Total = 322,2 km.
² 3° Perna Parcial = 52,7 km.
² Total Parcial = 724,0 km.
Ponta Canoa ‒ Ponta Santiago (29.03.2016)
Lula e Dilma resolveram pintar dois Brasis que não existem em recentes entrevistas à imprensa internacional. […] a imprensa gringa não comprou nem o “golpe de Dilma” nem o “país das maravilhas” de Lula. A “The Economist” pediu a renúncia da Presidente em sua capa. (Vera Magalhães ‒ Revista Veja, São Paulo, SP, 29.03.2016)
Partimos às 07h00, aproados para NE, totalmente recuperados, pois a madrugada anterior, em Santa Vitória do Palmar, tinha sido muito curta. A partir das 09h00, alterei o rumo da rota original, buscando a segurança da costa, girando a proa para Boreste enfrentando ondas de popa de quase 2 m. Redobrei a atenção na aproximação da margem, as ondas quebravam perigosamente e tive de evitar que levantassem, por demais, a popa e enterrassem a proa no leito da Lagoa provocando um naufrágio.
Embora os ventos de SE não ultrapassassem os 6 nós, o seu alinhamento com nossa rota e os enormes bancos de areia da Baía Canoa faziam com que as mesmas aumentassem desproporcionalmente. Aportei para descansar às 10h20, e, depois, fui acompanhando a costa rasa protegido pelos bancos marginais admirando a incrível avifauna local.
Grandes bandos de gordos capororocas cortavam os ares, adejando “contra o vento e a favor do tempo”, agrupados na sua característica formação em “V”, estratégia que lhes permite além de poupar energia proteger-se de possíveis predadores.
As majestosas aves voavam leves e sem esforço exibindo suas alvacentas plumas planando sobre o magnífico “espelho da Terra”.
Volta e meia, um bando mais corajoso sobrevoava o “Argo II” fitando-me com curiosidade antes de amerrissar, logo adiante, usando as asas como freio e esticando as patas sobre a superfície d’água esquiando graciosamente sobre Lagoa.
Avistei o Norberto ao longe, desembarcado no meio da Lagoa, soube, mais tarde, que o veleiro fora inundado pelas grandes ondas e ele parara no enorme Banco do Taquari para bombear a água do porão e convés. Fotografei e filmei, pela primeira vez, um grupo de quatro belos e serenos flamingos-de-james (Phoenicoparrus jamesi). Seus curiosos e característicos bicos encurvados possuem uma franja interna de minúsculas hastes que lhes permite filtrar a água e o lodo retendo apenas pequenos organismos.
Aportamos na Ponta Santiago, às 14h12, e montamos o acampamento. Como não havia previsão de ventos fortes não buscamos abrigo na Baía “Caldeirinha” o que nos economizou alguns quilômetros de percurso. Estava limpando alguns peixes quando uma pequena garça boiadeira (Bubulcus ibis) pousou no caiaque e, depois de ficar observando-me durante algum tempo, foi se aproximando, cautelosamente, para comer alguns bocados que eu lhe atirava. Fui, progressivamente, diminuindo a distância do arremesso dos petiscos até que o dócil e elegante animal veio, por fim, comer diretamente na minha mão. Tínhamos percorrido 41,6 km.
² 1° Perna Total = 349,1 km.
² 2° Perna Total = 322,2 km.
² 3° Perna Parcial = 94,3 km.
² Total Parcial = 765,6 km.
GALERIA DE FOTOS:
Por: Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 29.05.2024 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
- Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
- Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
- Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
- Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
- Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
- Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
- Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;
- Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
- Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
- Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
- Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
- Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
- Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
- Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
- Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTAP);
- E-mail: [email protected]
[1] José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi condenado a 9 anos e 10 meses de reclusão por gestão fraudulenta de instituição financeira e corrupção. A ação se refere a um empréstimo de R$ 12 milhões concedido em 2004 pelo Banco Schahin a Bumlai. O dinheiro seria repassado ao PT em troca de um contrato da Schahin Engenharia para operar o navio-sonda Vitória 10.000 para a Petrobras – um contrato de US$ 1,562 bilhão por dez anos, renovável por mais dez. (O GLOBO, 30.07.2019)
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