O Imbróglio do “Prince of Wales” – Parte XI 

– Rei Leopoldo I

A Coalição, n° 28
São Luís, MA – Quarta-feira, 08.04.1863
Legação Brasileira em Londres, 26.02.1863

 O abaixo assinado, Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário de S.M. o Imperador do Brasil, tem a honra de acusar a recepção da nota, que em data de ontem lhe dirigiu o muito honrado Conde Russell, principal secretário de estado de S. M, a Rainha da Grã-Bretanha e Irlanda para os Negócios Estrangeiros, e apressa-se em transmitir a S. Exª no incluso cheque sobre o Banco de Inglaterra a quantia de £ 3,200, que o Governo de S.M. Britânica fixou pelo naufrágio da barca “Prince of Wales”.

Assim realizado este pagamento resta agora ao abaixo-assinado o imperioso dever de executar o que já teve a honra de anunciar na sua nota de 9 do corrente ao muito honrado Conde Russell, a saber: que o Governo de S. M, o Imperador, fazendo este pagamento ao Governo de S. M. Britânica, não reconhece por forma alguma o direito ou justiça da parte do Governo britânico em pretender que o Governo Imperial seja responsável pelo naufrágio da barca “Prince of Wales” nas costas do Brasil; havendo aliás o Governo Imperial empregado todos os meios ao seu alcance para conseguir a punição dos supostos malfeitores, e tendo feito franca e lealmente os possíveis esforços para demonstrar a improcedência da reclamação a que este fato deu lugar por parte da Legação Britânica no Rio de Janeiro.

E assim intimamente convencido do direito que lhe assiste, declara o Governo Imperial:

1°) Que não pode nem deve aceder aos princípios insólitos que se pretendem contra ele estabelecer por ocasião desse naufrágio; nem aceitar a responsabilidade que se lhe atribui contra o que tudo, alta e categoricamente protesta.

2°) Que conseguintemente se recusa, como sempre se recusou, a conseguir e a intervir na liquidação das perdas sofridas pelos donos da barca naufragada, ou de qualquer indenização pelos desastres provenientes desse naufrágio; e assim, também declina absolutamente o Governo Imperial tomar conhecimento do fato de abster-se o Governo Britânico de fazer reclamação pecuniária pelo navio ou pelo frete, como se declara na nota a que ora responde o abaixo-assinado.

3°) E, finalmente, transmitindo ao governo de S. M. Britânica a sobredita quantia de £ 3,200 pelo naufrágio da barca “Prince of Wales”, declara o abaixo-assinado, em nome do seu governo, que este pagamento assim feito ao Governo Britânico é mera consequência dos procedimentos ilegais e violências cometidas sobre navios brasileiros nas águas territoriais do Império, e simples resultado da força, sem de nenhum modo importar a admissão do direito ou justiça da parte do Governo Britânico.

Pelo que nunca poderá este pagamento estabelecer um precedente contra o Brasil ou qualquer outra nação marítima, pois que o Governo Imperial não reconhece o direito em semelhante fato, antes contra ele e suas consequências protesta da maneira a mais formal e solene.

O abaixo-assinado, dirigindo ao governo de S. M. Britânica este protesto para os seus devidos efeitos, reserva-se, entretanto, o direito de reclamar em nome do seu Governo uma satisfação pela violação da sua soberania territorial em consequência de terem sido, a título de represálias, capturados e conservados como presas nas águas territoriais do Império, por navios da marinha de guerra britânica, cinco navios de propriedade brasileira; bem como uma indenização pelos prejuízos resultantes das referidas presas; contra o que tudo desde já igualmente protesta o abaixo-assinado, e aproveita a ocasião para reiterar ao muito honrado conde Russell a expressão da sua mais alta consideração.

A S. Exª o muito honrado Conde Russell.

Carvalho Moreira (A COALIÇÃO, N° 28)

– Semana Illustrada, n° 111, 25.01.1863

Diário do Rio de Janeiro, n° 197
Rio de Janeiro, RJ – Segunda-feira,
20.07.1863

 O parecer de Sua Majestade o Rei Leopoldo I é o seguinte:

Nós, Leopoldo, Rei dos belgas tendo aceitado as funções de árbitro que nos tem sido conferida, de comum acordo, pelo Brasil e pela Grã-Bretanha, na questão que se tem suscitado entre estes estados acerca da detenção, em 17.06.1862, pelo Corpo da Guarda da polícia brasileira, situado na Tijuca, de três oficiais da marinha britânica; e dos incidentes que tiveram lugar em seguida e por ocasião dessa detenção;

Animado pelo desejo de corresponder por uma decisão escrupulosa, e imparcial à confiança que os ditos estados em nós depositaram;

Querendo, para cumprir a missão que temos aceitado, levar ao conhecimento das altas partes interessadas o resultado do nosso exame, bem como a nossa decisão arbitral sobre a questão que nos foi submetida nos termos seguintes, a saber:

Se na maneira por que as leis brasileiras foram aplicadas aos oficiais ingleses, houve ofensa à marinha britânica;

Considerando que não ficou de modo algum demonstrado que a origem do conflito fosse devida aos agentes brasileiros, os quais não podiam razoavelmente ter motivos de provocações;

Considerando que os oficiais, quando foram presos, não traziam as insígnias de sua classe, e que em um ponto frequentado por tantos estrangeiros não podiam pretender que se acreditasse na sua palavra, quando declaravam pertencer à marinha britânica, ao passo que nenhum indicio aparente desta qualidade corroborava a sua declaração;

Por conseguinte, uma vez detidos, deviam submeter-se às leis e regulamentos existentes, e não podiam exigir um tratamento diferente daquele que teria sido aplicado, em iguais condições, a quaisquer outras pessoas;

Considerando que, se não é possível deixar de reconhecer que os incidentes, que sobrevieram, foram dos mais desagradáveis para os oficiais ingleses, e que o tratamento ao qual foram expostos deveu-lhes parecer, muito duro, consta todavia que quando pela declaração do Vice-cônsul inglês, a posição social destes oficiais foi devidamente conhecida, foram logo tomadas medidas para que lhes fossem proporcionadas atenções particulares, e que em seguida ordenou-se que fossem pura e simplesmente postos em liberdade;

– Semana Illustrada, n° 159, 27.12.1863

Considerando que o funcionário que os mandou soltar, ordenou que fossem postos em liberdade logo que isso lhe foi possível, e que, procedendo assim, foi movido pelo desejo de poupar a estes oficiais as consequências desagradáveis, que nos termos das leis deviam forçosamente resultar para eles, de qualquer andamento que se desse ao negócio;

Considerando que, no seu relatório de 06.07.1862, o chefe de polícia não devia somente apresentar a narração dos fatos, mas também dar conta à autoridade superior da sua conduta, e dos motivos que o tinham levado a usar de benevolência;

Considerando que neste caso ele estava legitimamente autorizado para se exprimir como o fez, sem que daí se possa inferir intenção alguma de malevolência;

É nossa opinião que, da maneira por que as leis brasileiras foram aplicadas aos oficiais ingleses, não houve nem premeditação de ofensa, nem ofensa à marinha britânica.

Feito e dado em duplicata sob o nosso selo real, no Castelo de Lackem, aos 18 dias do mês de junho de 1863.

[L. S.]        LEOPOLDO. (DRJ, N° 197)

– Semana Illustrada, n° 110, 18.01.1863

Por: Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 19.04.2024 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Hiram Reis e Silva – O canoeiro

Bibliografia 

A COALIÇÃO, N° 28. Legação Brasileira em Londres – Brasil – São Luís, MA – A Coalição, n° 28, 08.04.1863.

DRJ, Nº 197. Parecer de Sua Majestade o Rei Leopoldo I – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Diário do Rio de Janeiro, n° 197, 20.07.1863.

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;  

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Ex-Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Ex-Vice-Presidente da Federação de Canoagem de Mato Grosso do Sul;
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTAP);
  • E-mail: [email protected] 

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