Jornada Pantaneira
A Medicina na Guerra do Paraguai – Parte XI
A MEDICINA NA GUERRA DO PARAGUAI
(Mato Grosso)
LUIZ DE CASTRO SOUZA
Sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e Membro titular do Instituto Brasileiro de História da Medicina.
As toxinfecções graves que correm por conta de salmonelas, de grupos bem determinados, apresentam aquela síndrome coleriforme transcrita pelo Dr. QUINTANA: vômitos, diarreia profusa de fezes riziformes [com aspecto de grãos de arroz], desidratação [provocando “grande sede”], desequilíbrio hidrossalino, pulso pequeno e frequente, anúria [supressão de urinas], o nariz se afila, as extremidades arrefecem, esfriam e ficam cianóticas, cãibras nos músculos das panturrilhas, a voz torna-se fraca e apagada [“mudança extrema no metal da voz e mesmo afonia”]. No capítulo desse assunto, assevera Vieira Romeiro (ROMEIRO), que tudo isso lembra o quadro clínico da cólera e dá-se a tais casos a denominação colerina ou cholera-nostra.
O Dr. Cândido Manoel de Oliveira Quintana não possuindo outros meios diferenciais de diagnóstico, na época, não teve dúvida em dar a cólera como doença dominante, pois baseou-se na semelhança do quadro clínico que tivera oportunidade de observar pessoalmente, por ocasião da epidemia do morbo na cidade do Rio de Janeiro, em 1855. Discutia-se muito em ser ou não contagiosa a cólera, mas havia surgido no cenário mundial da ciência, a figura genial de Louis Pasteur [1822-1895], com seus estudos memoráveis acerca da vitalidade dos fermentos, a ilusão da “geração espontânea” e as bactérias patogênicas. Só muitos anos mais tarde, no ano de 1883, Robert Koch [1843-1910], um novo gênio da concepção científica e da técnica bacteriológica (VASCONCELLOS, 1960), viera descobrir um bacilo em forma de vírgula, a que se denominou de vibrião colérico, o agente causador do terrível morbo.
Assim, a identificação da infecção e certeza do diagnóstico, passaram depois a ser confirmados na pesquisa do vibrião diretamente nas fezes e pelo sorodiagnóstico, meios laboratoriais inexistentes e impossíveis na época. Ao afirmar ser a cólera o mal que flagelava os nossos expedicionários, estava correta a impressão clínica dominante no espírito do Dr. Quintana e dos médicos de então.
Só depois, com os meios de pesquisa e de observação, podemos tentar fazer um diagnóstico por exclusão, pois, sabemos que a doença esteve circunscrita e restrita apenas ao aglomerado humano da Força Expedicionária, no período de uns quinze dias, sem ter disseminado outros locais da Província de Mato Grosso, apesar de os convalescentes terem se encaminhado até Cuiabá. Não existiria nenhum bacilífero entre aqueles nossos soldados sãos ou doentes e convalescentes? Nessa tentativa de diagnóstico por exclusão, passando, também, pela infecção tifoide e a disenteria bacilar aguda, não podemos desprezar o episódio ocorrido no pomar do Guia Lopez, quando os nossos doentes e convalescentes ao ingerirem grande quantidade de laranjas, devorando-as até com cascas, e de limões, a doença desapareceu por encanto.
Diz Taunay em suas Memórias, na página 251, que comeu de assentada nada menos de vinte e oito laranjas! Qual a causa de ter cessado a epidemia, após o consumo em grande quantidade de laranjas e limões? Hoje, com o conhecimento do metabolismo da água e dos eletrólitos, podemos interpretar o que ocorreu: houve espoliação hidrossalina em nossos expedicionários. Quanto à ingestão de água, esta fora realizada, porém, sem a reposição necessária de eletrólitos que somente foram assimilados na grande ingestão de frutas, resultando, em consequência, a melhoria do equilíbrio hidrossalino e com a recuperação dos nossos heróis.
Eis a explicação. Não podemos esquecer a avitaminose que também esteve presente naquele quadro clínico, cuja perda fora mais pelos vômitos do que pela ausência de alimentação naqueles poucos dias, mas o providencial pomar viera concorrer como papel adjuvante na recuperação dos nossos enfermos e convalescentes.
A infecção da cólera não seria curada com esses meios; apenas se observaria melhores condições físicas dos enfermos. A verdade é que cessou a tal epidemia nos infelizes expedicionários brasileiros, após as providências de víveres, e, evitados os alimentos deteriorados – a causa do quadro epidêmico.
* * *
No dia 25.05.1867, com água até à cintura, nossos soldados transpuseram o córrego da Prata, afluente do Rio Miranda. Nessa ocasião, o número de padiolas carregadas com doentes elevava-se a 96 e como se fazia necessário oito homens para o revezamento, mais da metade da Força estava empregada em transportar os enfermos. A intensa fadiga e o descontentamento eram evidentes, visto que realizavam um trabalho extremamente penoso como o de padioleiros e as praças já murmuravam com ameaças de desvencilharem-se da sobrecarga do transporte dos doentes, agravado pelo estado físico e pela longa distância a percorrer.
Diante da situação tensa, foi preciso muita energia dos oficiais para impor a ordem. Acentua Taunay, que a maior parte das unidades achava-se dominada pelo espírito da desorganização e, consequentemente, a insubordinação quase instaurou-se.
Nesse dia, o Coronel Carlos de Moraes Camisão convoca várias vezes os comandantes dos corpos, manifestando maior apreensão e mesmo certa agitação. Ele estava profundamente impressionado e desabafou o que lhe ia no íntimo, quando dissera:
Para um chefe era a morte preferível ao espetáculo que desde algum tempo tinha sob os olhos.
E ao referir-se, nessa ocasião, aos enfermos, afirmara:
Ah! Quanto quisera eu estar no lugar de um destes que acabaram.
Transcrevemos essas frases para avaliarmos a luta interior vivida pelo infeliz mais bravo Coronel Camisão. Numa dessas conferências com os oficiais, ele sugeriu um novo arranjo no transporte dos doentes, a cuja ideia se manifestaram contrariamente os presentes, considerando-a inexequível. O Coronel Camisão julgava que somente a urgente e rápida marcha da Coluna poderia salvar o resto da Força, cujo empecilho era o transporte moroso dos enfermos, considerando-se, também, impossível levá-los mais longe.
À meia-noite, então, convoca o Comandante-chefe uma nova reunião, quando a iniciou com palavras concisas e objetivas acerca da situação da Expedição, para finalmente concluí-la, comunicando sua extrema decisão: abandonar os doentes à comiseração do inimigo. Assumiu inteira e exclusiva responsabilidade. Somente os convalescentes seguiriam. Após essa terrível e dolorosa comunicação e resolução, diz Taunay que não houve uma só voz que contra esta medida se levantasse e:
longo silêncio acolheu a ordem, sancionando-a.
A seguir, se não bastasse o sofrimento dos médicos militares sem os meios terapêuticos necessários para salvar aqueles bravos soldados, o Coronel Camisão ainda aumentou-lhes os tormentos com um grave problema de deontologia médica ([1]), ao convidá-los a apresentar-lhe objeções, acaso inspiradas pelo dever profissional, diante de sua determinação.
Ouviu-se, então, a opinião discordante do Capitão 1° Cirurgião, Dr. Manoel de Aragão Gesteira, com o impacto daquela ordem, disse que:
depois de alguma reflexão, que não ousava aprová-la nem a desaprovar, só lhe competia, então, o silêncio, pois se de um lado tinha de atender ao seu juramento profissional, por outro achava-se este, no caso atual, em contradição absoluta com a sua consciência de funcionário público adido à Expedição (TAUNAY, 1874).
Era, sem dúvida, o protesto velado contra a desumana ordem, mas como médico militar, o Dr. Gesteira não poderia dizer outra coisa. A sua obrigação era preservar e recuperar a saúde dos soldados, cujo destino cabia, exclusivamente, ao chefe da Coluna. A decisão de casos como este compete ao comandante das Forças, em situações extremas e desesperadas, e parece-nos que é o conceito até hoje mantido e aceito. Dessa maneira, a prerrogativa assumida plenamente pelo Cel Camisão, fê-lo digno de um chefe militar autêntico. Após o pronunciamento do oficial médico, o Coronel Camisão, ordena que
à luz de fachos imediatamente na mata vizinha se abrisse uma clareira, para onde seriam transportados e abandonados os enfermos.
E acrescenta ainda Taunay:
Ordem terrível de dar, terrível de executar; mas, no entanto [forçoso é confessá-lo], não provocou um único reparo, um único dissentimento.
Dizem que os pobres doentes aceitaram resignadamente a solução para suas vidas, possivelmente diante do estado agônico ([2]) em que a maioria se encontrava, como afirmam as partes oficiais, só pedindo que lhes deixassem água.
Em um tronco de árvore, foi pregado um cartaz, dizendo em letras garrafais: “Compaixão para os coléricos!” E essa compaixão se estendia a 123 ([3]) infelizes brasileiros, ali deixados à própria sorte. Pouco depois, ao mover-se a Coluna, ouviu-se a fuzilaria inimiga. Era um Esquadrão de Cavalaria paraguaia, imolando os nossos enfermos à bala e depois
Lanceando a eito ([4]), sem poupar nenhum, aos que se achavam ao alcance de seus braços,
conforme narra uma testemunha ocular mais adiante citada. E diz sobre esse momento dramático o comandante interino da Coluna, em sua parte oficial:
Cena medonha que fica indelevelmente marcada no espírito daqueles que ouviram os gritos dos míseros coléricos!
Já Taunay escreveu acerca desse instante funesto:
Ninguém de nós ousava olhar para o companheiro!
O abandono dos moribundos fora, realmente, uma ordem terrível que não podemos aceitar, mas, cuja resolução somente os que viveram aqueles momentos de desespero e de salvação poderiam medir e decidir. Taunay volta para a Corte [Rio de Janeiro], como emissário oficial, levando a notícia da desastrosa Retirada da Laguna, entrevista-se com o Imperador Dom Pedro II, que ao ouvi-lo, disse:
Bem, lerei com todo o cuidado as partes oficiais. Mas como foram abandonar feridos e doentes? Enfim… tudo verei (TAUNAY, 1874).
O abandono dos doentes recebeu, também, crítica severa de Cuvillier Fleury, membro da Academia Francesa, e de outros escritores (TAUNAY, 1874). O Dr. José Pereira Rêgo, futuro Barão de Lavradio, no Relatório da Junta de Higiene Pública, já citado, de 26.03.1868, manifesta o horror que lhe inspirava a narrativa dos acontecimentos e não pôde silenciar quanto à posição assumida pelo bravo mas infeliz comandante da Expedição, ao:
Dar o passo lamentável que deu, abandonando na retirada tantos brasileiros dignos de melhor sorte, os quais nem ao menos tiveram em sua desventura, uma mão carinhosa que os amparasse nos últimos momentos de seu fim desgraçado e lhes cobrisse o corpo inanimado com um pouco de terra da Pátria, em holocausto da qual morriam, porque, entregues à brutal ferocidade de seus inimigos, foram por estes trucidados no leito de dor quando toda resistência de sua parte era impossível pelo aniquilamento das Forças físicas e morais. (REGO FILHO)
Sabemos que um desses infelizes soldados pôde escapar, juntando-se aos seus companheiros, cujas peripécias da fuga, narrou-a com minúcias, muitos anos depois, em agosto de 1919, ao escritor Godofredo Rangel, que a publicou na “Revista do Brasil” n° 55, julho de 1920. Chamava-se Calixto Medeiros de Andrade e residia, na época, na cidade Estrela do Sul, Minas Gerais. Em seu depoimento, afirmou este sobrevivente, que com a aproximação do inimigo, depois de pular por cima dos companheiros, conseguiu entrar no mato e escapar.
Continuou a engatinhar pelo mato abaixo e após muito esforço saiu no campo, porém, os paraguaios e seus cães adestrados estavam nas imediações.
Depois de passar desapercebido e arrastar-se pelo campo, encontrou um cavalo muito magro e utilizando uma tira de pano, atadura de dois metros de comprimento, que estava enrolada no braço em que o médico o sangrara, adaptou-a como cabresto no animal e cavalgou com cautela. Diz, também, que na inconsciência provocada pela moléstia, nem sabia que havia sofrido uma sangria… Ao aproximar-se do acampamento brasileiro, ainda com os paraguaios nas vizinhanças, seus companheiros o avistaram e vieram em seu auxílio. Deram-lhe um presente que muito o agradou: duas laranjas.
Assim, ao reunir-se, novamente, à Coluna, o nome desse herói deixou de figurar na relação oficial dos que foram deixados no pouso pela Expedição. Hoje, ao localizarmos a relação nominal dos cento e vinte infelizes heróis e mártires, cuja publicação sai em Anexo a este ensaio, transcrevemo-la com imensa emoção, pois, representa uma homenagem efetiva e duradoura. Seus nomes que são apresentados pela primeira vez nos anais da história da Guerra do Paraguai, merecem ser gravados no monumento consagrado aos heróis da Laguna e Dourados, na Praia Vermelha, agora não os mártires desconhecidos como lá estão afigurados, mas identificados e recordados eternamente pelos pósteros. A lembrança de cada um daqueles brasileiros deve receber sempre a nossa sentida reverência do reconhecimento e da gratidão, como dos mais infelizes soldados imolados no cumprimento do dever, cujas vidas representam a própria imortalidade da Pátria Brasileira e o sentimento de humanidade universal.
* * *
Em todo o nosso trabalho e principalmente quando estudamos a evolução da Coluna Expedicionária de Mato Grosso, tivemos a preocupação de apresentar dados aproximadamente reais sobre os efetivos e perdas humanas, tendo para isso procurado as fontes oficiais. Entretanto, devemos reconhecer, que não foi tarefa fácil reunir esses números, pois são bastante falhos e deficientes os documentos de informações a respeito. Alguns historiadores, comumente, desprezam esses dados pela preocupação de revelar as operações da luta e quando o fazem são exagerados nos efetivos ou os omitem completamente.
Na Retirada da Laguna não poderíamos, igualmente, desviarmo-nos dessa orientação inicial, ainda mais para não dramatizá-la como é comum sua apresentação nos compêndios históricos.
Também não podemos concordar com o General Tasso Fragoso, emérito historiador militar, que considerava a Retirada da Laguna como
Operação militar desvaliosa, célebre apenas por ter se caracterizado pela falta de comida… (PAULA CIDADE, 1959).
Não, assim é demais. A invasão do território inimigo foi um erro grave e revestiu-se da ausência de grandes batalhas, mas com ataques violentos da cavalaria paraguaia que foram bravamente repelidos, entretanto a retirada em si e as solicitudes relembradas com o rosário de episódios e resoluções militares são suficientes para serem apresentadas como fatos merecedores de exaltação.
Assim, no que se refere ao efetivo e perdas humanas em consequência da Retirada da Laguna, sabemos que, na invasão do Paraguai, pelo norte da República, a Coluna Brasileira compunha-se de 1.907 praças. Depois da penosa marcha de retirada, no acampamento na margem do Rio Aquidauana, tínhamos 1.329 homens, apresentando o número de baixas em 578, entre mortos, feridos e desaparecidos, conforme quadro demonstrativo publicado por E. C. Jourdan (JOURDAN, 1893) com as “relações de mostra dos corpos” que compunham a Expedição. Tivemos oportunidade de apresentar no final do capítulo anterior, o total das Forças Brasileiras, em Nioaque, a 01.02.1867, cujo efetivo era de 2.084 homens, porém, nos três meses decorridos até a invasão, possivelmente, houve essa alteração por motivos vários e pelo desfalque com o destacamento que ficara sob as ordens do chefe da Repartição Fiscal, Coronel Francisco A. de Lima e Silva, naquela localidade. O Coronel Emílio Carlos Jourdan, em seu citado trabalho, reproduziu também um mapa com
A relação de mortos e feridos nos combates dos dias 6, 8, 11 e 18 de maio, extraviados por ocasião dos mesmos combates, falecidos e abandonados, atacados pela cholera-morbus, falecidos por explosão e afogados,
assinado pelo Bacharel Antônio Florêncio Pereira do Lago, Capitão Assistente do Ajudante-General, datado de 14.06.1867, no acampamento na margem esquerda do Rio Aquidauana. Esse mesmo mapa fomos localizar no Arquivo Nacional ([5]), cuja relação é a seguinte:
Mortos em combate ___________________ 030
Feridos ________________________________ 041
Extraviados ___________________________ 001
Falecidos, atacados pela cólera ________ 174
Moribundos coléricos abandonados no pouso _ 122
Falecidos por explosão________________ 009
Afogados _____________________________ 003
Total: __________________________ 380 homens
Desse modo, sabendo que as baixas orçaram em 380 homens acima relacionados, mais os 198 praças considerados desaparecidos, conforme o mapa com as “relações de mostra dos corpos” citado anteriormente, o total geral das perdas humanas da Retirada da Laguna é de 578 homens. O único extraviado acima relacionado é o Alferes Capelão, Padre Antônio Augusto do Carmo, das Forças mineiras, que tendo baixa por doença na Colônia de Miranda, não pôde acompanhar a Expedição quando esta seguiu para a fronteira do Apa. Após receber notícia da volta da Coluna e encontrando-se já restabelecido, o sacerdote partiu resolutamente para se juntar à mesma, em vez de recuar em direção a Nioaque.
Armado de clavinote ([6]) e revólveres à cintura, o Padre Carmo caminhou durante dois dias, quando no terceiro dia avistou-se com um troço de cavalaria paraguaia e começou sozinho a fazer fogo, sendo, então, cercado e ferido. Depois de muito espancado foi levado como prisioneiro para o Paraguai, tendo falecido em Concepção. Depois dessa narrativa, acrescenta Taunay sobre o Padre Carmo:
Que juízo devemos dele fazer? De simples insensato ou ingênuo herói? (TAUNAY, 1948).
Numa relação nominal dos oficiais e praças mortos pela cólera, apresentada pelo Capitão assistente do Ajudante-General, no acampamento na margem do Rio Aquidauana [Porto Canuto], em 15.06.1867 ([7]), assinala o nome do Soldado JOÃO PACHECO DA COSTA, da Companhia de Enfermeiros, que aqui consignamos com as nossas homenagens. E ao encerrarmos este capítulo sobre episódio da Retirada da Laguna, não podemos fazê-lo sem antes prestar uma reverência mui especial aos oficiais médicos, Capitães 1os Cirurgiões, Drs. QUINTANA e ARAGÃO GESTEIRA ([8]), cujas atuações relevantes na Retirada foram assinaladas pelas Ordens do Dia e comprovam a abnegação, o estoicismo, a fé, a coragem e o sangue frio diante de tanta miséria.
Podemos proclamar sem paixão, que esses dois profissionais pela posição que exerciam, representaram os condutores morais dos retirantes, para a salvação da honra e da dignidade do Brasil. Sobre eles se concentravam a derradeira esperança contra a morte e o lenitivo do calor humano, conforto tão necessário junto àqueles heróis. Hoje, da lembrança e evocação desses abnegados e dedicados médicos que souberam cumprir os preceitos hipocráticos e militares, somente existem os medalhões com suas efígies, no Monumento aos Heróis de Laguna e Dourados, na Praia Vermelha, Rio de Janeiro, RJ. A ideia inicial do monumento aos “Heróis da Laguna e Dourados” surgiu na Escola Militar, em 1903, em aula proferida pelo Prof. Lobo Vianna, mas coube ao então Tenente Pedro Cordolino Ferreira de Azevedo, no ano de 1920, motivar a mocidade militar que abraçou com entusiasmo a sua realização. O Professor Cordolino de Azevedo foi eleito, pelos Cadetes, Presidente da Comissão Central do monumento. Este oficial
No limiar de cada ano buscava energias novas ao contato das turmas de Cadetes,
arregimentando legionários para a bela causa patriótica e assim, graças à sua perseverança, tenacidade e esforços ingentes, pôde assistir a inauguração do monumento, em 1938, depois de dezoito longos anos de exaustivo trabalho. A concretização do monumento deveu-se à contribuição de donativos das corporações militares, governos e povo, e representa o símbolo votivo de inspiração do dever para com a Pátria. Finalmente, devemos manifestar contritamente como homenagem duradoura aos médicos-soldados, doutores GESTEIRA E QUINTANA: a Nação Brasileira lhes é agradecida eternamente pelos edificantes exemplos assinalados na gloriosa jornada! (CONTINUA…)
Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 15.09.2023 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.
Bibliografia
SOUZA, Luiz de Castro. A Medicina na Guerra do Paraguai (I a V) – Brasil – São Paulo, SP – USP, Revista de História, 1968, 1969 e 1970.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
- Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
- Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
- Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
- Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
- Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
- Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
- Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
- Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
- Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
- Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
- Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
- Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
- Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
- E-mail: [email protected].
[1] Os deveres e regras de natureza ética da classe médica. (Hiram Reis)
[2] Agônico: de agonia. (Hiram Reis)
[3] Havia certa controvérsia quanto ao número de doentes abandonados, pois, Taunay na “A Retirada da Laguna”, assevera 130 praças e em sua “Narrativas Militares” fala em mais de 200 homens. Já o comandante da Expedição, Major José Tomás Gonçalves, em sua parte oficial, datada de 16.06.1867, consigna cerca de 76 moribundos, deixados no referido pouso. A parte oficial do Corpo de Saúde, assinada pelo Dr. QUINTANA, assinala 122 o número dos doentes abandonados por ordem superior, excluindo o cabo Calixto de Medeiros de Andrade que conseguiu escapar com vida. (SOUZA)
[4] Lanceando a eito: golpeando com as lanças a esmo. (Hiram Reis)
[5] IG 1 – 242, doc. 417. (SOUZA)
[6] Clavinote: pequena carabina. (Hiram Reis)
[7] Arquivo Nacional. IG 1 – 242, Doc. 422. (SOUZA)
[8] Radicou-se na cidade de Ouro Preto, MG, onde contraiu núpcias, antes de partir para o Paraguai, com D. Carlota Augusta de Magalhães Gomes Gesteira, de cujo consórcio nasceram os seguintes filhos: Francisco, Aristides, Rodrigo e Jaime. O primeiro matriculou-se na Faculdade de Medicina da Bahia, indo terminar o curso na Faculdade do Rio de Janeiro, em 1900, tendo clinicado na cidade natal e em Nova Lima, e sendo diplomado em farmácia pela Escola de Ouro Preto; o segundo e o terceiro, se formaram em direito, tendo Rodrigo se fixado na Bahia, exercendo a advogaria. O Dr. Manoel de Aragão Gesteira faleceu em 1889, na cidade de Lambari, quando muitos anos antes havia se reformado no posto de Major Cirurgião-mor de Brigada. (SOUZA)
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