Jornada Pantaneira

O canoeiro

Antonio João Ribeiro – Parte II

De Onde Veio Antônio João

Quando morreu, Antônio João, tinha 39 anos, pois nascera em Poconé, Mato Grosso, em 24.11.1825, filho de Manoel Ribeiro de Britto e Rita de Campos Maciel.

Procurando recompor a sua árvore genealógica, o General Valentim Benício escreve:

Antônio João é ainda hoje um mistério. Pouco se sabe dos ascendentes e os descendentes desapareceram em lamentável penumbra. Parece que foi exceção na família, o único na história nacional. Do casal Ribeiro de Brito Campos Maciel houve apenas dois filhos, Antônio João e Anna Rondon de Arruda. Vagas informações de família, a custo arrancadas a um mutismo explicável, permitiram-nos há pouco, ao desaparecer o único filho de Antônio João construir uma, árvore genealógica, consoante dados fornecidos por um de seus netos, Ezequiel Pompeu Ribeiro de Siqueira.

Nessa árvore aparece o casal Antônio João ‒ Anna Maria. É uma história de amor que apenas referimos, justificativa das dificuldades que encontramos na busca de informações, sintomas do temperamento ardente e apaixonado do herói de Dourados, quiçá precioso elemento para um estudo mais acurado a que não nos aventuramos. De Antônio João ficou apenas um filho ‒ Thomé Ribeiro de Siqueira ‒ falecido em 14.08.1937, na capital do Estado do Mato Grosso. De seus netos, provenientes do casamento de Thomé Ribeiro de Siqueira com sua prima Franklina Ribeiro de Siqueira, restam três ‒ Antônio João, Jacintho e Ezequiel Pompeu Ribeiro de Siqueira.

A vida modesta de seus descendentes não deixa perceber continuadores de um temperamento arrebatado e afeito a lances que só repetiram, incontidos no amor, arrojados no convívio social, decisivos na ação profissional, inflamados em nobre civismo, coroados de magnífica renuncia no momento supremo do sacrifício es­pontâneo. De onde lhe vieram virtudes excelsas só nele conhecidas? É uma incógnita cujo valor não nos foi dado determinar.

A distância do meio em que vivem seus descen­dentes, o pouco interesse dos historiadores e a imperdoável modéstia, quase displicência, de sua própria estirpe, tudo concorre para que se conserve misteriosa a vida de um brasileiro digno da maior glorificação, da mais sublime e meritória exaltação. Os ligeiros traços que aqui deixamos talvez conduzam ao caminho largo da verdade histórica e à significação psicológica do extraordinário feito a custo arrancado à poeira dos arquivos, ao silêncio das paragens remotas que lhe não repetem os ecos.

Antônio João (SANTOS MEYER) – Copia.

Talvez um dia o viandante descuidado possa ouvir, naquelas quebradas e coxilhas, o mesmo brado que os espartanos esculpiram para a eternidade na rocha das Termópilas. E a História terá pago uma dívida sagrada, cujo vencimento ela só admite no perpassar dos séculos. Vale a pena contar, em resumo, uma historieta oriental, em que aparece um herói moço que teve como prêmio das suas proezas que salvaram um reino o posto de generalíssimo e a filha do rei em casamento.

Ao celebrar-se a cerimônia nupcial, segundo as praxes do reino, um arauto proclamou alto as origens da noiva. Ao ter de fazer o mesmo com o noivo calou-se. Não tinha o que dizer. O herói então tirou-o do embaraço e exclamou desembainhando a espada:

‒  Sou filho desta espada. Número 1 da sua dinastia.

Houvesse Antônio João sobrevivido ao lance em que pereceu e talvez dissesse a mesma coisa. Porque ele foi também o número um ‒ e sem sucessão ‒ na história da nossa bravura militar. (CORREIO DA MANHÃ N° 13.541)

Cruzeiro de Antônio João (SANTOS MEYER)

O Ministério do Exército publica, em 29.12.1964 1ª Edição), uma publicação comemorativa à heroica defesa da Colônia dos Dourados, denominada Antonio João, de autoria do Ten Cel Walter dos Santos Meyer. Nesta biografia encontramos a Fé de Ofício de Antônio João Ribeiro:

Ministério do Exército, SGEx
Imprensa do Exército
Rio de Janeiro, RJ, 1969

Antônio João
(Ten Cel Walter dos Santos Meyer)
* 2ª Edição *

Anexo
Fé de Ofício de Antônio João Ribeiro
(Pasta I-18-7 do Arquivo do Exército)

Lucio Ribeiro d’Almeida Raposo, Major do Corpo de Cavalaria de Mato Grosso, e Comandante interino do mesmo.

Certifico que do Livro Mestre que serve de registro dos assentamentos das praças do referido Corpo, tem o oficial abaixo declarado os do teor seguinte.

Segunda Companhia

Alferes Antonio João Ribeiro, filho legítimo de Manoel Ribeiro de Brito, natural de Poconé, Província de Mato Grosso, nasceu em 1823, solteiro, altura sessenta e quatro polegadas ([1]), cabelos pretos e lisos, rosto comprido e claro, olhos pretos, barba pouca e preta.

Promoções:

Em 1841 – Assentou praça voluntariamente no 12° Batalhão de Caçadores da Província de Mato Grosso a 06.03.1841, Cabo em primeiro de abril do dito ano; Furriel a três da agosto do sobredito ano.

Em 1842 – Segundo Sargento em 01.01.1842.

Em 1845 – Primeiro Sargento em 01.05.1845.

Em 1849 – Sargento Ajudante graduado a 22.03.1849.

Em 1852 – Alferes por Decreto de 29.07.1852.

Nomeações:

Em 1841 – Passou para o Batalhão Provisório a 24.11.1841

Em 1843 – Para o Corpo Fixo de Caçadores em 01.04.1843.

Em 1844 – Para o 1° Corpo Fixo em 01.11.1844.

Em 1847 – Para o Corpo Fixo de Caçadores em primeiro de março de mil oitocentos e quarenta e sete.

Em 1849 – Para o Corpo Fixo de Cavalaria Ligeira em 22.05.1849.

Em 1851 – Para o Corpo de Cavalaria de Mato Grosso em 07.10.1851.

Movimentações:

Em 1842 – Destacou para a Fronteira do Baixo Paraguai a 18.06.1842.

Em 1844 – Recolheu-se a 03.10.1844.

Em 1846 – Marchou a comandar o Destacamento dos Dourados no Baixo Paraguai em 08.06.1846.

Em 1848 – Seguiu para a Fortaleza de Coimbra a 02.03.1848, e recolheu-se a dezoito de maio do dito ano. Marchou em diligencia ao Distrito Militar de Mato Grosso em 01.07.1848, e apresentou-se a nove de setembro do mesmo ano. Marchou em diligência ao Distrito Militar de Villa Maria a doze do dito mês, e apresentou-se a cinco de outubro do mesmo ano.

Em 1849 – Seguiu a comandar o Destacamento dos Dourados a 06.05.1849.

Em 1850 – Recolhendo-se à Cuiabá a 31.05.1850, tornou a seguir destacado à Fronteira do Baixo Paraguai.

Em 1851 – Marchou em diligência à Corte do Rio de Janeiro a 21.01.1851, onde foi adido ao 1° Regimento de Cavalaria Ligeira a vinte nove de abril do referido ano. Por Aviso da Repartição da Guerra de vinte e oito do dito mês, foi admitido como ouvinte da Aula Militar, onde obteve o grau três em aritmética, dois em francês e um em geografia.

Em 1852 – Por Aviso da Repartição da Guerra de quinze e ofício do Quartel General de 17.07.1852, foi mandado chamar para o serviço por ter sido inabilitado do exame de suficiência ao primeiro ano da Escola Militar.

Em 1853 – Recolheu-se ao Corpo estacionado em Villa Maria a 26.01.1853.

Licenças:

Em 1842 – Registradas por três meses a 08.04.1842: presente a 09.06.1842.

Em 1848/49 – Por três meses a 21.10.1848; presente em 01.02.1849.

Prêmios e Castigos:

Em 1853-55 – No Livro de Prêmios e Castigos consta o seguinte: Foi preso, em 13.07.1853, por ter saído fora do Exército sem licença, solto no mesmo dia. Foi preso em vinte e cinco por responder ao Capitão comandante, estando debaixo de forma; solto em vinte e seis do dito mês. Preso a vinte e sete de novembro e recolhido à capital a quatorze de dezembro tudo do dito ano, pelo ferimento feito na pessoa do Capitão Francisco d’Assiz Machado Bueno.

Respondeu a Conselho de Guerra, e sendo absolvido pelo mesmo em 23.02.1854, foi reformada a sentença, e condenado a um ano de prisão pelo Conselho Supremo Militar de Justiça de vinte e um de junho do mesmo ano; solto em 21.06.1855, e destacou para a Fronteira do Baixo Paraguai em vinte e oito de novembro do dito ano.

Nada mais consta dos seus assentamentos aos quais me reporto; em firmeza do que mandei passar a presente, em que me assino, e vai selada com o sinete do Corpo. Quartel em Villa Maria, 07 de novembro de 1856. E eu o Tenente Antonio Maria Xavier, Secretário interino que a subscrevi e conferi.

Lucio Ribeiro d’Almeida Raposo

O que acima transcrevemos é a Fé de Ofício existente no Arquivo do Exército. Pode ser complementada oficiosamente utilizando-se o que publicaram Armando de Arruda Pereira [Heróis Abandonados! – São Paulo, 1925]; Valentim Benício da Silva [Antonio João – Bibliex, 1928) e Walter Spalding [A Invasão Paraguaia no Brasil – Cia. Editora Nacional, 1940].

‒  Em 1857 – Foi elogiado em ordem do dia n° 83 do Comandante das Armas pelo bom resultado da Comissão de que foi incumbido de afugentar do sertão desta Província os índios bravios que infestavam a sua estrada sabendo conduzir uma escolta composta de quarenta praças de linha sob seu comando em 28.11.1857.

‒  Em 1858 – Recolheu-se ao Corpo a 26.01.1858; marchou com o mesmo e para o Distrito Militar de Miranda em primeiro de maio do mesmo ano onde chegou a treze do dito.

‒  Em 1859 – Foi nomeado pelo Presidente da Província para ir comandar o 9° Destacamento de São Lourenço pelo que seguiu para Cuiabá a 02.06.1859, onde ficou adido ao 2° Batalhão de Artilharia a Pé até primeiro de julho do mesmo ano, quando partiu para seu destino.

‒  Em 1860/61 – Foi desligado do mesmo Batalhão, em 01.10.1860, para recolher-se ao Corpo ao qual apresentou-se a 04.01.1861; passou a exercer as funções de Agente por eleição do Conselho Econômico a sete do dito mês e ano.       Por ofício do Comando das Armas desta Província n° 19 de 28.02.1861 foi ordenado que se averbasse em seus assentamentos a seguinte nota:

  Tem a seu favor as vantagens do artigo oitavo da Lei de 18.08.1852 desde 26.01.1853 até vinte e sete de novembro do mesmo ano em que foi preso e de 21.06.1855 em que foi solto até 30.07.1856 em que foi extinta a mesma Lei.

‒  Deixou o exercício de Agente em 01.07.1861.

‒  Em 1862 – Marchou em diligência aos Campos da Fronteira de Miranda ao encontro da partida paraguaia que invadiu o nosso território coman­dada pelo Tenente da República Pedro Pereira, a fim de fazê-la retirar-se a 12.02.1862; recolheu-se, a vinte e três e a vinte e sete tudo do mesmo mês e ano, e seguiu em tomar o comando da Colônia Militar dos Dourados;

‒  Em 1863 – Por aviso do Ministério da Guerra de 02.07.1863 foi louvado e agradecido pelo Governo Imperial pela oferta que fez de uma parte de seus vencimentos para as urgências do Estado.

Finalmente, pode esta Fé de Ofício ser completada com o seguinte:

Em 1865 – A 06.11.1865, a ordem do dia n° 482 da Repartição do Ajudante-General da Secretaria de Estado dos Negócios da Guerra comunicava o falecimento do Sr. Tenente do Corpo de Cavalaria da Província de Mato Grosso Antonio João Ribeiro em ataque com os paraguaios na Colônia dos Dourados, por ocasião da invasão da mesma Província. (SANTOS MEYER) (SGEx)

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 27.09.2023 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem. 

Bibliografia  

CORREIO DA MANHÃ N° 13.541. Resgata-se uma Dívida de Gratidão – Uma Síntese Histórica da Bravura de Antônio João … – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Correio da Manhã n° 13.541, 29.12.1938.  

SGEx – Antônio João – Ten Cel Walter dos Santos Meyer – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Ministério do Exército, SGEx – Imprensa do Exército, 1969.   

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;  

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: [email protected].

[1]    64 polegadas = 162,56 cm. (Hiram Reis)

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