O Projeto de Pesquisa: Inovação Territorial para Jovens e Adultos da Comunidade Remanescente do Quilombo do Igarapé Preto, em Oeiras do Pará, realiza entre 14 a 18 de agosto, das 18  às 22 horas, na Escola Municipal Zumbi dos Palmares, localizada na BR- 422, na Região do Baixo Tocantins, mais um ciclo de capacitação para jovens e adultos do território sobre a Moda Afro-brasileira, o vestir como resistência e combate à discriminação racial. A iniciativa marca a continuidade do Projeto que é uma parceria firmada entre a Comissão de Regularização da Universidade Federal do Pará (CRF-UFPA), a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Educação Superior, Profissional e Tecnológica do Pará (Sectet) e as famílias quilombolas, além do suporte operacional da Fundação Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp).

Recorte de tecido africano

Para Ysa Almeida Brasil, mestre em Comunicação, Linguagem e Cultura pela Universidade da Amazônia (Unama) e especialista em Língua Portuguesa e Literatura em Sala e Aula, responsável pela capacitação no quilombo, o objetivo deste novo ciclo “é fornecer aos participantes um conhecimento sobre os fundamentos da moda, desde o design até a produção, preparando-os para atuar de forma criativa e profissional no quilombo e no mercado”, detalha.

Professora Ysa Almeida

Os conteúdos da capacitação, segundo ela, estão estruturados em cinco encontros de quatro horas de aula por dia, onde serão debatidas as temáticas sobre os Fundamentos do Design de Moda; Expressão Criativa e Design; Processo de Criação e Produção; Noções de Editorial e apresentação do material produzido pelos participantes e a vinculação com as mídias sociais. “Quando somamos a teoria e a prática para fazer a moda afro-brasileira, agregamos valor, conhecimento e autonomia para os participantes do território”, ensina Ysa.

Liderança do Quilombo, Nivia, e da CRF-UFPA Renato e Kelly

O Projeto de Pesquisa se fundamenta no tripé acadêmico de ensino, pesquisa e extensão. “No momento em que o Brasil e o Estado do Pará realizam os Diálogos Amazônicos para debater as potencialidades latino-americanas rumo à realização da COP-30, o foco da capacitação sobre moda afro-brasileira promove o desenvolvimento humano e social equitativo da comunidade, por meio das famílias do território que desenvolvem as suas práticas culturais agroalimentares”, informa Kelly Alvino, integrante da CRF-UFPA.

Detalhe de corte do tecido

Para ela, a comunidade o Igarapé Preto têm a vocação para integrar uma rede de empreendedores interessados em escoar a produção local como um modelo de negócio inovador de base comunitária. “Este cenário fortalece identidade étnica como elemento de reafirmação, pertencimento e de combate à discriminação e a violência racial brasileira”, reflete Kelly, que participou dos Diálogos com os gestores do Projeto e o vice-reitor e reitor da Universidade Federal do Pará, Gilmar Pereira e Emmanuel Tourinho, respectivamente.

Modelo de turbante

Por sua vez, Renato das Neves, engenheiro pesquisador e Coordenador do Projeto, debater a moda afrodescendente com os jovens e adultos é colocar em prática uma metodologia e uma ação educacional que estimula a comunidade a combater o racismo estrutural impregnado de violência na sociedade brasileira.  Os dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD C), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que em 2020, 11.939 homens negros foram mortos com armas de fogo nas regiões metropolitanas e capitais brasileira. Já 2.558 homens não negros foram assassinados no mesmo período, compara o pesquisador.

Já os dados da Anistia Internacional mostram o crescimento da violência contra a mulher. “Quatro mulheres foram mortas por dia no Brasil no primeiro semestre de 2022. Foram 699 feminicídios só até a metade do ano. Um aumento de mais de 3% em relação ao mesmo período de 2021. E quase 11% a mais do que no primeiro semestre de 2019”, assevera Renato.

O IBGE divulgou recentemente Censo Quilombola 2022, revelando um retrato do país desconhecido. “Um Brasil com 1.327.802 de quilombolas, sendo que apenas 4,3% desse total vivem em territórios titulados, além das marcas profundas deixadas pelas diásporas. A Amazônia também é negra: mais de 30% das e dos quilombolas residem em municípios da Amazônia Legal”, assevera Renato.

Neste contexto, o pesquisador assinala que debater a temática  sobre a moda afro-brasileira é mais uma ferramenta que se soma às capacitações realizadas no quilombo sobre levantamento da cartografia social, turismo comunitário, formação em hospedagem familiar e as estratégias de abordagens de produtos turísticos, além da importância da prática economia circular, da força das mídias digitais e da formação das rotas e guias turísticos, entre outras áreas estruturantes para a sustentabilidade da comunidade.

Renato ressalta, ainda, que é fundamental desconstruir a visão europeia do mundo e resgatar a ancestralidade da cultura e da moda africana como instrumentos de resistência na luta contra o racismo estrutural. “Buscamos, junto com a comunidade, fortalecer a identidade étnica como elemento de reafirmação e pertencimento ao território, assim como  a consolidação de uma base de economia solidária. Nas próximas capacitações abordaremos os temas Marketing  Digital e a Construção de um plano de negócio para ser implementado pela comunidade para que ela caminhe com a sua própria autonomia, além da realização de uma feira de encerramento do Projeto no Quilombo”, antecipa o pesquisador.

Texto: Kid Reis – Ascom CRF-UFPA – Fotos: Arquivo CRF-UFPA – Artes: Edivan Nascimento.  (Fonte: Recebido por Correio Eletrônico (e-mail) do autor)