BELÉM (PA) – O parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), publicado nesta semana, conclui que a ausência da chamada Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) não pode impedir a concessão de licenciamento ambiental para exploração de petróleo na bacia da Foz do Rio Amazonas, no Amapá. Entretanto, para ambientalistas da região, o posicionamento da AGU é equivocado, dada a importância da AAAS para a prevenção de danos ambientais no ecossistema.
O engenheiro florestal Carlos Augusto Pantoja, do Coletivo Campesino Amazônico (Coca), argumenta que a AAAS é um instrumento de planejamento econômico e ambiental essencial, que permite analisar os projetos de produção de gás natural e petróleo em regiões ainda não exploradas. Além disso, é um “ganho da sociedade para apontar erros de concepção de projetos e prever acidentes como vazamentos e impactos na biodiversidade local“.
“A Avaliação Ambiental de Área Sedimentar permite que a gente possa entender de forma mais ampla o funcionamento da natureza e propor adequações sobre as atividades petrolíferas, ligando tais informações com o contexto socioambiental das regiões em que se pretendem instalar projetos de extração de petróleo. É assim que o Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] aponta se as ações estão corretas ou não, e lança as recomendações para as tomadas de decisões dos projetos“, explica Pantoja.
A falta do AAAS foi o principal argumento utilizado pelo Ibama para negar, em maio, o licenciamento ambiental solicitado pela Petrobras para realizar atividade de perfuração marítima no local. De acordo com o ambientalista, fazem parte do AAAS dois instrumentos de avaliação: o Termo de Referência (TR), contendo as especificações técnicas para coleta e análise das informações e o Estudo Ambiental de Área Sedimentar (EAAS), um documento multidisciplinar com foco na avaliação das condições e características socioambientais da área.
“O EAAS considera a relação das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural com a vida dos territórios. Sem essa avaliação, danos previsíveis podem ser subestimados ou mesmo negligenciados. É necessário que a população e, principalmente, os povos indígenas, pescadores, extrativistas e pessoas das áreas urbanas participem desta construção“, diz o pesquisador.
Dados
Flávia Guedes, mobilizadora da frente de bacias hidrográficas e oceanos do Instituto Mapinguari, afirma que mesmo com o posicionamento da AGU apontando o AAAS como dispensável, a voz do Ibama tem que falar mais alto nesta briga de narrativas. “A autarquia responsável pelo licenciamento ressaltou a necessidade da AAAS, portanto, se suas exigências esclarecem as necessidades da avaliação ambiental de área sedimentar, é importante que assim se cumpra“, declara.
Ela considera ainda que a AAAS tem possibilidade de dar uma luz para mais informações sobre o ecossistema amazônico, sendo benéfico não apenas na segurança de uma possível exploração do petróleo, mas para a ciência.
“As bacias hidrográficas da Amazônia sempre foram negligenciadas e, atualmente, carecem de muitas informações e dados científicos. Então, é extremamente necessário compreender que a região possui uma alta sensibilidade, tendo proximidade com locais que abrigam alta biodiversidade e sendo ainda extremamente importante para populações tradicionais. Uma região de tamanha importância necessita de dados e informações precisas que podem ser levantados diante da AAAS“, argumenta Flávia Guedes.
AAAS é descartável juridicamente
O parecer da AGU foi solicitado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que defende a exploração de petróleo na área. O principal questionamento era se, baseado na Portaria Interministerial MME-MMA N° 198/2012, quando foi instituída a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar, a AAAS é obrigatória para concessão do licenciamento à Petrobras.
Para o parecer, a AGU se baseou em decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) de que a viabilidade ambiental de um empreendimento deve ser atestada no próprio licenciamento e não pela Avaliação Ambiental de Área Sedimentar.
O artigo 22 da portaria determina que os estudos produzidos no âmbito da AAAS, bem como as decisões emanadas de seu processo de aprovação pela Comissão Interministerial, “deverão ser considerados pelos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente – Sisnama, quando do licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural“.
Diante disso, Rafael Feldmann, advogado especialista em Direito Ambiental, analisa que, de fato, a AAAS não é indispensável. “Segundo a portaria 198, a AAAS é um documento propositivo que vai ajudar nas diretrizes, mas é uma obrigação do Estado brasileiro, e aponta que a avaliação não é essencial para a obtenção da licença ambiental“, explica.
“Outro ponto é que as regras feitas pela portaria, criada em 2012, são provisórias. Nós estamos em 2013, ou seja, 11 anos depois da publicação. Em todo esse tempo, nenhuma AAAS foi feita. Temos apenas dois projetos da AAAS que estão em andamento, um na bacia de Sergipe-Alagoas e outro na bacia do Solimões. Em 11 anos, essas AAAS não foram finalizadas. Entretanto, nesses 11 anos, você teve projetos sendo licenciados no Brasil inteiro sem AAAS. Então, dizer que a AAAS é um estudo obrigatório e prévio para o licenciamento ambiental na Foz do Amazonas, juridicamente, é errado, porque isso nunca aconteceu antes. Nós temos várias bacias espalhadas pelo Brasil e todas deveriam ter AAAS, mas em 11 anos ninguém fez“, comenta o advogado.
Rafael concorda que a AAAS qualifica o licenciamento ambiental, por isso, é ideal que seja feita. “Mesmo sendo ideal, ela não é obrigatória e o parecer da AGU diz exatamente isso. Seria ótimo se tivesse sido feito e, sinceramente, eu espero que seja feito para várias bacias sedimentares, porque quanto mais dados e informação a gente tem, melhores serão as análises e decisões“, finaliza.
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Daleth Oliveira – Da Agência Cenarium Amazônia – Editado por Pricila de Assis – Revisado por Adriana Gonzaga – Agência Cenarium Amazônia (aamazonia.com.br)