Jornada Pantaneira

Recordações – Taunay, 1870

Mulheres Guerreiras – Parte XVI

Valquírias Americanas

Alfredo de Escragnolle Taunay, também relata no seu livro “Recordações de Guerra e de Viagem” alguns fatos que nos permitem também traçar um perfil psicológico desta figura extremamente controvertida que foi “Madame” Elisa Lynch López.

Recordações de Guerra e de Viagem
Brasil – São Paulo, SP (1ª Edição)
Editora Weisflog Irmãos, 1920.

[…] Tomado Peribebuí, e abafada qualquer resistên­cia, houve o seu saquezinho, apesar dos esforços para reprimi-lo.

Capítulo IX

Os soldados, porém, entravam nas casas e saíam com muitos objetos, que iam tomando violentamente ou apanhando pelo chão.

Das moradas ocupadas antes pelo ditador López e por Mme Lynch tiraram não pequena quantidade de prata amoedada, peças espanholas do valor de 2$000, das chamadas colunares, por terem as armas de Castela e Aragão gravadas entre duas colunas.

Depois víamos muito esse dinheiro girar no comér­cio. Não poucos soldados, quando penetrei na mora­da da Lynch, passaram por perto de mim, levando em panos e mantas grande porção dessa prata, quanto podiam carregar.

Eu, avisado pelo Tibúrcio, ia à procura de um anun­ciado piano. Havia tanto tempo que estava privado desta distração! Achei, com efeito, o desejado ins­trumento, bastante bom e afinado, até pus-me logo a tocar nele, embora triste espetáculo ficasse ao la­do, o cadáver de um infeliz paraguaio, morto, duran­te o bombardeio da manhã, por uma granada que furara o teto da casa e lhe arrebentara bem em cima.

O desgraçado estava sem cabeça. Fiz remover dali aquele fúnebre diletante, tocando, com grande ardor, talvez mais de duas horas seguidamente. Assim festejei a tomada de Peribebuí.

No quintal daquela habitação, onde havia trastes de luxo moderno e objetos bastante curiosos de antigui­dade jesuíticas, restos de grandezas passadas, a custo e à última hora trazidas de Assunção, encon­trou o Tibúrcio um depósito de vinhos de excelente qualidade, sobretudo caixas de champanhe, de indis­cutível e legítima procedência, e melhores marcas.

Nunca bebemos tão saboroso e perfumado, força é confessar. Tratava-se em regra a imperiosa e inteli­gente mulher que teve tão vasta e tão perniciosa influência sobre o espírito de Solano López e tanto concorreu para a desgraça, as loucuras e horrorosos desmandos de seu amante e para as calamidades do valente e mal-aventurado povo paraguaio.

Bem curiosa deve ser a história ainda imperfeita­mente conhecida dessa Mme Lynch! […]

Capítulo XII

Era evidente que Solano López pretendia não desistir da luta e havia de aproveitar todas as dificuldades naturais do seu tão mal conhecido Paraguai para prolongar quanto possível a luta de emboscadas e guerrilhas, levando as forças que poderiam ir em sua perseguição ao cansaço extremo.

Caminhara para o Norte seguido de uns restos do numeroso exército de outrora tão disciplinado ou antes cheio de fanatismo, que pusera com tanta confiança e ostentação em armas, afrontando a um tempo o Brasil, o Uruguai e a Argentina.

Dos 70 ou 80.000 que congregara no princípio das operações e que dirigiu sempre com a maior inércia, força é convir, quantos homens lhe restavam na sua apressada fuga? Talvez nem sequer 1.500, mal armados e possuídos do mais absoluto desânimo, avassalados, porém, pelo terror ao jugo do ditador que se tornara cada vez mais pesado e cruel.

Parece que Francisco Solano López vivia então em estado de contínua embriaguez, o que pode, até cer­to ponto, explicar os seus planos insensatos e desa­tinos não recuando diante de atrocidade alguma. Levava, aí, presas as duas irmãs e a própria mãe e tencionava entregá-las a um tribunal “ad hoc”, com poderes para determinar até a pena de morte contra estas infelizes!

Era voz geral, que a sua amásia, a célebre aventu­reira Madame Lynch, mulher divorciada do sábio Quatrefages, concorria para tornar ainda mais temeroso e irritado o gênio do déspota; mas é de crer-se que, por fim, essa mesma mulher vivesse sob a ação de contínuo terror. […]

Capítulo XIV

[…] Mme Lasserre, como se sabe, escreveu uma interessantíssima notícia de todos os seus sofrimentos durante a guerra, e com energia de estilo que merece especial menção, deu preciosas informações sobre muitos pontos da sangrenta história do Governo de López e sobre o procedimento ignominioso de vários representantes de nações estrangeiras.

Ao nosso Governo remeteu o Príncipe cópia da expo­sição que esta senhora fez não só das crueldades de que foi, em companhia de seus compatriotas, vítima por parte de López, como das relações que com aquele tirano e Mme Lynch teve o cônsul francês Sr. de Cuverville, tornando-se esse documento digno de toda a publicidade não só pelo interesse que inspira como pela elucidação de muitos fatos importantes, como seja, por exemplo, o de haverem sido, em dezembro de 1868, as casas de Assunção saqueadas por ordem de López, cujos agentes se serviam de chaves falsas ou arrombavam as fechaduras.

De todos os lados nos chegavam notícias e porme­nores do descalabro do lopismo. […]

Capítulo XVI

[…] Dentre os depoimentos interessantes então pelo quartel-general recolhidos figura o do Alferes de Marinha Angel Benites. Era um moço de aspecto vi­vaz e inteligente falando com desembaraço e abun­dância de palavras, e, mostrando-se perfeitamente a par de todas as circunstâncias relativas aos recursos de que ainda dispunha o tirano. Com ele desertaram um Capitão Ramon Vera e um outro, este ajudante-de-ordens de López, Elias Luján.

Com vivas cores pintavam a progressiva dissolução das forças do tirano confirmando as crueldades já sabidas às quais se adicionavam outras, cada vez mais estupendas. Fora Benites empregado do comis­sariado do Exército e relatou que, achando-se López em Itanarán, ordenara um balanço em todas as carretas de dinheiro; ainda dispunha de 10.000 patacões de prata e algumas centenas de onças sem contar grande soma em papel-moeda, que afinal abandonou, sendo o ouro e a prata, daí em diante, levados em cargueiros.

Relatou-nos o alferes paraguaio que assistira em Ascurra à entrega de 28.000 patacões em prata e 600 onças de ouro, feita pelo Ministro Camiños ao plenipotenciário norte-americano, Mac Mahon, então em vésperas de se retirar do Paraguai, onde agira do modo menos diplomático, quase provocando sua atitude inconveniente a ação do nosso Ministério de Estrangeiros junto ao Governo do General Grant. Informou ainda que mais 20.000 patacões haviam sido enviados, por ordem de López, a um tal Gregorio Benítez em França. Eram migalhas que, por meio de amigos, ia o tirano acautelando na Europa no caso de se ver compelido a abandonar o governo da infeliz e heroica nação que aniquilara.

Em Ascurra, ao começar a campanha da Cordilheira, contava o Alferes Benites, ainda o acompanhavam uns doze ou quatorze mil homens, sem contar as forças do Norte. Em Panadero, após Peribebuí e Campo Grande mal dispunha de uns três mil e oito bocas-de-fogo. Onde quer que passasse fazia López os seus infelizes súditos trocar o seu numerário de prata pela moeda que emitira, verdadeiro papel sujo. Assim, segundo conta Thompson, creio, fizera a Lynch com as belas libras de ouro encontradas nas algibeiras dos nossos e dos argentinos, mortos no desastre de Curupaiti, pelos soldados do seu feroz amásio. […] (TAUNAY, 1920)

O Vento

O Vento
(Edson Gaúcho)

Pedi ao vento que leve lembrança pra minha terra.
Pedi ao vento que leve paz, aonde tem guerra.
Pedi ao vento que leve fartura onde tem miséria.
Pedi ao vento que leve um beijo nos lábios dela.

O Vento foi, o Vento vem,
Será que o vento já me atendeu?
Só resta agora você me entender,
Que esse vento é o nosso Deus!

Pedi ao vento que salve os jovens perdidos nas drogas.
Pedi ao vento que espalhe no céu o perfume das rosas.
Pedi ao vento que toda a nação seja gloriosa.
Pedi ao vento proteção aos filhos da mãe amorosa. […]

Pedi ao vento pra acalmar as ondas dos sete mares.
Pedi ao vento que leve harmonia a todos os lares.
Pedi ao vento que leve embora a impureza dos ares.
Pedi ao vento em orações que fiz nos altares. […]

Pedi ao vento pra nos conduzir na estrada da vida.
Pedi ao vento que encontre a criança desaparecida.
Pedi ao vento que dê ao doente conforto e guarida.
Pedi ao vento que a minha prece seja ouvida. […]

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 17.07.2023 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Bibliografia  

TAUNAY, Alfredo de Escragnolle. Recordações de Guerra e de Viagem – Brasil – São Paulo, SP – Editora Weisflog Irmãos, 1920 (1ª Edição).  

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;  

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: [email protected].

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