Jornada Pantaneira

Mulheres Guerreiras – Parte XII

Valquírias Americanas

As resenhas divulgadas pela imprensa nacional e estrangeira, como podemos observar, mostravam, cla­ramente, as estratégias adotadas por estes governos de maneira a incentivar a população nativa, inclusive as mulheres, a participarem do esforço de Guerra princi­palmente como enfermeiras nos Hospitais de Sangue ([1]).

No Paraguai os órgãos de imprensa, vinculados ao Estado, defendiam os interesses do governo mani­pulando as informações e criando fatos com o objetivo de obter total apoio popular.

Toda a mentira é mais crível quanto maior for.
(Joseph Goebbels)

López e Joseph Goebbels

Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade. (Joseph Goebbels)

Com o rádio, destruímos o espírito de rebelião. O rádio deve ser propaganda. E propaganda significa combater em todos os campos de batalha do espírito, gerar, multiplicar, destruir, exterminar, construir e abater. A nossa propaganda é inspirada naquilo que chamamos raça, sangue e nação alemães. (Joseph Goebbels)

A doutrina da propaganda, informação e con­trainformação, ao longo dos tempos, foi sendo aper­feiçoada atingindo o seu clímax na elaboração dos 11 princípios do Ministro da Propaganda da Alemanha Nazista, Joseph Goebbels, o criador do mito do “Führer” (aqui personificado por López). Na Alemanha a racionalidade e o bom senso foram eliminados pela propaganda massiva e pela força, a mídia estatizada e os educandários foram usa­dos à exaustão para promover as ideário do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (mais conhecido como Partido Nazista ou Nazi). Outro cenário, outro povo, novos tempos e a sinistra história se perpetua “ad aeternum”.

Album de la Guerra del Paraguay

Madame Elizabeth Alicia Lynch

Elizabeth Alicia Lynch, nasceu, em 1833, no Condado de Cork (Irlanda), e faleceu em Paris (França), no dia 26.07.1886. Elisa Lynch se casou, em 03.06.1850, com o médico militar francês Xavier de Quatrefages, separando-se dele, em 1853, a união, porém, só mais tarde foi anulada. Em 1852, ainda casada com Quatrefages conheceu Francisco Solano López, filho do presidente paraguaio Carlos Antonio López. Solano López tinha ido à Europa com o intuito adquirir artigos para dinamizar a indústria e a rede ferroviária promovendo a economia do Paraguai. Na oportunidade ele comprou, também, equipamento béli­co em quantidade significativa e um navio chamado “Tacuari” na Inglaterra, além de recrutar engenheiros e médicos para treinar seus compatriotas. Lynch viajou com ele para o Paraguai e ao chegar em Assunção a população paraguaia não a viu com bons olhos porque não queria que Solano López se casasse com uma mulher estrangeira e ainda casada.

Madame Elizabeth Alicia Lynch

No Paraguai, ficou conhecida como Elisa Lynch ou, simplesmente Madame Lynch, uma das muitas amantes do presidente Francisco Solano López que, com o passar dos anos, acabou se transformando na virtual primeira-dama paraguaia. Ao longo dos anos Lynch conseguiu ganhar espaço na alta sociedade chegando mesmo a influenciar na assimilação de algumas tendên­cias, entre elas o teatro de revista, a decoração fran­cesa e a moda europeia. No “Club Nacional”, organi­zava bailes regularmente e recebia as grandes persona­lidades da época na sua casa.

El Semanario n° 680, 04.05.1867

No início da Guerra, ela própria intitulou-se “Mariscala” ([2]) e começou a se fardar com pomposos uniformes militares, acompanhando López em suas visitas às Linhas de Frente e quarteis, dedicando-se, sobretudo, a levar uma palavra de conforto aos enfer­mos, transformando-se numa fonte de inspiração para os fanatizados guerreiros paraguaios.

Ela apoiava todas as ações do seu paranoico “Marechal” sem questionar nem mesmo as inúmeras execuções por ele ordenadas, defendendo, no entanto, alguns prisioneiros de guerra que impediu de serem fuzilados, dentre eles o Coronel Juan Crisóstomo Centurión. Lynch acompanhou o presidente na sua fuga para o Norte, quando abandonavam cada uma das cidades do interior à mercê de seus inimigos.

Quando López foi morto no Combate de Cerro Corá, em 01.03.1870, seu filho Panchito López ao ten­tar defendê-lo foi também morto. Lynch, ao ser captu­rada, invocou sua cidadania inglesa, e, foi removida, pelas autoridades brasileiras, para Assunção.

Lá che­gando, suas propriedades, tinham sido confiscadas, sob a acusação de causar a ruína do povo paraguaio. Lynch retirou-se para a Europa onde, recebia uma gorda pensão, alimentada pelos cofres paraguaios, levou uma vida bastante confortável durante longo tempo.

Cemitério de “Père Lachaise”

A “Mariscala” morreu pobre, em Paris, vítima de um câncer no estomago, depois de ter tentado, sem sucesso, de apossar-se de sua imensa fortuna. Em julho de 1961, o ditador Alfredo Stroessner, confir­mando a tese de que se deve perpetuar o mito consa­grado noutro período ditatorial, mandou transladar seus restos mortais, do cemitério de “Père Lachaise”, para Assunção onde foi enterrada, com toda pompa e cir­cunstância, como heroína nacional no Museu de Defesa de Assunção em uma urna de bronze.

Gazeta de Campinas n° 44
Campinas, SP – Domingo, 31.03.1870
Notícias – Paraguai
Lê-se no “Jornal do Commercio” de 15 do corrente:

Relativamente ao último feito de armas que com a morte de López pôs fim à guerra infeliz e desejado termo, encontramos os seguintes dados, transmiti­dos por um telegrama do Sr. Conselheiro Paranhos ao nosso Ministro de Buenos-Ares:

Assunção, 10.03.1870. Ainda não se recebeu parte oficial, mas somente uma carta do General Câmara, escrita do arroio Guarú, a 2 do corrente.

Referindo-se a essa carta, comunica-me o Capitão de Mar e Guerra João Mendes Salgado, Ajudante de Campo de S. A. o Sr. Conde d’Eu, os seguintes pormenores do grande sucesso de 1° do corrente.

As Forças de López foram surpreendidas, os piquetes que guarneciam as peças de artilharia não tiveram tempo de dar o menor aviso; tinham apenas entrado em forma os últimos defensores do tirano, quando um punhado dos nossos bravos caía sobre eles levando-os em derrota até os bosques próximos, onde mui poucos escaparam. López foi morto à vista do General Câmara que debalde o intimou para ren­der-se; o ex-ditador obstinou-se em animar a resis­tência, procurando, entretanto, fugir; sucumbiu na ponta da lança de um de nossos soldados. Caminos, que foi Ministro do mesmo ditador, teve igual sorte, quando o seguia em sua fuga. O vice-presidente Sanchez foi morto antes de ser reconhecido. O Cel Aguiar, os Majores Vargas, Ascurra, Estigarribia, Cardoso, Insfrante, Solis e vários outros pereceram na peleja.

O Cel López, filho do ex-ditador, foi morto quan­do fugia acompanhado da carruagem de Mada­me Lynch. Estão prisio­neiros muitos chefes, entre eles os Generais Resquim e Delgado, vários oficiais superiores e quatro padres, entre os quais o célebre “Maíz” ([3]). O General Caballero, com quarenta e tantos homens, quase todos oficias, tinha saído de Cerro Corá para arrebanhar gado: foram batidos pelo Coronel Bento Martins, conseguindo fugir o General, abandonando toda a sua bagagem e até a espada. Valle e Souza, que estavam encarregados do transporte de algumas carretas, que se achavam na picada de Chiriguelo, escaparam-se, sacrificando, porém, a Força que os acompanhava, a qual foi derrotada. Rocha, que estava na vanguarda com oito peças de artilharia, também foi derrotado. Avério aproveitou-se da confusão geral para fugir.

Padre Fidel Maíz

Acham-se também prisioneiras Madame Lynch com quatro filhos, a mãe e as irmãs de López. As três últimas estavam condenadas à morte, a mãe do tirano seria executada no mesmo dia em que se verificou o nosso ataque. As famílias de Caballero, Caminos e Gil estão entre os prisioneiros, e todos vão com as nossas forças para a Conceição. Tomamos 17 peças de artilharia. Graças ao Todo Poderoso, tão assina­lado triunfo só nos custa cinco feridos, sendo dois le­vemente. Espera-se a chegada do General Câmara para termos a narração circunstanciada de tão bri­lhante feito militar. (GAZETA DE CAMPINAS N° 44)

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 07.07.2023 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Bibliografia   

GAZETA DE CAMPINAS N° 44. Notícias – Paraguai – Brasil – Campinas, SP – Gazeta de Campinas n° 44, 31.03.1870.   

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;  

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: [email protected].

[1]    Hospitais de Sangue: prestavam o atendimento de primeiro escalão aos feridos que depois de devidamente socorridos eram transportados para a retaguarda. (Hiram Reis)

[2]    Mariscala: Marechal. (Hiram Reis)

[3]    Padre Fidel Maíz: já fizemos menção a ele, foi um dos fundadores e redator chefe do jornal “El Cabichuí”, impresso, durante a Guerra. (Hiram Reis)

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