Rodovia entre Cruzeiro do Sul (AC) e Peru não pode ser feita sem consulta prévia a povos atingidos, diz Justiça

Sentença da Justiça Federal em ação civil pública também proibiu processo de licenciamento que ignore opinião dos indígenas

Arte: Sinacom/MPF

A ação civil pública ajuizada por entidades e organizações da sociedade civil, com o ingresso do Ministério Público Federal (MPF) em conjunto com os autores para anular a licitação que iniciou a contratação de empresas para realizarem projetos básico e executivo da estrada entre Cruzeiro do Sul, no interior do Acre, e a cidade de Pucallpa, no Peru, obteve sentença favorável junto à Justiça Federal.

A sentença, publicada em 14 de junho, declarou a nulidade do Edital 130/2021, na modalidade Regime Diferenciado de Contratações Públicas em sua forma eletrônica, e proibiu a União e o Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre e Transportes (Dnit) de tomar qualquer decisão administrativa ou política, relacionada à implementação do trecho da BR-364 objeto da ação, enquanto não houver a realização de consulta prévia, formal, livre e informada, nos moldes em que determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), aos povos indígenas e comunidades tradicionais, direta ou indiretamente, afetados pelo empreendimento.

A União e o Dnit também não podem avançar com providências para a obra enquanto não for realizada, pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), a qualificação do estudo da Referência 64 – Isolados do Igarapé Tapada, com o objetivo de confirmar a presença de povos indígenas isolados na área de influência do projeto da rodovia.

A Justiça Federal proibiu o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de promover o licenciamento do trecho da BR-364, que já se encontra sob análise do órgao, enquanto não for realizada a consulta aos povos indígenas e comunidades tradicionais afetados pelo empreendimento e não for realizada pela Funai a qualificação do estudo da Referência 64 – Isolados do Igarapé Tapada.

A sentença proibiu ainda a execução de qualquer ato objeto do contrato celebrado entre Dnit e Consórcio Única-Iguatemi para o andamento da obra.

Ação civil pública – O processo foi movido inicialmente, em dezembro de 2021, pela Associação SOS Amazônia em conjunto com a Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá, a Comissão Pro-Índio do Acre, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS). Ao se manifestar no processo como fiscal da lei, o MPF requereu também a participação direta na ação como autor dos pedidos.

Em parecer apresentado à Justiça Federal em janeiro de 2022, o procurador da República Lucas Costa Almeida Dias, além de alertar para as ilegalidades referentes à ausência de consulta aos povos originários, também enfatizava o enorme potencial de prejuízo ambiental a que estaria exposta a fauna e a flora da região, em boa parte integrante da área do Parque Nacional da Serra do Divisor, reconhecido como o local com maior biodiversidade de toda a Amazônia.

Ação Civil Pública 1010226-68.2021.4.01.3000