Em entrevista, ministra dos Povos Indígenas do país destaca preocupação com segurança de comunidades afetadas por garimpo e exploração ilegal de madeira; povos isolados do Vale do Javari sofrem com crime organizado.
Pela primeira vez, uma mulher indígena representou o Brasil como ministra de Estado na ONU. Na segunda-feira, Sônia Guajajara discursou na 22ª sessão do Fórum Permanente sobre Questões Indígenas.
Antes de assumir a tribuna, a ministra conversou com a ONU News e destacou as ações que estão sendo tomadas pelo novo Ministério dos Povos Indígenas para acabar com o sofrimento do povo yanomami, no norte no Brasil.
Devolvendo segurança e dignidade aos yanomamis
“A gente está reestabelecendo a saúde das crianças, pois estavam morrendo muitas crianças ali toda semana. Então, eu acho que a principal coisa é salvar essas vidas. Salvar a vida dessas crianças, restabelecer a saúde das crianças e dos idosos, devolver os indígenas que estavam em Boa Vista, que já tiveram um atendimento e estão com alta para voltar, pois eles estavam sem estrutura nenhuma para voltar para suas aldeias. Então devolver esses indígenas para suas aldeias e retirar esses garimpeiros, porque enquanto eles estiverem ali, os yanomamis não têm segurança para voltar para dentro de suas aldeias.”
De acordo com Guajajara, foram identificados mais de 20 mil garimpeiros no território yanomami, que comporta 30 mil indígenas. Para a ministra, o conflito resultante desta invasão está afetando “a vida e a dignidade” dos yanomamis.
Ela disse que por ser uma área remota e de difícil acesso, um dos desafios é montar uma estrutura para garantir que equipes de saúde cheguem de forma suficiente. Por isso, uma das medidas será a construção de uma pista de pouso maior para levar materiais para a construção de hospitais.
Além de aliviar a situação emergencial e estabelecer uma logística adequada, a ministra pretende, no longo prazo, reforçar a fiscalização e o monitoramento permanente do território. O objetivo é impedir o retorno da mineração ilegal.
Povos isolados ameaçados pelo crime
Guajajara também abordou a situação do Vale do Javari, no estado do Amazonas. A região concentra a maior quantidade de povos isolados do território brasileiro.
De acordo com ela, a área é marcada por “muita exploração ilegal de madeira, de caça e de pesca, o que torna esses povos totalmente vulneráveis”. Ela comentou a situação de violência no local.
“O Vale do Javari também foi esse palco da brutalidade do crime contra (o jornalista britânico) Dom Philips e (o indigenista) Bruno Pereira, então a gente precisa realmente dar uma atenção especial ali pra evitar que outras lideranças e outros indigenistas venham a ser mortos simplesmente por estarem lutando para proteger esses territórios.”
A ministra também reforçou que os tratados internacionais precisam se efetivar em políticas locais. No contexto brasileiro, a prioridade é a “demarcação de territórios indígenas” para que haja segurança e gestão própria assegurada para esses povos.
Nexo entre direitos e preservação
Refletindo sobre a associação entre direitos indígenas e preservação do planeta, tema central do Fórum de 2023, Guajajara disse que as ameaças aos povos originários se dirigem a toda a humanidade.
“Se nós povos indígenas já somos considerados como os maiores guardiões do planeta, os maiores guardiões do meio ambiente, da floresta. Se nós somos o próprio meio ambiente, a própria floresta. E se os direitos dos povos indígenas estão em risco, essa biodiversidade toda também está ameaçada. E se a biodiversidade toda está ameaçada, a humanidade inteira também está.”
Ela destacou a importância de mudar os sistemas baseados em monoculturas e no agronegócio, investindo mais em modelos que gerem sustentabilidade e proteção da biodiversidade.
Representatividade
Para Guajajara, o Brasil vive um novo momento da sua política indigenista, tendo criado pela primeira vez um Ministério dos Povos indígenas, liderado por uma mulher.
Ela comentou que importantes espaços de decisão como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Funai, e a Secretaria Especial de Saúde Indígena, Sesai, estão sendo liderados por indígenas.
Guajajara destacou ainda que a representatividade indígena tem aumentado em diversos países e citou como exemplo a Secretária de Interior dos Estados Unidos, Deb Halland, também presente na abertura do Fórum Permanente.
PUBLICADO POR: ONU – Atividades criminosas ameaçam indígenas no Brasil | ONU News