Descendo o Rio Branco

Correio Braziliense n°18.222, 15.04.2013

Boa Vista – II, 24 a 30.08.2018
Parte II

Correio Braziliense n°18.185
Brasília, DF ‒ Sábado, 09.03.2013

Nicolás Maduro Assume Como Presidente Interino.
Supremo Rejeita Apelo da Oposição e Avaliza Candidatura

Posse sob Contestação
[Gabriela Freire Valente]

Logo após ser empossado presidente interino na Assembleia Nacional, no início da noite, Nicolás Maduro oficializou a convocação da eleição que definirá o sucessor de Hugo Chávez, em abril. O Tribunal Superior de Justiça [STJ] da Venezuela concluiu que não há impedimentos legais para que Maduro se candidate, embora a oposição o considere inelegível.

Henrique Capriles, Governador do Estado de Miranda e provável candidato da coalizão antichavista, classificou como “fraude constitucional” a sentença do STJ. “Nicolás, ninguém te elegeu, o povo não votou em você”, disparou o líder da oposição, em rede nacional. Maduro nomeou, como seu vice, o ministro de Ciência e Tecnologia, Jorge Arreaza, genro de Chávez.

Os sete juízes que compõem a Sala Constitucional do STJ entenderam que o vice escolhido por Chávez em 2012 deixou esse posto assim que foi empossado como substituto interino. “O Conselho Nacional Elei­toral [CNE] pode admitir a postulação do presidente encarregado para que participe do próximo processo de eleição, por não estar compreendido com as in­compatibilidades previstas no artigo 229 da Consti­tuição”, diz a decisão.

Em entrevista ao jornal “El Universal”, a Deputada opositora Maria Corina Machado afirmou que a sentença é “uma provocação a todos os venezuela­nos e contrária aos interesses do país”.

Thiago Gehre Galvão, professor de relações interna­cionais da Universidade de Brasília [UnB], discorda que o pronunciamento do TSJ fira a norma constitu­cional venezuelana. “Há uma disputa pela interpre­tação da lei”.

“O que a oposição quer é dificultar a corrida eleitoral e deslegitimar Maduro perante a sociedade”, avaliou Galvão. Segundo o estudioso, cabe ao STJ delimitar a interpretação da legislação.

George Ciccariello-Maher, professor da Universidade de Drexel [na Filadélfia] e autor do livro “We created Chávez: A people’s history of the venezuelan revo-lution” [Nós criamos Chávez: uma história popular da revolução venezuelana], salienta que a estratégia antichavista é “encontrar qualquer argumento para questionar o governo”, na tentativa de batê-lo nas urnas. “Infelizmente para eles, voltar ao poder é uma questão de política, e não técnica, e esse tipo de argumento os fazem parecer cada vez mais oportunistas”, opinou Maher.

O coro dos opositores venezuelanos ganhou o reforço presidente do Paraguai, Federico Franco, ele próprio questionado por Chávez e por outros presidentes sul-americanos ‒ Franco substituiu Fernando Lugo, cujo impeachment levou à suspensão do Paraguai no MERCOSUL, abrindo caminho para o ingresso da Venezuela como membro pleno. “Até em uma monarquia se sabe quem vai suceder o rei. Na Venezuela, o novo presidente é uma pessoa que não foi eleita”, ironizou.

Ameaça de Boicote

A revolta dos opositores foi alimentada pelo anúncio de que a posse de Maduro seria realizada na sede da Academia Militar. Depois de deputados da coalizão antichavista “Mesa da Unidade Democrática” [MUD] ameaçarem não comparecer à sessão, o presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, informou que evento aconteceria na sede do Parlamento.

A oposição venezuelana questiona as relações entre governo e Forças Armadas, mais ainda depois que o Ministro da Defesa, Diego Molero Bellavia, ofereceu a garantia do Exército para a eleição de Maduro. “Por quê nós [o Legislativo] temos de ser tutelados pelos militares e ir a uma sessão em um centro militar?”, questionou o Deputado Ángel Medina.

Três Datas em Estudo

O Conselho Nacional Eleitoral [CNE] informou ontem que tem capacidade técnica para realizar a eleição presidencial a partir de 14 de abril.

Segundo o jornal “El Nacional”, o CNE iniciou consul­tas com todos os Órgãos envolvidos na organização do pleito para que examinem a viabilidade de três datas propostas inicialmente: os domingos 14,21 e 28 de abril A autoridade eleitoral aguarda a resposta para anunciar o cronograma definitivo do processo. (CORREIO BRAZILIENSE, N° 18.185)

Correio Braziliense n°18.223
Brasília, DF ‒ Terça-Feira, 16.04.2013

Brasil S/A
Chavismo em causa
[Antônio Machado] 

A apertada vitória do escolhido por Hugo Chávez para sucedê-lo na presidência da Venezuela prenuncia tempos instáveis para a chamada “revolução bolivariana”, que transpassa as fronteiras venezuelanas, e acende a luz amarela para os gover­nos assentados em programas de transferência de renda, sobretudo na América latina, subestimando a inflação, o investimento e outras metas sociais, como a segurança. A Venezuela, depois de 14 anos de chavismo, exibe evidentes avanços sociais. O número de pobres diminuiu 44% e a pobreza absoluta, 48%. A renda per capita cresceu 2,5% ao ano de 2004 a 2012.

O desemprego era de 14,5% quando ele assumiu pela primeira vez, em 1999. Estava reduzido a 8%, depois de se reeleger por três vezes, a última em outubro de 2012. Chávez voltou logo depois a Havana para se tratar de um câncer na região pélvica, retornando para morrer aos 58 anos.

A receita do petróleo, especialmente depois do fracassado golpe de estado para depô-lo 2002, bancou toda a transformação social em um país que tinha uma das rendas mais concentradas do mundo.

Chávez fez a diferença ao aplicar a renda da PDVSA, a estatal petrolífera, nas “misiones”, o nome dos pro­gramas sociais do chavismo.

Não houve, no entanto, o mesmo empenho trans­formador da PDVSA nem dos setores essenciais para o desenvolvimento de qualquer nação, a indústria e a agropecuária, ambas historicamente frágeis devido às facilidades da renda do petróleo para pagar as importações do que se fizesse necessário ‒ do leite em pó a canos comprados em Miami, destino de boa parte da riqueza do país mesmo depois do chavismo.

O aumento do emprego foi todo ele no setor público, até por causa da estagnação das maiores empresas e de confiscos e controles de preços que desarticu­laram o setor privado.

A PDVA, num país dono da primeira ou da segunda maior reserva provada de petróleo do mundo, foi perdendo sua capacitação à medida que se trans­formava numa agência social e de política externa [enviando a preço módico, ou nem isso, petróleo a Cuba, por exemplo]. Chávez assumiu como barril valendo US$ 10. Foi a US$100 em seus 14 anos, enquanto a produção da PDVA desabou de 3,5 milhões de barris/dia para 2,5 milhões.

Maduro sem Indulgência

Vitória Magra do Sucessor de Chávez Sugere que só Políticas Sociais não Asseguram a Hegemonia

Com a PDVSA [responsável por 96% das exporta­ções, 50% da receita de impostos e 30% do PIB] exaurida e o resto da economia em crise, o vice-presidente Maduro, eleito com diferença minúscula em relação à votação do opositor Henrique Capriles pelos 14,8 milhões de venezuelanos que se dispu­seram a votar [78% do eleitorado, o que é muito num país sem voto obrigatório], não teve a Indulgência que os eleitores, sobretudo os mais pobres, dedicavam a Chávez.

Sem o caixa da PDVSA [que passou até a importar gasolina dos EUA, seu maior cliente, além de inimigo figadal de Chávez, em especial depois de o presidente George W. Bush reconhecer o governo golpista de 2002], sem previsão de o petróleo disparar num mundo em crise, com os americanos tendendo à autonomia energética, a Venezuela era um problema à procura de solução com o “coman­dante” O eleitor se dividiu entre Maduro e Capriles, que não reconheceu a derrota.

Capriles Comeu por Fora

Ainda se vai avaliar melhor a expansão de Capriles, não prevista pelos institutos de pesquisas, em relação à sua derrota em outubro para Chávez [por 54,4% dos votos a 44,9%]. As próprias lideranças do chavismo manifestaram surpresa.

Os resultados nos obrigam a fazer uma profunda autocrítica”, divulgou em seu “Twitter” o presidente da Assembleia Nacional, Diosdato Cabello, um chavista tido como rival de Maduro.

“É contraditório que os setores mais pobres da população votem em seus exploradores de longa data”. Essa é a grande questão. As respostas não estão, provavelmente, na desconfiança quanto aos objetivos sociais do partido chavista, mas em sua competência para enfrentar a violência urbana e retomar não tão bem o crescimento, que no ano passado foi de 5,6% [contra 0,9% no Brasil], mas em fazê-lo numa situação de normalidade. A inflação chegou a 20,1% no índice oficial em 2012. Em fevereiro, o governo desvalorizou o bolívar em 32%, mas US$ 1 no câmbio oficial vale 6,30 bolívares, contra 20 no mercado paralelo. O desabastecimento é outra constante.

A PDVSA Está Exaurida

Capriles se tomou personagem em meio à hegemo­nia chavista por ter captado as apreensões sociais, sem ameaçar as “misiones”. E expressou os riscos, ao mostrar uma PDVSA que embarca 450 mil barris/dia de petróleo subsidiado a Cuba, Nicarágua e países do Caribe: envia 600 mil à China para pagar uma dívida já gasta; consome 700 mil barris no mercado doméstico, parte refinada nos EUA e vendida na Venezuela pelo equivalente a R$ 0,03 o litro. Não estranha que relute aportar sua parte na refinaria que a Petrobras constrói em Pernambuco.

Potencial de Incertezas

A vitória estreita do chavismo, além de contestada pela oposição, tem potencial desestabilizador. O go­verno de Barak Obama deu apoio ao pleito de Capriles para a recontagem dos votos. Vladimir Putin, presidente da Rússia, aliado de Chávez, saudou a eleição de Maduro. O ex-presidente Lula chegou a gravar um vídeo usado pela campanha de Maduro, mas o governo Dilma Rousseff, formal­mente, guardou uma distância diplomática da elei­ção, embora fizesse saber pelos canais apropriados a sua preferência. Tudo isso é minueto político sem ter a importância sobre o que levou à clivagem ([1]) do eleitor venezuelano.

Na morte de Chávez, foi à comoção, ocupando as ruas de Caracas com manifestação de profundo respeito. Mas não avalizou, como esperado, o sucessor que escolhera para seguir sua obra, ou “revolução”, como preferia. O mistério da Venezuela tende a ser a grande questão nas várias eleições programadas a curto e médio prazo em seus vizinhos. (CORREIO BRAZILIENSE, N° 18.223)

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 02.01.2023 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Bibliografia  

CORREIO BRAZILIENSE, N° 18.185. Posse sob Contesta­ção – Brasil – Brasília, DF – Correio Braziliense n°18.185, 09.03.2013.

CORREIO BRAZILIENSE, N° 18.222. Nicolás Maduro Enfrenta o Desafio de Suceder Chávez – Brasil – Brasília, DF – Correio Braziliense n°18.222, 15.04.2013.

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;   

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: [email protected]

[1]    Clivagem: ruptura. (Hiram Reis)

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