Boa Vista – Fome, falta de medicamentos e recorrentes ameaças realizadas por garimpeiros. Esse foi o cenário encontrado por defensoras e defensores públicos federais que estiveram em Roraima para monitorar a grave crise humanitária enfrentada pelos yanomami. Depois de ver a situação de perto, em ofício, a Defensoria Pública da União (DPU) pede atuação urgente do governo federal.
Entre as medidas solicitadas pela instituição no documento encaminhado aos ministérios da Defesa e da Justiça e Segurança Pública nesta segunda-feira (30) estão:
- Envio de cestas básicas para a região de Auris (RR) que devem atender as comunidades kotaimatiu, polapê e katanã, Hokolaxi Mu, õki ola; Xilipi e Kuratanha, localizadas rio abaixo de kuratanha e sofrem grave situação de fome;
- Ampliação de forma imediata todo o apoio logístico, inclusive aumentando o número de helicópteros;
- Garantia da segurança e integridade dos profissionais da SESAI e da Funai que atuam na Terra Indígena Yanomami bem como dos povos indígenas.
As defensoras e defensores destacam que, atualmente, há um esforço do governo federal para buscar uma resposta emergencial à situação de grave violação de direitos humanos que vivem os povos indígenas Yanomami e Ye’kwana.
Entretanto, o que a DPU tem verificado é a necessidade de uma resposta ainda mais efetiva e estruturada, com uma maior mobilização das Forças Armadas para o auxílio logístico a profissionais da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) e da Secretaria de Saúde Indígena (SESAI).
“Caso isso não ocorra, estaremos diante de uma tragédia sem proporções”, dizem os defensores que assinam o ofício.
Assinam o ofício as defensoras públicas federais Marina Mignot Rocha e Carolina Godoy Leite, além dos defensores públicos federais Renan Vinícius Sotto Mayor de Oliveira, Ronaldo de Almeida Neto e André Carneiro Leão.
Leia o ofício na íntegra aqui.
Cenário de guerra
A urgência no pedido é justificada pela dimensão da crise humanitária vivenciada pelas comunidades. A DPU recebeu relatos dramáticos de lideranças indígenas.
“Meu filho está muito fraco. Eu, hoje, não tenho comida nenhuma a dar para o meu filho. Então, eu não sei se vai aguentar se não chegar comida por mais dois ou três dias, se ele vai aguentar vivo. Quero pedir para você . Com urgência mande logo alimentação para a nossa comunidade porque eu não sei mais o que fazer, então, faz alguma coisa aí porque senão vocês não vão encontrar o meu filho vivo aqui quando vocês chegarem com a comida”, disse em relato um indígena da Comunidade Samaria da Região do Olomai.
O desespero desse pai é apenas um exemplo do que enfrentam crianças que estão passando fome e podem morrer a qualquer instante. As informações que chegam da terra indígena é que mães e pais que buscam ajuda nos Polos- Base e Unidades Básicas de Saúde (UBS) mais próximos de suas aldeias caminham por dias com fome. As crianças morrem em seus braços durante a caminhada, não dando tempo de buscar atendimento médico ou alimentação.
Há ainda relatos de regiões de garimpo em que os criminosos não deixam os indígenas buscarem a alimentação distribuída e eles inclusive esconderiam as crianças desnutridas para não chamar mais atenção das autoridades.
As defensoras e defensores destacam que o principal meio de locomoção para conseguir chegar às aldeias dentro da terra indígena yanomami para levar alimentos, medicamentos e para tratamento médico é pela via aérea. Esse é uma realidade de 98% das comunidades. Por isso, as Forças Armadas possuem um papel central na logística das operações.
“Diante deste cenário de guerra, para que o Estado brasileiro consiga garantir o direito à existência dos povos indígenas que vivem na Terra Indígena Yanomami será fundamental lançar mão de toda a estrutura logística possível, sem qualquer limitação orçamentária”, afirmam os defensores no ofício.
Descaso
A crise humanitária dos yanomamis, no entanto, já era anunciada. “É fato notório que o governo federal, nos últimos anos, vinha descumprindo decisões da Supremo Tribunal Federal”, explicam os defensores.
A Suprema Corte informou em nota que foram detectados indícios de descumprimento de determinações da Corte e do envio de informações falsas envolvendo a situação da população indígena yanomami. Segundo o tribunal, após a identificação dos responsáveis, haverá processo para punição.
As defensoras e defensores destacam ainda que Governo Federal já havia descumprido decisões judiciais em sede de ações civis públicas propostas pelo Ministério Público Federal (MPF) em Roraima. Além disso, não cumpriu diversas recomendações expedidas pelo MPF em Roraima que buscavam garantir o direito à vida e saúde dos povos indígenas da região, com bem apontado pela 6ª Câmara de Coordenação e Revisão.
“Assim, mesmo após diversas decisões do STF, da Justiça Federal, recomendações do MPF, medidas cautelares da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, medidas provisórias emitidas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, ainda assim, o Governo Federal, nos últimos anos, manteve a omissão estrutural que tem possibilitado a morte de indígenas por desnutrição, malária e diversas outras enfermidades tratáveis, assim como acirrado a violência existe na região, principalmente decorrente do garimpo ilegal”, aponta o ofício.
Assessoria de Comunicação Social
Defensoria Pública da União – Cestas básicas, helicópteros e segurança: DPU pede urgência em ações para os yanomami
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Missão acompanha atendimento aos Yanomami em Boa Vista (RR) (dpu.def.br)