Descendo o Rio Branco

Povos Indígenas no Brasil, 83

Imprensa e Antropólogos à Soldo do “Thin Brothers” – Parte I   

Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI)
Povos Indígenas no Brasil/83
Sagarana Editora Ltdª
São Paulo, SP – 1983
NOTÍCIA SOBRE OS WAIMIRI-ATROARI
350 índios são estreitamente vigiados por 59 funcionários da FUNAI  

Segundo informações enviadas pelo antropólogo Stephen G. Baines ([1]) ao “Aconteceu”, em carta de 14 de março de 84, a população WaimiriAtroari atual conta cerca de 350 indivíduos e estava assim distribuída em julho de 83 quando ele efetuou a contagem: 108 indígenas na área de influência do PI Camanaú [incluindo as Frentes Avançadas de Maré, no rio Camanaú e a de Cariuaú, no curso baixo do rio de mesmo nome]; aproximadamente 66, numa aldeia localizada na beira do rio Alalaú, um pouco acima da confluência com o rio Jauaperí, a 600 metros da sede do PI Alalaú Primeiro, aproximadamente 32 indivíduos na Frente Avançada Tapupuna e 61 na FA Taquari, ambas na área de influência do PI Abonarí; e, finalmente, cerca de 33 nas proximidades do PI Terraplenagem Yawará, na beira da BR-174, e 38 na Frente Avançada Xeri, a 5 km do PI Jundiá. Desde 1980, a maioria dos Waimiri-Atroari mora nas proximidades dos postos da FUNAI. A população de qualquer aldeamento flutua em consequência dos deslocamentos entre os postos. Alguns índios fazem visitas curtas às antigas aldeias, hoje abandonadas e longe dos postos. Nos aldeamentos atuais, os índios juntam-se aos braçais da FUNAI no trabalho em grandes roças. Todo o trabalho é organizado e dirigido pelos funcionários da FUNAI [eram 59 em julho de 83], mobilizando os índios através dos “capitães” escolhidos por eles entre os jovens. O próprio “capitão geral” da área, chamado “Viana”, também foi nomeado pela FUNAI por ter sido um morador pioneiro do Posto em 1978.

Durante o ano de 83 a FUNAI local incentivou rapa­zes solteiros, entre 13 e 18 anos, a residir e trabalhar junto aos funcionários da BASE na ponte sobre o Alalaú. Outras publicações especializadas informam sobre o avanço de grandes empresas na exploração mineral da região: a CMP e a Paranapanema têm programas de lavra experimental de ouro em fase de montagem no Amapá (Brasil Mineral I/2, dez.-jan. 84). O projeto RADAM e a CPRM realizaram pesquisas sob a jurisdição administrativa do GEBAM ([2]), nos rios Maracá e na serra do Iratapuru, no limite Sul da área Waiãpi (JB, 22.08.83).

O 6° BEC tem um destacamento perto dos limites da área indígena, em Abonarí, trabalhando na manuten­ção da BR-174, que corta a área, e no atendimento médico aos índios. A Mineração Taboca (Paranapa­nema) construiu uma escola em Terraplenagem, está financiando outras obras dentro da reserva e dando atendimento médico e dentário, dentro de um convênio estabelecido com a FUNAI. Além da BR-174 e da futura inundação, com as águas da hidroelétrica de Balbina (que vai alagar pelo menos as áreas de Taquari e o velho Posto do Abonarí) ([3]), o território Waimiri-Atroari está no interesse de várias companhias mineradoras.

Em 23 de novembro de 81, um decreto presidencial (n° 86.630) desfez a Reserva Indígena, revogando os decretos anteriores, e classificou uma área já reduzida como “interditada temporariamente para fins de atração e pacificação” após o que a FUNAI promoverá uma nova demarcação administrativa. A área retirada por este decreto é justamente aquela que está sendo explorada pela Mineração Taboca. Além disso, grandes extensões dentro da área atualmente “interditada” são de interesse de mineradoras de cassiterita.

WAIMIRI-ATROARI – CDA Promove Seminário 

No período de 7 a 11 de fevereiro será realizado em Manaus um seminário com o objetivo de discutir a situação dos índios Waimiri-Atroari e as alternativas energéticas para a Região Amazônica. O seminário terá a participação de representantes de diversos órgãos, como INPA, FUNAI, Eletronorte, IBDF, 6° BEC e, inclusive, da empresa de mineração Parana­panema; que atua na região do alto rio Negro.

Esta é pelo menos, a ideia central que norteia o seminário, cujos promotores, as entidades preserva­cionistas que atuam no Amazonas – um total de 24 delas – vão convidar aqueles órgãos a credenciarem representantes para responderem as questões sem respostas na política indigenista e energética da Amazônia.

Ontem de manhã, reunidos, os líderes das entidades concluíram que talvez nem todos os órgãos a serem convidados participem efetivamente no seminário, “mas pelo menos, poderemos chamá-los de omissos em questões de tal relevância, sem que se ofen­dam”, ironizaram os preservacionistas.

Um dos representantes das entidades comentou que o INPA hoje é apenas um grande funcionário da Eletronorte, para quem vem desenvolvendo traba­lhos que se limitam à catalogação do que existe na região, sem se preocupar com a consequência dos trabalhos feitos.

Foi discutida também, em rápidas pinceladas, a questão das Anavilhanas e a possível vinda do Secretário Nacional do Meio-Ambiente, Paulo Nogueira Neto para o seminário e para a reinstalação do Projeto Jaraqui, cujo retorno às atividades foi também discutido ontem. A reunião de ontem teve também por objetivo o lançamento oficial do Comitê de Defesa da Amazônia, composto por todas as entidades preocupadas com a ecologia. (A Crítica, 08.01.83)

Denunciada Mineradora na Área Indígena

O assessor do CIMI, padre Egydio Schwade, e o sertanista Porfírio Carvalho denunciaram que a FUNAI autorizou a empresa Acaraí Indústria e Mineração a explorar cassiterita na área interditada para os índios Waimiri-Atroari, em Roraima.

Mas o Presidente da FUNAI desmentiu a informação, afirmando que o órgão “não autorizou nem autori­zará qualquer tipo de exploração mineral na área dos Waimiri-Atroari”, grupo que ainda permanece em contato esporádico com a civilização.

Os dois indigenistas informaram que a área indígena interditada já foi cortada por uma estrada de 38 quilômetros ([4]), que passa pelas principais reservas de cassiterita da região, ligando o acampamento da mineradora à rodovia Manaus-Caracaraí.

Porfírio, que apresentou relatório à FUNAI sobre a situação na área disse que os índios estão perdendo suas terras com a extinção da reserva Waimiri-Atroari, em 1981, por Decreto Presidencial, com a invasão da área por empresas de mineração e tam­bém pela construção da barragem de Balbina, que inundará parte do território indígena. Segundo o sertanista, a FUNAI autorizou a exploração de minério sob a alegação de que esta atividade é estratégica ao desenvolvimento econômico do País. (ESP, 15.03.83)

FUNAI Impede que Mineradora Invada Reserva

O presidente da FUNAI apresentou ontem à im­prensa, o documento que encaminhou ao DNPM ([5]) negando autorização à mineradora Acaraí, subsidiária da Vale do Rio Doce, para a pesquisa de minério na área dos índios Waimiri-Atroari, em Roraima.

A presença da mineradora na área indígena foi de­nunciada, esta semana, pelo assessor do CIMI ([6]), padre Egydio Schwade, e pelo sertanista Porfírio Carvalho. No ofício encaminhado ao DNPM em 28 de setembro de 1982, o Presidente da FUNAI afirma que os índios se encontram num estágio cultural que não recomenda a presença de uma mineradora na região. Confirmou, no entanto, no caso da reserva Waimiri-Atroari, ter autorizado a construção de uma estrada ligando a rodovia BR-174 à mina de cassite­rita explorada pela Paranapanema próxima à reser­va. (ESP. 17.03.83)

Egydio Schwade Confirma Invasão

O assessor do CIMI, Egydio Schwade, afirmou que o Presidente da FUNAI, Paulo Moreira Leal, foi “desleal” quando desmentiu a presença de companhias de mineração na Área dos índios WaimiriAtroari em Roraima ([7]). O missionário disse que visitou a área nos últimos dias e verificou que uma subsidiária do grupo de mineração da Paranapanema está construindo uma estrada que penetra mais de 30 quilômetros a reserva indígena. (ESP, 07.04.83)

Prelazia Lança Campanha

A prelazia de Itacoatiara (AM) está lançando esta semana uma campanha internacional em defesa dos Waimiri-Atroari. Com distribuição de folhetos e cartazes, a campanha denuncia as “pressões e violências cometidas contra esse povo cujas terras estão agora sendo exploradas pela empresa de mine­ração Paranapanema”.

Essa campanha destina-se principalmente combater os “três principais inimigos dos povos Waimiri-Atroari: hidrelétrica de Balbina, colonização e mineração”, além de denunciar a construção da BR-174 (Manaus, AM – Caracaraí, RR). Sobre a estrada, o documento da campanha afirma que no trabalho de construção foram utilizados:

Tratores, aviões, rifles, metralhadoras, granadas e di­namite, além de várias táticas e embustes montados pela FUNAI para tentar destruir esses povos e integrar os sobreviventes na sociedade nacional. (FSP, 24.04.83) (Continua…)

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 19.12.2022 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Bibliografia  

CEDI, Centro Ecumênico de Documentação e Informação. Povos Indígenas no Brasil/83 – Brasil – São Paulo, SP – Sagarana Editora Ltdª, 1983.  

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;  

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: [email protected]

[1]   Antropólogo, há dois anos e três meses pesquisando na área Waimiri-Atroari está preparando tese de doutoramento na UNB. (CEDI)

[2]   GEBAM: Criado, pelo Decreto nº 84.516 de 28.02.1980, com a finalidade de coordenar as ações de fortalecimento da presença do Governo Federal na margem esquerda do Baixo Amazonas, acompanhar os projetos de desenvolvimento e colonização naquela região, bem como propor medidas para a solução de seus problemas fundiários. (Hiram Reis)

[3]   Não existia nenhuma aldeia naquela área, a hidrelétrica, portanto, de extrema necessidade para a população Manauara não causou nenhum problema para os WA. (Hiram Reis)

[4]   A vicinal, à margem esquerda do rio Alalaú (Amazonas e não Roraima), só foi construída após concordância dos Waimiri-Atroari que passaram a receber generosos royalties. (Hiram Reis)

[5]   DNPM: o Departamento Nacional de Produção Mineral foi substituído, em 25 de julho de 2017, pela Agência Nacional de Mineração (ANM). (Hiram Reis)

[6]   CIMI: Conselho Indigenista Missionário vinculado à CNBB, uma nova versão entreguista católica do missionário anglicano britânico, que em 1838, estabeleceu uma missão no Pirara e que culminou com a divisão da região em litígio em duas partes: 3/5 para a Inglaterra (19.630 Km2) e 2/5 ao Brasil (13.570 Km2). (Hiram Reis).

[7]   Amazonas e não Roraima. (Hiram Reis)  

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