Descendo o Rio Branco
TIRSS na Mídia Nacional – Parte XV
Pontifícia Universidade Católica [PUCSP]
São Paulo, SP – 24 e 25.04.2006
Cartel Internacional do Estanho:
a Importância da Indústria Brasileira na Quebra do Conluio
[Júlio César Cuter; Anita Kon]
A indústria estanífera mundial apresentou ao longo do século XX alta concentração de países produtores. Em 1982 [ano inicial do último acordo do cartel de produtores], os quatro maiores produtores – Malásia, Indonésia, Bolívia e Tailândia – representavam juntos, aproximadamente, 75% da produção mundial. Destacava-se, ainda, a pequena quantidade de firmas dentro de cada país explorando o principal minério do estanho, a cassiterita. Igualmente importante é considerar a integração quase completa da extração do minério com o seu beneficiamento metalúrgico, consolidando a cadeia produtiva, formando uma única indústria. A intervenção direta no mercado do estanho, o conluio, tornou-se possível com o surgimento de condições propícias e objetivas: a concentração e a integração.
As primeiras tentativas de elaborar acordos fracassaram, mas com a criação de uma associação para gerir o cartel, em 1931, e com a queda no preço do metal, consequência da crise de 1929, as medidas de controle ganharam mais importância e começaram a surtir efeitos a partir de 1933.
Posteriormente, no entanto, mudanças impostas pelos dois choques do petróleo, em 1973 e 1979, abalaram a indústria estanífera. O efeito inicial foi o aumento artificial do preço do metal elevando a rentabilidade dos produtores, consequentemente fortalecendo o cartel.
Esta situação intensificou um processo de redução do consumo por parte dos países europeus e dos EUA, por meio da substituição por outros materiais e da introdução de novas tecnologias que visavam a reduzir o consumo do metal no seu principal uso, o revestimento de folha-de-flandres na indústria siderúrgica. Em um segundo momento, o aumento dos preços no mercado internacional atraiu produtores, dada a rentabilidade oferecida pelos preços excepcionais alcançados, sobretudo, após o segundo choque. Como estes produtores, antes periféricos ou inexistentes, não integravam o International Tin Council [ITC], os países membros tiveram dificuldades para manter o cartel no comando das quantidades comercializadas no mercado internacional, levando a associação à bancarrota completa em 24 de outubro de 1985.
A produção brasileira se avolumou exatamente neste contexto. Os incentivos à indústria local antecederam ao primeiro choque do petróleo, no entanto, foi na segunda metade da década de 1970, período entrechoques, que a indústria ganhou incentivos mais consistentes dentro do II Plano Nacional de Desenvolvimento [PND], tomando impulso e destaque. A produção de estanho no Brasil cresceu ininterruptamente até o final da década de 1980, alcançando, no triênio 1988-1990, a liderança mundial na produção.
Nesse processo destacou-se também a crescente participação da Paranapanema, firmando-se como a principal indústria do setor no país, concentrando a produção e a comercialização internacional. […]
Jornal do Commércio, n° 114
Rio de Janeiro, RJ – Quarta-feira, 18.03.2009
Supremo Conclui Julgamento Hoje
[Mariângela Gallucci – da Agência Estado]
O Supremo Tribunal Federal (STF) pretende concluir hoje se a demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, deve ser contínua e se os arrozeiros que ocupam a região têm de sair da área. Também será definido o momento em que a terra terá de ser desocupada, se imediatamente ou somente depois de publicada a decisão, o que pode demorar meses. (JDC, N° 114)
Jornal do Brasil, n° 345
Rio de Janeiro, RJ – Sábado, 21.03.2009
Contagem Regressiva para Arrozeiros
[Luiz Orlando Carneiro – Brasília]
O ministro Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal, relator do processo de demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, informou ontem que vai se reunir, na próxima quarta-feira, com o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, desembargador Jirair Meguerian, a fim de definir o prazo para que produtores de arroz deixem “pacífica e definitivamente” as áreas que ainda ocupam na reserva. Ele explicou que a decisão do STF de que a retirada dos rizicultores tem de ser “imediata” significa que deve ser feita antes mesmo da publicação do acórdão do julgamento da ação popular, encerrado no fim da tarde de quinta.
Em tese – conforme admitiu o ministro – depois da publicação do acórdão, os prejudicados podem ajuizar recursos [embargos declaratórios], sob a alegação de que alguns pontos da decisão seriam obscuros, omissos ou duvidosos, como permite a legislação processual. […]
O ministro-relator da polêmica ação popular ajuizada pelos senadores roraimenses Mozarildo Cavalcanti [PTB] e Augusto Botelho [PT] voltou a sublinhar que as questões relativas a eventuais indenizações pretendidas por fazendeiros e outros agricultores que exibem títulos de propriedade não interferem no processo de desocupação da área indígena.
Trata-se, segundo Britto, de “processos paralelos que correm na Justiça comum”. A seu ver, os fazendeiros que reivindicam um prazo mais longo para desocupar a reserva, a fim de que possam colher, em maio, o que plantaram no ano passado, assumiram um risco, com base numa liminar, cujos efeitos foram extintos com a conclusão do julgamento da ação-piloto. […]
Segundo ele, os rizicultores que ocuparam a reserva a partir de 1992 – e que diziam representar 6% da economia de Roraima – não teriam direito a nenhuma indenização, por terem cometido “esbulho possessório”. No final de seu voto, ele afirmou que os índios foram, progressivamente, “enxotados, escorraçados” da reserva. Quanto à questão de a área demarcada incluir faixas das fronteiras com a Venezuela e a Guiana, o relator afirmou que a:
Compatibilidade entre faixas fronteiriças e terras indígenas é serena, e que tanto as Forças Armadas quanto a Polícia Federal não podem ser impedidas de atuar, quando necessário, em reservas cujo território pertence à União.
Em 10 de dezembro do ano passado, formou-se a maioria de oito dos 11 ministros do STF – consolidada em 10, na sessão final de quinta-feira – a favor da demarcação contínua da Raposa Serra do Sol, com as ressalvas [ou condições] apresentadas pelo ministro Menezes Direito. […]
Deputado Critica Decisão do Supremo
Em nota, o deputado federal Aldo Rebelo [PCdoB-SP] criticou a decisão do Supremo Tribunal Federal de manter a demarcação de terra contínua da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima. […] Aldo diz que a decisão “agride o interesse nacional” e “projeta um futuro de sombras e incertezas quanto à unidade do Estado e da nação”.
O Supremo abre um precedente para que sejam implantados no Brasil um Estado multinacional e uma nação balcanizada, pois confere a tribos indígenas que fazem parte do povo brasileiro o esdrúxulo status de minorias apartadas do todo nacional, com prerrogativas negadas a outros estratos que há cinco séculos amalgamam a formação social do país, diz o deputado no documento.
Ele afirma ainda que:
O respeito aos direitos dos indígenas não pode implicar o esbulho dos não índios que há muito tempo fincaram a bandeira do Brasil naquela região.
Segundo Aldo, as:
19 salvaguardas que o STF estabeleceu para a execução plena de sua sentença são, paradoxalmente, um atestado de que a decisão tem vício de origem. Foi como legalizar uma situação ilícita com a condição de que não se repita. Os índios beneficiados foram isolados da nação. E o Congresso Nacional tem o dever de reparar este erro calamitoso do Executivo e do Judiciário. (JDB, N° 345)
Raposa Serra do Sol: Terra de Brasileiros
[José Anchieta Júnior – Governador de Roraima]
A demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, precisa ser analisada pelo seu aspecto humano. Não buscamos servir de modelo ou tentar revolucionar os parâmetros de demarcação em vigor. Existe em Roraima um grave problema que atinge índios e não-índios, uma situação que colocou em conflito uma parcela da população que vivia em plena harmonia e que foi conflagrada pela interferência excessiva do Governo Federal.
A opção pela demarcação em área contínua, em vez de levar a paz, alimenta a discórdia. Nesta quinta-feira 19, o Supremo Tribunal Federal [STF] julgou o litígio e estabeleceu um modelo a ser seguido, que não é aquele pretendido pelo governo de Roraima, mas também não atende a todos a pleitos dos defensores do território único.
A Raposa Serra do Sol é uma área indígena diferente da reserva Ianomâmi, também em Roraima, onde vive uma população de pouco contato com a sociedade envolvente e que requer atenção muito especial sob pena de ser dizimada. A baixa expectativa de vida daquele povo – 45 anos – impõe maior necessidade de proteção do Estado brasileiro. Os indígenas de Raposa Serra do Sol estão em contato com a sociedade envolvente faz bem mais de um século.
A exceção dos lngaricó – cerca de 1.200 índios no extremo-Norte da reserva na Serra do Sol –, os demais indígenas tem os mesmos hábitos, usos e costumes dos não-índios e tiveram a língua materna resgatada através de programas educacionais do governo do estado.
A reserva demarcada pelo governo federal é muito extensa. Tem 1,7 milhão de hectares e cerca de 17 mil índios. O erro foi desconsiderar que nessa imensidão de terras poderia existir ocupação centenária, de boa-fé em regiões onde não havia a presença de índios, conforme demonstrado no voto do ministro Marco Aurélio de Mello. Raposa Serra do Sol tem comunidades indígenas cujas terras foram invadidas por não-índios. Mas naquela área também existem terras onde a presença do não-índio é muito anterior à dos indígenas. Existem proprietários de fazendas com títulos definitivos emitidos pelo governo federal no início do século passado.
Cem anos depois, resolveu–se considerar “intruso”, “ocupante de má–fé”, quem adquiriu terras por meios legais, pagou seus impostos em dia e ajudou a justificar para o Brasil uma fronteira então inóspita, despovoada, ameaçada por países vizinhos. Na década de 1930, um nordestino conhecido como Severino “Minero” [garimpeiro – em espanhol] atravessou o País.
Saiu do extremo–Norte e foi até o Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, depois de dias de caminhada, viagem de barco pelos rios da Amazônia, e dos mais variados tipos de transporte. Foi até o Presidente Getúlio Vargas para reclamar da invasão do território brasileiro. Severino Minero reclamou da invasão do hoje estado de Roraima por venezuelanos e ingleses da Guiana.
Deixou o Palácio do Catete com o título de “guardião da fronteira”, conferido pelo Presidente da República. Voltou orgulhoso para sua morada.
Ali, na área hoje denominada Raposa Serra do Sol [RSS], constituiu família. Filhos, netas e bisnetos de Severino nasceram e se criaram naquela região, de onde hoje estão sendo expulsos, como intrusos.
O que o governo de Roraima buscou no STF foi fazer justiça com as pessoas de bem que não podem ser penalizadas pelo fato de não terem a etnia indígena, apesar de terem nascido em RSS. A pessoa não pode ser considerada intrusa na própria terra onde nasceu e se criou. Ninguém é intruso na sua própria casa. Não ser índio e ter nascido entre eles também não é pecado ou crime algum.
O ato de demarcação foi do presidente da República, que fora induzido a erro, uma vez que um mesmo laudo antropológico de técnicos da FUNAI serviu de base para três diferentes portarias de demarcação daquela reserva, cada uma com um tamanho diferente.
Não se pode partir de uma mesma premissa e chegar a três conclusões distintas. A demarcação de Raposa Serra do Sol traz um corolário de irregularidades e não leva em conta nem mesmo a exigência constitucional de que o Conselho de Defesa Nacional deva ser consultado nas questões envolvendo a propriedade de terras na faixa de fronteiras.
No mais, chama atenção para o fato de decisão de tal relevância não ser, por exemplo, compartilhada pelo Congresso Nacional, ficando a cargo de uma só pessoa, portanto mais sujeita a erros do que de um colegiado.
Como governador de Roraima, eu não poderia assistir, inerte, a tamanha contrariedade aos interesses da população do meu estado.
No entanto, decisão judicial é para ser cumprida, num Estado Democrático de Direito, apesar do meu entendimento de que, no Supremo, nem todos conseguiram visualizar, com clareza, a importância, para o País, da decisão que estava sendo tomada. O estado de Roraima perdeu na Justiça, mas prestou um grande serviço ao País.
A partir desse julgamento, a FUNAI não poderá mais, monocraticamente, de forma nem sempre satisfatória, decidir sobre demarcações de terras indígenas. Perdeu Roraima, ganhou o Brasil. (JDB, N° 345)
Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 21.11.2022 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.
Bibliografia
JDB, N° 345. Contagem Regressiva para Arrozeiros – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Jornal do Brasil, n° 345, 21.03.2009.
JDC, N° 114. Supremo Conclui Julgamento Hoje – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Jornal do Commércio, n° 114, 18.03.2009.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
- Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
- Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
- Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
- Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
- Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
- Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
- Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
- Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
- Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
- Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
- Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
- Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
- Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
- E-mail: [email protected].
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