BOA VISTA – As consequências da exploração ilegal de ouro na Terra Indígena Yanomami (TIY) já dá sinais de consequência ao meio ambiente, é o que mostra um estudo realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Evandro Chagas e Universidade Federal de Roraima (UFRR) divulgado nesta segunda-feira, 22, que mostrou que o peixe consumido pela população de Roraima apresenta concentrações de mercúrio maiores ou iguais ao limite estabelecido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)

O estudo foi desenvolvido em quatro pontos da Bacia dos Rios Branco, Mucajaí e Uraricoera. Esse aumento de mercúrio, na água e no pescado, segundo pesquisadores, tem a ver com o garimpo ilegal na maior Terra Indígena do Brasil, a Yanomami. As amostras coletadas entre 27 de fevereiro e 6 de março de 2021 revelaram índices altos de contaminação em trecho do Rio Branco, na cidade de Boa Vista (25,5%), Baixo Rio Branco (45%), Rio Mucajaí (53%) e Rio Uraricoera (57%).

Durante o trabalho de campo, foram coletados 75 espécimes de peixes, de 20 espécies diferentes e quatro níveis tróficos (herbívoro, onívoro, detritívoro e carnívoro). No Rio Uraricoera, dentro da reserva indígena, o nível de mercúrio nas amostras coletadas confirma a contaminação do pescado. De acordo com os dados divulgados, de cada 10 peixes coletados, seis apresentaram níveis de mercúrio acima dos limites estipulados pela OMS. Segundo um dos pesquisadores da Fiocruz, Paulo Basta, o mercúrio que é utilizado pelo garimpo ilegal pode sobreviver na natureza até 100 anos.

“O mercúrio é utilizado de uma maneira indiscriminada, nos garimpos ilegais, dentro da Terra Indígena Yanomami. Esse mercúrio, ele fica retido no ambiente, a gente costuma dizer que é um metal pesado que tem uma longa permanência genética, que transita entre longos compartimentos que vai para o fundo d’água. Então, o mercúrio que está presente na cadeia trófica, nas águas, nos animais que vivem no rio e no solo, ele pode permanecer até 100 anos. Então, isso quer dizer que, se a nossa sociedade e as nossas autoridades tomarem providências, hoje, e o garimpo for interrompido, hoje, nós vamos ter problema para manejar esse mercúrio por décadas”, afirmou o pesquisador Paulo Basta.

Amostras de peixe em Boa Vista

Já as amostras de peixes compradas próximas à capital, Boa Vista, a cada 10 peixes coletados, aproximadamente, dois não eram seguros para consumo. Ou seja, mesmo distantes da Terra Indígena Yanomami, e apesar de em proporção menor, os habitantes de Boa Vista não estão livres dos impactos do mercúrio utilizado no garimpo ilegal.

“Peixes como piranha, surubim, tucunaré e pirarucu são peixes carnívoros que se alimentam de outros peixes e possuem nível de mercúrio mais altos do que os demais. No nosso estudo, o peixe que mais apresentou nível de contaminação foi o Coroatai, ele apresentou níveis médio de contaminação por mercúrio, na ordem de 2 microgramas de mercúrio para cada grama de tecido muscular”, explicou o pesquisador.

Recomendações

No final do estudo, os pesquisadores recomendam uma série de iniciativa para que as autoridades públicas estabeleçam a elaboração de mecanismos de proteção financeira ao setor pesqueiro, com o intuito de evitar que pescadores artesanais sejam impactados, economicamente, pela restrição ao consumo de diversas espécies de peixes contaminados.

Interromper, imediatamente, as atividades ilegais de garimpo, nas terras indígenas de Roraima, e retirar os invasores das terras da União. Elaborar um plano de descontinuidade do uso de mercúrio na mineração de ouro, no Brasil, para atender as diretrizes da Convenção de Minamata (2013) e estruturar um Plano de Manejo de Risco (PMR) para as populações cronicamente expostas ao mercúrio.

Segundo o estudo, 45% do mercúrio usado em garimpos ilegais para extração de ouro é despejado em rios e igarapés da Amazônia, sem qualquer tratamento ou cuidado. O mercúrio liberado de forma indiscriminada no meio ambiente pode permanecer por até cem anos, em diferentes compartimentos ambientais, e pode provocar diversas doenças em pessoas e em animais.

Nas crianças, os problemas podem começar na gravidez. Se os níveis de contaminação forem muito elevados, pode haver abortamentos ou o diagnóstico de paralisia cerebral, deformidades e malformação congênita. Os menores também podem desenvolver limitações na fala e na mobilidade. Na maioria das vezes, as lesões são irreversíveis, provocando impactos na vida adulta.

Republicação gratuita, desde que citada a fonte. AGÊNCIA CENARIUM – Copyright © AGÊNCIA CENARIUM – Estudo mostra que consumo de peixe está ameaçado por conta do garimpo ilegal na TI Yanomami em RR – Agência Amazônia (aamazonia.com.br)