Balsa de garimpo apreendida pode ser convertida em base de fiscalização. Recursos de compensação de Belo Monte serão destinados à região
Atendendo a convocação do Ministério Público Federal (MPF), várias instituições federais e estaduais estiveram reunidas na última quarta-feira (20) para tratar da proteção territorial das terras indígenas e unidades de conservação da Terra do Meio, na região entre os rios Xingu, Iriri e Curuá, onde no dia 14 houve invasão por garimpeiros na Terra Indígena Xipaya.
A área abriga outras terras indígenas – Baú, Mekragnoti e Curuaya, duas reservas extrativistas (Resex Iriri e Riozinho do Anfrísio), duas unidades de conservação estaduais – Floresta Estadual do Iriri e Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu, a Floresta Nacional (Flona) de Altamira e a Estação Ecológica (Esec) da Terra do Meio. Todas essas áreas sofrem atualmente com o aumento das invasões por grupos criminosos de grileiros, madeireiros e garimpeiros.
As instituições identificaram, durante a reunião do dia 20, os pontos de vulnerabilidade que veem permitindo a entrada dos invasores, por falhas de fiscalização e outros problemas. Em resposta, vão elaborar um plano estratégico de ação conjunta com medidas de curto, médio e longo prazos para coibir as invasões.
Um avanço importante foi a definição de que o MPF e a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) vão estudar a destinação dos recursos de compensação ambiental da Usina Hidrelétrica de Belo Monte para a implantação desse plano.
Os recursos estão bloqueados desde 2016 por decisão judicial que atendeu pedido conjunto do MPF e da Procuradoria-Geral do Estado do Pará. Eles seriam destinados a projetos de preservação ambiental no Mato Grosso, mas a decisão obrigou que sejam utilizados na região afetada por Belo Monte. Agora, poderão ser destinados especificamente ao corredor de áreas protegidas da Terra do Meio.
Vigilância – Durante a reunião, representantes do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) anunciaram que estudam maneira da balsa de garimpo apreendida dentro da Terra Indígena Xipaya no dia 16 de abril ser convertida em uma base de vigilância flutuante para impedir a entrada de invasores na região. Outras bases fixas em pontos especialmente frágeis dos territórios também estão previstas.
Ao mesmo tempo, os representantes do Instituto de Desenvolvimento Floresta e Biodiversidade do Pará (Ideflor-Bio), responsável pela gestão das unidades de conservação estaduais por onde passa grande parte dos invasores, anunciaram também o incremento da fiscalização na APA Triunfo do Xingu e na Flota do Iriri. Já está em andamento o cancelamento dos Cadastros Ambientais Rurais (CAR) utilizados como instrumento de grilagem de terras nessas áreas.
A APA Triunfo do Xingu é, nos últimos anos, recordista de desmatamento no Pará e a falta de proteção contra invasores nessa área faz com que ela sirva de porta de entrada dos criminosos em todos os territórios protegidos.
Lideranças – A reunião contou com a presença das lideranças indígenas Juma Xipaya, Kwaisadu Xipaya e Dotô Takahire, do povo Kayapó. Os três relataram as graves ameaças que pesam sobre seus territórios e apelaram às autoridades presentes que tomassem providências. Juma Xipaya lembrou os momentos de terror que viveram com a presença da balsa de garimpo nas proximidades de sua aldeia.
Ela relatou que os garimpeiros estavam armados, ameaçaram lideranças e causaram grande pânico na comunidade. “O problema do garimpo não é de hoje, convivemos com a poluição de nossas águas por garimpos próximos do território. Mas foi a primeira vez que vimos uma balsa de tamanha proporção”, contou. Disse ainda que até agora, como os garimpeiros foram soltos dentro da área, os homens da aldeia seguem fazendo vigílias dia e noite, com medo de ataques.
Para Juma Xipaya, as situações trágicas vividas atualmente pelos povos Ianomami, Kayapó e Munduruku também podem ter começado com uma balsa de garimpo, por isso é necessário atitudes imediatas para proteção do território de seu povo.
O líder Kwaisadu Xipaya ressaltou que as lideranças seguem em grande risco por causa da soltura dos garimpeiros pela Polícia Federal. “A gente tem que passar por territórios dominados por garimpeiros e madeireiros. O Rio Curuá está poluído. Povos indígenas e ribeirinhos dependem do rio, se alimentam do peixe e a gente vê comunidades que não podem mais se alimentar de peixe por causa da poluição. Temos que pensar no futuro dos nossos territórios”, disse.
Dotô Takahire, do povo Kayapó da Terra Indígena Baú, conhece profundamente os problemas do Curuá, rio que banha seu território e por onde garimpeiros têm penetrado nas áreas protegidas da região. Essa pode ter sido a rota que levou a balsa gigante de garimpo até as terras Xipaya. Ele cobrou o fechamento dos garimpos ilegais e maior presença da Fundação Nacional do Índio (Funai). “O Rio Curuá está contaminado por mercúrio e o Ministério Público está tentando resolver nossa situação, mas cadê a Funai? A Funai parou de ajudar os indígenas. Vocês brancos dizem que a terra é da União e vocês mesmos invadem a terra”, afirmou.
O plano de ação interinstitucional será construído com o protagonismo das comunidades indígenas e ribeirinhas que vivem nos territórios ameaçados. O MPF destacou o papel central das comunidades até para transformar em realidade uma das condicionantes de Belo Monte nunca implantadas, que protegeria as unidades de conservação, sobretudo as reservas extrativistas, dos impactos da usina.
Ministério Público Federal no Pará – MPF
Assessoria de Comunicação
Deixe um comentário