O órgão ministerial quer assegurar a realização de estudos sobre impactos à região e a realização de consulta prévia aos indígenas
Em processo que discute a implantação de projeto minerário que pode afetar a Terra Indígena Baú, em Novo Progresso, no Pará, o Ministério Público Federal (MPF) volta a defender que licenças ou autorizações à mineradora Chapleau só sejam concedidas após demonstrada a ausência de impactos à região e após realização de consulta prévia aos indígenas.
Empreendimento pretende explorar 50 mil toneladas de ouro por ano, no entanto, até o momento, não há dimensão precisa dos impactos socioambientais da atividade, que pode afetar mais de 300 famílias do Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Terra Nossa e 506 indígenas da etnia Kayapó Mekrãnogti, além de ter grande potencial de contaminar o rio Curuá.
Em dezembro de 2021, atendendo a pedido do MPF, o desembargador federal Souza Prudente, relator do processo no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em decisão provisória, determinou a suspensão, pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), da concessão de novos títulos de exploração à mineradora Chapleau. Estas, por sua vez, apresentaram recursos ao Tribunal, contra os quais o MPF apresentou contrarrazões no último dia 30 de março. Entenda o caso.
Processo coletivo – A decisão do TRF1 é questionada com base no argumento de que estaria fora do que foi pedido inicialmente no processo. No entanto, o MPF esclarece que trata-se de pedido coletivo em casos complexos, em que a doutrina aceita flexibilidade quanto ao conteúdo da decisão. Segundo a manifestação ministerial, “após a propositura da ação civil pública ocorreram inúmeras modificações fáticas e jurídicas suficientes para demostrar a prevalência do princípio da atualidade, o qual sustenta a decisão em estudo e lhe confere legalidade.”.
Para o MPF, não se trata apenas de direitos fundamentais dos indígenas Kayapó Mekrãnogti. O licenciamento do projeto minerário ignora o domínio federal do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sobre a área do PDS Terra Nossa e expõe as famílias assentadas a um risco desconhecido.
Legitimidade – A ANM e o Estado do Pará recorreram da decisão alegando ilegitimidade para atuarem na ação. O MPF, entretanto, argumenta que “só o fato de ser responsável pela emissão das guias de utilização de minérios é suficiente para demonstrar a legitimidade da agência.” O mesmo raciocínio foi aplicado à Semas, responsável pela concessão de licença para pesquisa mineral com lavra experimental à empresa, em 2017. Para o procurador regional Felício Pontes Jr., o órgão licenciador, em razão de sua competência ambiental, tem sua legitimidade reconhecida.
Distância – Entre os argumentos levantados para a dispensa de consulta prévia está o de que empreendimento se situa a mais de 10 km da TI Baú, conforme estabelece a Portaria Interministerial nº 60/2015, estando de fato a 10,22 km. Para o MPF, trata-se de uma interpretação controversa da referida portaria, sendo os 10 km uma presunção relativa, em que apenas no caso concreto torna-se possível aferir os impactos da mineração na região. Para Felício Pontes Jr., “não é crível que 220 metros possam ser levados em conta para retirar o impacto de uma obra que pretende explorar 50 mil toneladas de ouro por ano, diante dos elementos químicos utilizados na exploração.”.
Impactos – Sobre os impactos gerados pelo empreendimento, em 2020 a Fundação Nacional do Índio (Funai), expediu a Informação Técnica nº 121 em que lista os riscos socioambientais da atividade da mineradora e a necessidade de realização de estudo sobre impactos (Estudo de Componente Indígena). Aliás, o próprio Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) atesta impactos de contaminação nas nascentes do rio Curuá, principal rio que corta a TI Baú e que proporciona uma grande biodiversidade aquática, da qual os indígenas dependem para subsistência.
Consulta Prévia – Para o MPF, a consequência lógica dos evidentes impactos sobre a TI Baú é a necessidade de consulta prévia, livre e informada ao povo indígena Kayapó Mekrãnogti, conforme determina a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Sobre isso, a jurisprudência estabelece que a consulta deve ocorrer desde a fase de planejamento do projeto, com suficiente antecedência ao começo das atividades de execução, de modo a permitir que os grupos participem e influenciem na tomada de decisões. Ou seja, deve necessariamente anteceder a licença prévia, estando o empreendimento portanto em mora desde o início por ter violado o direito à consulta prévia.
Os recursos serão agora julgados pela Quinta Turma do TRF1.
Processo n° 0001592-34.2017.4.01.3908
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Assessoria de Comunicação
Procuradoria Regional da República da 1ª Região – MPF
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