O desaparecimento de plantas medicinais e de árvores usadas pelo povo Kuikuro na construção de casas chamou a atenção de pesquisadores do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) e da UFRA (Universidade Federal Rural da Amazônia) que estiveram no Território Indígena do Xingu (TIX) entre 13 e 17 de dezembro, em Mato Grosso.
Indígenas relataram preocupação com as espécies nativas, que estão ficando cada vez mais difíceis de serem encontradas. Para os cientistas, o “sumiço” é uma consequência da degradação causada por incêndios florestais na região, uma vez que estas espécies são vistas somente em áreas não afetadas pelo fogo.
A expedição foi realizada a convite dos bolsistas do IPAM, o ancião e conhecedor de espécies locais, Airi Kuikuro, e os jovens Diego Kuikuro e Kahuluhi Kuikuro, todos moradores da aldeia Afukuri, localizada às margens do rio Xingu no TIX, município de Querência, Mato Grosso. O trabalho integra o projeto “O fogo no Xingu: determinantes e efeitos sobre a vegetação e recursos de importância socioambiental”, financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e pelo PrevFogo (Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais).
Participaram do grupo de pesquisadores o técnico de campo e parabotânico do IPAM, Raimundo Mota; o pesquisador de pós-doutorado no projeto, Hernani Oliveira; a doutora em ecologia e especialista em ecologia do fogo, Letícia Gomes; e o vice-coordenador do projeto, especialista em ecologia do fogo e professor na UFRA (Universidade Federal Rural da Amazônia), Divino Silverio.
Floresta empobrecida
Os bolsistas mapearam as principais espécies de árvores utilizadas pela comunidade, registrando seus nomes indígenas e se tais espécies são vulneráveis ao fogo. Um dos objetivos da expedição científica foi relacionar o conhecimento tradicional indígena ao conhecimento científico sobre o fogo, o que passa pela identificação dos nomes científicos de cada uma das espécies de árvores presentes em florestas queimadas e em florestas não queimadas.
“Tivemos duas descobertas importantes”, disse Silvério, “primeiro, constatamos que há uma enorme área de floresta degradada pelos incêndios dentro do território indígena e que tal região é pobre em espécies se comparadas às florestas preservadas. O segundo ponto é que encontramos grandes extensões de vegetação savânica com espécies que apresentam imensa amplitude de ocorrência no Cerrado. Foi bastante curioso, também, ver que o rio Xingu, ao menos naquela localidade, funciona como um claro divisor entre a floresta amazônica e o Cerrado.”
O vice-coordenador destaca ainda a alta simplificação da vegetação atingida pelo fogo, o que faz com que espécies antes comuns e de uso tradicional dos indígenas desapareçam das áreas atingidas pelo fogo. Em locais de floresta amazônica já queimados, os pesquisadores observaram uma vegetação “mais pobre”, com predominância de espécies de crescimento rápido como Tachigali vulgari e Mabea fistrulifera. Já na floresta não queimada, registraram maior quantidade de árvores grandes e riqueza de espécies. Em áreas de Cerrado, o grupo coletou dados de espécies variadas. Todas as informações estão sendo processadas pelos cientistas.
“São muitas áreas de floresta que queimaram ao menos uma vez nos últimos 20 anos, nas quais as espécies utilizadas pelos indígenas para construção ainda não voltaram a aparecer. No Cerrado, a frequência de incêndios tem aumentado bastante, e segundo os indígenas, várias espécies de plantas medicinais características desse bioma não têm sido mais encontradas”, explicou.
Segundo o MapBiomas Fogo, Amazônia e Cerrado concentram 85% da área queimada no Brasil nos últimos 36 anos. Mato Grosso foi o estado que mais queimou, seguido por Pará e por Tocantins.
PUBLICADO POR: IPAM AMAZÔNIA
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