Projeto em andamento no Museu Goeldi demonstra como, na prática, a melhoria física de espaços e o acesso a recursos aumentam a qualidade das pesquisas sobre a sociobiodiversidade amazônica. Com a duração de cinco anos, a iniciativa é custeada pela Finep.

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Agência Museu Goeldi – Mais de 100 projetos de pesquisa sobre a sociobiodiversidade amazônica foram beneficiados com a reforma e adequação dos laboratórios multiusuários do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG).

As melhorias foram viabilizadas pelo projeto “Parque Analítico do MPEG: análise das transformações da Amazônia e seus reflexos na sociobiodiversidade e na paisagem”, aprovado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) em maio de 2018.

Com o valor total de R$ 9,5 milhões, o projeto inclui em suas próximas fases a implantação de um moderno sistema de backup e segurança dos dados e a construção de uma microusina de energia fotovoltaica, com capacidade de geração anual de 400 MWh de energia. A previsão é que essa produção contemple mais de 30% da energia total consumida no campus de pesquisa do Museu Goeldi.

“O Museu sai à frente como uma instituição na Amazônia que gera parte da sua própria energia. Com o projeto, que ainda tem dois anos e meio pela frente, essa questão de energia limpa e de uma produção sustentável será trazida para dentro do Museu. É uma forma de demonstrarmos, como instituição, que temos uma preocupação real  com o ambiente”, enfatiza a pesquisadora Ana Lúcia da Costa Prudente, que coordena o projeto do Parque Analítico.

O Parque Analítico inclui todos os laboratórios multiusuários da instituição: o de Biologia Molecular, o Adolpho Ducke, o de Análises Químicas, o de Análises Espaciais e o de Microscopia Eletrônica.

A reestruturação dos três primeiros laboratórios foi concluída no início deste ano. Novos equipamentos também foram adquiridos e três técnicos especialistas contratados para o trabalho nos laboratórios, com a compra de suprimentos para a realização das pesquisas.

Segundo Ana Prudente, a gestão colegiada dos recursos, das decisões e dos espaços é um dos princípios obedecidos pelo projeto desde a sua concepção. Além disso, os laboratórios atendem a demandas da comunidade de cientistas do Museu Goeldi, dos programas de pós-graduação mantidos pela instituição e de organizações parceiras.

“Então, o que esse projeto tem como diferencial? Ele maximiza e potencializa a utilização do recurso público. Não existe um investimento individual, mas sim em um conjunto de pessoas”, ressalta a coordenadora.

Ao todo, são 102 projetos de pesquisa desenvolvidos desde o início do projeto, com a maior parte delas em fase de realização. Cerca de 80 artigos e capítulos de livro foram publicados e dezenas de pesquisas de mestrado e doutorado apoiadas pelos laboratórios.

“Nós estamos aprendendo que é muito mais difícil trabalhar em conjunto, em cooperação, do que sozinhos. É algo que exige ceder, escutar o outro, pois num sistema colaborativo você tem que discutir. Isso dá mais trabalho, mas é muito mais gratificante”, reforça Ana Lúcia.

Modernização – O Laboratório de Biologia Molecular (LBM) é responsável por aumentar o conhecimento da biodiversidade amazônica, na medida em que as pesquisas moleculares permitem a identificação da chamada diversidade críptica. Na prática, essas pesquisas permitem diferenciar espécies cujos indivíduos são semelhantes na estrutura física (morfológica), mas geneticamente diferentes.

Usuário do laboratório, o ictiologista Alberto Akama, que é pesquisador do MPEG, reforça as melhorias físicas realizadas no espaço. Antes composto por duas salas, onde todas as atividades eram realizadas simultaneamente, o LBM foi expandido e setorizado, em acordo com cada processo envolvido nas análises genéticas, tais como a extração, a replicação, o sequenciamento e o pós-sequenciamento do DNA de diferentes tipos de organismos.

Entre outras vantagens, essa nova organização evita contaminações das amostras, assim como o aumento da capacidade de pessoas atendidas ao mesmo tempo.

“O ‘pipeline’ de trabalhos do laboratório ficou excelente”, avalia Akama. “A divisão do laboratório permite que todos os procedimentos da preservação de amostras até o sequenciamento ocorram de forma concatenada. Isso pode parecer simples, mas não é!”.

“Outro ponto importante é que o financiamento permite ao Museu olhar para o futuro, sem esquecer o passado recente. Ou seja, as reformas e os novos equipamentos permitem buscar a preparação de bibliotecas para o sequenciamento de nova geração, que amplia muito o uso de dados moleculares para inúmeros fins, desde trabalhos de taxonomia e sistemática à análises populacionais e ao que chamamos de ecologia molecular”, aponta o pesquisador.

Resultados – Em outros laboratórios, como o de Análises Químicas (LAQGoeldi), a reforma incluiu uma nova pintura, a substituição de bancadas, a adequação de normas de segurança e a renovação do piso.

No espaço, são realizados estudos das mais diversas áreas, como a das Ciências Agrárias, Florestais, Ambientais e dos Materiais, Geologia, Química, Farmácia, Medicina, Medicina Veterinária e Odontologia.

Com mais informações sobre o comportamento químico de diferentes espécies de plantas, incluindo as medicinais, e o monitoramento de metais concentrados em ambientes como manguezais, essas pesquisas favorecem o desenvolvimento de bioprodutos e bioprocessos que podem ser de interesse para os setores farmacológicos e ambientais.

Segundo a pesquisadora Cristine Bastos do Amarante, que coordena o LAQGoeldi, um exemplo de pesquisa realizada no espaço é a que envolve a planta popularmente conhecida como “aninga” (Montrichardia linifera), cujo extrato hexânico inibe o crescimento dos ovos do Plasmodium falciparum, parasita causador da malária. Esses resultados confirmam os relatos feitos por ribeirinhos amazônicos, indicando que a presença da planta num ambiente inibe a incidência de casos de malária nele.

O efeito do extrato da aninga foi testado em outros organismos, como as larvas do mosquito causador da dengue e em carrapatos. “O estudo também testou as larvas do Aedes aegypti, sendo letal para 100% das larvas. Também foram testados os extratos desta planta contra o carrapato bovino, o Rhipicephalus (Boophilus) microplus, obtendo-se resultados promissores. Graças a isso, estão sendo desenvolvidos no laboratório bioprodutos repelentes, larvicidas e carrapaticidas com extratos, frações e óleos essenciais de aninga”, revela Cristine.

Como resultado, ao menos duas patentes relacionadas à aninga foram registradas desde 2018 junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).

Equipamento – No Laboratório Adolpho Ducke (LAD), o projeto do Parque Analítico permitiu a aquisição de um aparelho de secagem por atomização (spray dryer), o que tem possibilitado a implementação de novas metodologias de pesquisa de óleos essenciais.

No espaço, os pesquisadores investigam espécies aromáticas encontradas em diversos biomas da Amazônia Legal, além de realizar a prospecção de moléculas bioativas em óleos essenciais com potencial econômico.

Realizadas em cooperação com diversas universidades e instituições científicas regionais, essas pesquisas resultaram na implementação de uma base de dados de plantas aromáticas e frutos da Amazônia. Duas coleções, uma de Óleos Essenciais (Oleoteca) e outra de Plantas Aromáticas, também são mantidas por meio desses estudos.

“Na Oleoteca, encontram-se registradas mais de 04 mil ampolas de óleos essenciais, correspondentes a 393 espécies de plantas aromáticas da Amazônia, o que já atraiu profissionais especializados, os chamados perfumistas, de empresas nacionais e multinacionais em busca de notas olfativas diferenciadas”, comenta a pesquisadora Eloisa Helena de Aguiar Andrade, que coordena o LAD.

Texto: Brenda Taketa – PUBLICADO POR:   MUSEU GOELDI