O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) contribuiu para o desenvolvimento de um sistema tecnológico capaz de rastrear o pirarucu, um dos peixes mais tradicionais da Amazônia, pescado de forma sustentável por comunidades ribeirinhas e indígenas da Reserva Extrativista do Médio Juruá.
Com um sistema de QR Code, é possível acompanhar toda a trajetória do peixe manejado, desde a pesca até sua chegada à indústria e posteriormente aos supermercados. O objetivo é aumentar a segurança sanitária do alimento, a confiabilidade de origem e, ao mesmo tempo, ampliar a renda dos pescadores.
“Esperamos que o rastreamento melhore as condições comerciais e amplie as vendas das comunidades manejadoras”, diz o assessor da Associação dos Produtores Rurais de Caruari (ASPROC), Adevaldo Dias da Costa, que liderou o projeto.
“Por ser um produto especial, por causa da proteção e do licenciamento, existe por parte da sociedade uma demanda por rastreabilidade, para que o cliente saiba a origem daquele produto, se ele segue os padrões de sustentabilidade social e ambiental”, declara.
O rastreamento do manejo sustentável do pirarucu foi um dos 12 projetos selecionados pelo Innovation Challenge, iniciativa do PNUD Brasil para financiar experiências e metodologias de inovação nas cadeias de produção de Piauí e Amazonas, alinhadas aos aceleradores dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nos estados.
A ideia foi criar redes de parcerias locais de forma a acelerar o alcance da Agenda 2030 e seus 17 ODS. Cada iniciativa selecionada recebeu financiamento de R$100 mil.
Iniciado em 2019, o projeto já está dando resultados, uma vez que uma parte significativa da pesca realizada em 2020 nas áreas protegidas do Médio Juruá foi comercializada com selo de rastreabilidade.
O pirarucu é um produto atrativo para as comunidades ribeirinhas por causa de seu peso, que chega a 200 kg, e seu comprimento, que chega a 3 metros. A pigmentação vermelha nas escamas dá o nome da espécie, união de dois termos em tupi: pira (peixe) e urucum (vermelho).
A expectativa é de que a maior divulgação do sistema aumente as vendas da próxima safra, com início em agosto. Segundo o assessor da Associação dos Produtores Rurais de Caruari, supermercados de todo o Brasil têm mais interesse em adquirir produtos com garantias de sustentabilidade em toda a cadeia de produção.
As informações cadastradas no QR Code incluem local onde o peixe foi capturado, o tamanho do peixe e das ovas, seu peso, entre outras. Nas indústrias, novas informações são coletadas por meio de tablets ou smartphones.
Vendido sob a marca Gosto da Amazônia, o pirarucu manejado no Médio Juruá é a primeira experiência de rastreabilidade do peixe no estado. A previsão é de que a prática seja disseminada para outras regiões amazônicas.
Durante as últimas décadas do século passado, a pesca do pirarucu passou a ser a principal atividade econômica de comunidades ribeirinhas do Amazonas. Tal pesca intensiva pressionou a população do peixe, que ficou sob risco de extinção. Um dos indicadores disso foi a redução de seu peso e comprimento médio.
Nesse cenário, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) incorporou procedimentos para avaliação e emissão de licenças de exportação. Em 1989, estabeleceu um tamanho mínimo de captura (150cm).
No início dos anos 2000, comunidades ribeirinhas e pesquisadores desenvolveram uma metodologia de contagem da população de pirarucu, um peixe que, por ter dupla respiração – aérea e branquial –, é facilmente localizável por saltar à superfície da água para “respirar”.
Com base nessa metodologia de contagem, as comunidades locais passaram a proteger a espécie, cuja população foi aumentando com a ajuda de novas restrições da pesca impostas pelo IBAMA, que hoje autoriza a captura de 30% dos peixes adultos.
“Houve um esforço das comunidades ribeirinhas e indígenas para proteger o território. Sem a presença dessas comunidades não existiria manejo sustentável do pirarucu e planejamento da pesca, garantindo a sobrevivência da espécie”, declara Adevaldo Dias da Costa, cuja associação está envolvida no manejo sustentável do pirarucu desde 2011.
Como a ASPROC não tem fins lucrativos, toda a receita líquida da comercialização fica com os manejadores. A última safra da associação somou 100 toneladas, que foi vendida principalmente no Amazonas, mas também para Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP) e Brasília (DF).
O PNUD financiou mais de 50% do custo de desenvolvimento da ferramenta de rastreamento e do treinamento dos pescadores para uso do software. Partindo de uma análise coletiva de gargalos e oportunidades, a experiência articulou comunidades e desenvolveu ações comerciais de forma a respeitar demandas e direitos dos manejadores, incluindo negociações coletivas.
Estratégia do PNUD – O financiamento aos projetos do Innovation Challenge parte da estratégia do PNUD baseada na importância de focar esforços em áreas com grande concentração de população vulnerável, em particular no norte e nordeste do Brasil, fomentando projetos ligados aos aceleradores dos ODS identificados.
Também se encaixa no objetivo da organização de desenvolver e ampliar parcerias não apenas com governos, mas também com sociedade civil, setor privado, universidades e doadores internacionais como uma forma de impulsionar iniciativas alinhadas à Agenda 2030.
“O projeto do Coletivo do Pirarucu Manejado visa elaborar propostas conjuntas que beneficiem toda a cadeia, bem como desenvolver arranjos comerciais que atendam prioritariamente as demandas dos manejadores, considerados o elo mais frágil dessa cadeia, remunerando de forma mais justa o tempo de trabalho e o excepcional esforço de conservação realizado por essas comunidades”, afirma a analista de projetos do PNUD Vanessa Fernandes Gonçalves.
O Amazonas é o estado com maior área geográfica do país, localizado na Amazônia brasileira, e apresenta desafios para assegurar seu desenvolvimento econômico e social e, ao mesmo tempo, garantir a preservação da floresta e dos seus povos tradicionais. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado é classificado como médio (0,674), ocupando a 18ª posição entre as 27 unidades federativas brasileiras.
PUBLICADO EM: ONU NAÇÕES UNIDAS
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