Indígenas cobram fiscalização, retirada urgente de invasores, cancelamento de Cadastros Ambientais Rurais sobrepostos ao território e indenização por acúmulo de danos
Porto Velho (RO) – O povo Karipuna ingressou ontem (4) com uma ação na Justiça Federal de Rondônia para garantir a proteção da Terra Indígena (TI) Karipuna, constantemente ameaçada por madeireiros e grileiros. Quase extintos na década de 1970, quando tiveram contato com a sociedade não indígena, os Karipuna totalizam hoje uma população de 60 pessoas e vivem em uma situação de eminente genocídio, segundo o Ministério Público Federal (MPF) do estado.
Os pedidos feitos pelo povo Karipuna à Justiça direcionados à União e à Fundação Nacional do Índio (Funai) vão no sentido de que efetivem, com urgência, a retirada dos invasores, a fiscalização e a vigilância da TI Karipuna, além da destruição de obras dos criminosos no interior da terra indígena, como poços, estradas, cercas e pastagens. Os indígenas demandam que essas ações sejam feitas em até 60 dias, sob pena de multa de R$ 5 mil por dia de descumprimento.
Os Karipuna também solicitam que União e Funai sejam condenadas a restabelecer a cobertura florestal das áreas indevidamente degradadas e a criar um sistema permanente de proteção para a TI, para impedir novas invasões e ações de degradação da terra demarcada.
Quanto ao estado de Rondônia, os indígenas solicitam o cancelamento e a retirada de todos os Cadastros Ambientais Rurais (CAR) incidentes sobre a TI Karipuna de sua base de dados, e pedem que a Secretaria Estadual do Meio Ambiente seja impedida de efetuar novos registros com sobreposição à terra indígena.
Na ação, os indígenas ainda pedem que a União, a Funai e o estado de Rondônia sejam condenados a indenizar o povo por danos materiais e ambientais, tendo como referência o valor estimado pelo MPF para os danos causados à TI Karipuna, de R$ 22 milhões, e por danos morais, em valor a ser definido pela Justiça.
Nos últimos anos, a TI Karipuna, já demarcada, homologada e registrada, tem sido alvo da ação sistemática de invasores, que atuam no roubo de madeira e, inclusive, no loteamento ilegal da terra indígena, com a venda de “lotes” de terra para posseiros e o desmatamento de áreas com a intenção de estabelecer propriedades dentro do território tradicional.
A situação vem sendo denunciada, tanto no Brasil como no exterior, pelo povo Karipuna. E, apesar da pressão ter tido resultado, com a prisão de pessoas suspeitas de envolvimento no esquema de loteamento ilegal e a diminuição do desmatamento na área no ano passado, os invasores seguem destruindo o território do povo. Entre 2017 e 2020, foram devastados 3.646 hectares da TI Karipuna, que ocupa a triste posição de 9ª terra indígena mais desmatada na Amazônia.
“Há anos lutamos contra a destruição de nosso território. Agora, é hora do tribunal responsabilizar o Estado por não ter conseguido cumprir o que determina a Constituição e garantir a proteção de nossa casa, do nosso povo, para que possamos viver em paz, de acordo com nossos costumes e tradições”, reivindica Adriano Karipuna, liderança do povo.
Adriano é um dos autores da ação, junto com André Luiz Karipuna, cacique da TI Karipuna, e Eric One Karipuna Daveca, presidente da Associação do Povo Indígena Karipuna (Apoika). Na semana passada, Adriano Karipuna participou do Fórum Permanente da ONU sobre Assuntos Indígenas, onde denunciou, mais uma vez, a ameaça ao povo Karipuna causada pelas invasões ao seu território, intensificadas durante a pandemia de Covid-19.
“As invasões à Terra Indígena Karipuna são contínuas há anos. Além de roubar as riquezas naturais, como a madeira, os invasores tentam legitimar a posse da terra, mesmo que de forma ilegal e inconstitucional, com a grilagem. O povo Karipuna, como protagonista na luta em defesa de seus direitos, vem denunciando a situação desde 2017, e agora busca que a Justiça atenda seu apelo e proteja seu território”, afirma Laura Vicuña, do Cimi Regional Rondônia.
CAR: instrumento para a grilagem de terras
Obrigatório para todos os imóveis rurais e criado com o propósito de sistematizar as informações ambientais das propriedades rurais, o CAR é um registro autodeclaratório e não serve como prova de que a propriedade cadastrada existe e é legítima. Ele vem sendo utilizado em esquemas criminosos de grilagem de terras públicas na comercialização ilegal de lotes e até em disputas judiciais.
Uma análise do Greenpeace Brasil e do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) identificou pelo menos 31 cadastros particulares sobrepostos à TI Karipuna. Eles foram registrados entre 2015 e 2019 e cobrem um total de 2,6 mil dos 153 mil hectares da terra indígena. Conforme a análise, 12 deles estão totalmente sobrepostos à área demarcada, e outros 19 incidem parcialmente sobre ela.
“A atribuição inicial do CAR é identificar os passivos ambientais em propriedades privadas. Não é possível que, após quase dez anos de sua elaboração, o Estado não tenha validado as informações que existem no sistema e ainda permita que essa ferramenta, dita ambiental, seja utilizada para validar grilagens e posses, muitas vezes violentas, em territórios indígenas e dos povos tradicionais”, critica Rômulo Batista, porta-voz do Greenpeace Brasil.
Os governos estaduais recebem e validam as inscrições do CAR feitas pelos proprietários ou possuidores de imóveis rurais, e integram os cadastros do estado à base do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (Sicar). O governo federal, por meio do Serviço Florestal Brasileiro, é responsável pela integração e gestão da base de dados nacional. No final de abril, o MPF recomendou ao estado de Rondônia que cancele todos os registros sobre a TI Karipuna.
Fonte: Comunicação Cimi/Greenpeace Brasil
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PUBLICADO POR: REPAM
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