A produção de café especial sustentável do povo Paiter Suruí, em Rondônia e no Mato Grosso, consolida a conquista do mercado nacional com apoio técnico e logístico da Fundação Nacional do Índio (Funai).
Na Terra Indígena Sete de Setembro, cerca de 110 famílias indígenas de 15 aldeias se organizaram em associações cooperativas para o ganho em escala e a distribuição da safra. A Funai apoia a produção de café especial desde a preparação da terra até o custeio para equipamentos, o transporte da safra e a articulação com outros órgãos para cursos de capacitação dos cafeicultores indígenas.
Para garantir a qualidade do produto desde o plantio até a colheita, os indígenas contam com a assistência técnica da Entidade Autárquica de Assistência Técnica e Extensão Rural de Rondônia (Emater/RO) e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Participam do desenvolvimento da cafeicultura indígena a Funai, a Câmara Setorial do Café de Rondônia e a Secretaria de Estado da Agricultura. Embora o povo Paiter Suruí tenha iniciado o cultivo de café na década de 1980, foi a partir de 2018 que o café especial indígena ganhou destaque com a participação de um grupo de produtores indígenas na Semana Internacional do Café, evento anual realizado em Belo Horizonte (MG).
Dentro da programação de 2019, o grupo 3Corações promoveu o primeiro Concurso Tribos. A ideia do evento havia surgido a partir de conversas entre diretores da empresa e cafeicultores indígenas durante a Semana Internacional do Café do ano anterior. A iniciativa distribui uma premiação em dinheiro para os dez primeiros colocados e garantiu a compra de toda a safra dos produtores premiados. Em 2020, o prêmio de melhor café especial ficou com o produtor Celso Lamitxab Suruí. A participação dos indígenas na Semana Internacional do Café conta com o apoio da unidade da Funai em Cacoal (RO).
Para o presidente da Funai, Marcelo Xavier, a produção de café sustentável no território do povo Paiter Suruí é um exemplo do que a produção sustentável pode representar para o desenvolvimento das comunidades indígenas. “Não há dúvidas de que uma atividade produtiva pode trazer de benefícios para os povos indígenas. Principalmente em relação à autonomia econômica das famílias envolvidas. Com responsabilidade e apoio governamental, os cafeicultores Paiter Suruí demonstraram que é possível produzir com alta qualidade e respeito às tradições e à floresta”, afirma Marcelo Xavier.
O presidente da Cooperativa de Produção e Extrativismo Sustentável da Floresta Indígena Garah Itxa do Povo Paiter Suruí, Celso Lamitxab Suruí, destaca que o projeto fortalece a qualidade da produção dentro de uma consciência ambiental, social e econômica. “Para nós, o desenvolvimento sustentável veio quebrando paradigmas de mostrar para a sociedade o nosso valor, a nossa identidade, agregando valor à nossa produção. Queremos levar esse tipo de modelo para outras Terras Indígenas, para que eles também possam desenvolver o seu trabalho dessa forma”, explica.
Etnodesenvolvimento
“A produção cafeeira dos Paiter Suruí está relacionada a uma lógica de planejamento territorial e ambiental peculiar daquela Terra Indígena, onde o cultivo específico do café especial alia a produção familiar e a proteção da floresta”, afirma o coordenador-geral de Promoção ao Etnodesenvolvimento da Funai, Juan Negret Scalia. “Cada etnia possui autonomia para escolher a atividade produtiva conforme suas tradições e de acordo com as caraterísticas de cada região. E a Funai tem atuado para valorizar essas escolhas, promovendo seus modos de produção e suas iniciativas”, acrescenta.
Nos últimos dois anos, a Funai investiu aproximadamente R$ 30 milhões em projetos voltados para a geração de renda nas aldeias e fortalecimento cultural dos povos indígenas, atendendo aos preceitos constitucionais de respeito aos usos, costumes e tradições de cada etnia. Os recursos foram destinados para ações que visam a autossuficiência das comunidades indígenas, como a aquisição de materiais de pesca, sementes, mudas, insumos, ferramentas e maquinário agrícola.
Desde o início da pandemia do novo coranavírus, em março de 2020, a Funai já investiu cerca de R$ 18 milhões em ações de etnodesenvolvimento nas aldeias de todo país. Os recursos foram destinados a atividades de piscicultura, roças de subsistência, colheita de lavouras, confecção de máscaras de tecido e artesanato, produção agrícola, casas de farinha, entre outros. O objetivo é fazer com que os indígenas mantenham a produção, além colaborar para que, no pós-pandemia, as etnias invistam em processos de geração de renda.
Café especial
Henrique Suruí, cacique geral e presidente da Cooperativa de Produção e Desenvolvimento do Povo Indígena Paiter Suruí (Coopaiter), lembra das invasões dos territórios por não indígenas nas décadas de 1970 e 1980, que desmataram a floresta para o plantio de café. Após a retirada dos invasores, os indígenas começaram a cultivar os cafezais que ficaram. “Nós nem falávamos português direito e conseguimos aprender a mexer com café. Desde aquela época, a gente vem aprendendo a trabalhar com café, em uma área que foi desmatada pela invasão, e que hoje é de dois hectares por família”, relata.
“Nunca tivemos café com produto químico, nosso café é orgânico. A renda média de café especial por família é em torno de R$ 10 mil. E eu quero dizer que a gente nunca perdeu o que nós somos, um povo indígena brasileiro. Nós temos cultura viva ainda, como medicina, língua, festas, comidas e roças tradicionais. Tudo que a gente tinha antes do contato com o homem branco nós temos ainda. Nós sabemos cuidar da nossa floresta, nós não agredimos a nossa floresta. Nosso sonho é melhorar mais a nossa produção sem prejudicar em nada a nossa floresta e a nossa cultura”, conclui.
Série especial
Outros projetos que contam com o apoio da Funai têm apresentado resultados expressivos na transformação da realidade das comunidades indígenas, como a produção de grãos do Povo Paresi no Mato Grosso, a colheita de castanha dos Cinta Larga em Rondônia, a produção de camarão do Povo Potiguara na Paraíba e a produção artesanal dos indígenas Guarani no Sul do país. Esses projetos produtivos serão abordados em matérias especiais no portal da Funai durante o mês de abril deste ano. Acompanhe!
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