Navegando o Tapajós ‒ Parte I
Rio Tapajós
O Rio Tapajós nasce no Estado de Mato Grosso. Recebe seu nome após a confluência dos Rios Juruena e Teles Pires. Faz divisa entre o Estado do Pará e o Sudeste do Amazonas, banha parte do Estado do Pará e deságua no Rio Amazonas na altura da Cidade de Santarém.
Expedições ao Tapajós
Antes mesmo da Expedição de Pedro Teixeira, a Bacia do Baixo Tapajós já era conhecida pelos portugueses. O escritor Manuel Rodrigues, o “Marañon”, relata que os ingleses, em busca de ouro, haviam empreendido duas expedições mal sucedidas, no Tapajós, onde grande parte dos expedicionários tinha perdido a vida.
A navegação do Tapajós, desde o princípio, foi realizada, simultaneamente, a partir do Sul e do Norte. Foram os próprios habitantes do Mato Grosso que descobriram que ele se origina da confluência do Juruena com o Arinos.
Os missionários Jesuítas fundaram seis missões desde a Foz, no Amazonas, até as cataratas, por volta de 1735. João de Souza Azevedo, em 1745, desceu pelo Rio Sumidor até suas cachoeiras. Em 1747, Pascoal Arruda desce o Tapajós a partir das Minas de Santa Isabel nas nascentes do Arinos.
Em 1805, João Viegas desceu o Rio e, em 1812, Antônio Tomé de França comandou a primeira Expedição mercante até a Cidade do Pará ([1]) e, no ano seguinte, retornou com suas canoas carregadas, pelo mesmo caminho.
A partir de então, as viagens pelo Tapajós se tornaram mais comuns e a mais importante, sem dúvida, foi a realizada pelo francês Henri Coudreau a serviço do governo Paraense com a finalidade de definir a localização exata das fronteiras do Estado com o Mato Grosso.
Relatos Pretéritos – Tapajós
Cristóbal de Acuña (1639)
LXXIV – Rio e Nação dos Tapajós
A 40 léguas ([2]) deste estreito desemboca, pela margem Sul, o grande e vistoso Rio dos Tapajós, que toma o nome da nação e Província de nativos que vivem em suas margens, que são muito bem povoadas por bárbaros, com boas terras e abundantes mantimentos. (ACUÑA)
Bernardo P. de Berredo e Castro (1718)
Livro 7
568. Conhecia bem Manoel de Souza os interesses da Capitania; e não duvidando de que os mais importantes eram os dos resgates de escravos Tapuias, para o serviço dela, encarregou esta diligência ao Capitão Pedro Teixeira, que assistido do Padre Frei Christovão de São Joseph, Religioso Capucho de Santo Antônio, saiu da Cidade de Belém com vinte e seis Soldados, e copioso número de índios ; mas como chegando à Aldeia dos Tapuyusus teve as informações de que no Tapajós comerciavam eles com uma Nação muito populosa, que tomava o nome deste mesmo Rio, deixando logo o das Amazonas, por onde navegava, entrou por aquelas doze léguas ([3]) até uma enseada de cristalinas águas, a que servia de docel um belo arvoredo; aprazível sítio, em que descobriu os novos Tapuias, avisados já desta visita pelos seus amigos Tapuyusus, generosamente subornados do mesmo Comandante. Porém ele, que entre as lisonjas da fortuna se lembrava sempre da sua inconstância, desembarcando muito nas vizinhanças da Povoação, se fortificou com toda a boa ordem da disciplina militar; até que satisfeito da fidelidade destes índios, os comunicou com mais confiança; e achando neles um trato menos bárbaro, indagou também as prováveis notícias de o haverem devido ao comércio das Índias Castelhanas, de que se tinham separado. Aqui se deteve alguns dias com amigável correspondência; e depois do resgate de galantes esteiras, e outras curiosidades, se recolheu ao Pará, justissimamente gostoso deste descobrimento, mas com poucos escravos; porque os Tapajós os estimam de sorte, que raras vezes chegam a consentir nesta qualidade de permutações. […]
Livro 10
733. Navegando mais quarenta léguas (10), à parte do Sul, entrou Pedro Teixeira na grande Boca do Tapajós, Rio tão aprazível, como caudaloso, que toma o nome da principal Nação dos seus habitadores que, além de serem todos muito guerreiros, usam também de flechas ervadas ([4]) e aportando uma das suas Povoações achou nela, pelos resgates ordinários, abundante refresco de carnes do mato, aves, peixes, frutas e farinhas, com um sumo agrado daqueles bárbaros Tapuias, que tratou alguns dias. A sua entrada é defendida de uma Fortaleza, que conservamos há muitos anos; mas ainda que várias vezes se tem intentado o seu descobrimento, só pode conseguir-se até os primeiros rochedos, embaraçado sempre da oposição forte daquele gentilismo. Tem dilatadas matas de pau cravo; e na eminência das suas montanhas, se presumem nelas umas pedras muito pesadas, que sendo de metal é de tão baixa qualidade, que se exala todo a sua fundição. (BERREDO)
Charles-Marie de La Condamine (1735)
XI
Em menos de dezesseis horas de caminhada, fomos de Pauxis à Fortaleza de Tapajós, na entrada do Rio do mesmo nome. Este é também um Rio de primeira ordem. Deflui das minas do Brasil, atravessando países desconhecidos, onde habitam nações selvagens e guerreiras, que os missionários jesuítas trabalham em amansar. Dos restos do aldeamento de Tupinambara, situado outrora numa grande Ilha, na Foz do Rio da Madeira, formou-se o de Tapajós, e seus habitantes são quase que tudo o que resta da valente nação dos Tupinambá, dominante há dois séculos no Brasil, onde deixaram a língua. Pode-se-lhe ver a história e a longa peregrinação na Relação do Padre d’Acuña.
É entre os Tapajós que se acham hoje, mais facilmente, dessas pedras verdes, conhecidas pelo nome de pedras das amazonas, cuja origem se ignora, e que foram tão procuradas outrora, por causa da virtude que se lhes atribuía, para curar a “pedra” a cólica nefrítica, e a epilepsia. Houve um tratado impresso sob a denominação de Pedra Divina. A verdade é que elas não diferem, nem na cor nem na dureza, do jade oriental: resistem à lima, e ninguém imagina por qual artifício os antigos americanos a talhavam, e lhes davam diversas configurações de animais. Foi, sem dúvida, o que deu lugar a uma fábula digna de refutar-se. Acreditou-se muito a sério que tal pedra não era mais que o limo do Rio, ao qual se dava a forma requerida, petrificando-o quando era tirado ainda fresco, e que adquiria ao ar esta dureza extrema. Quando se concordasse gratuitamente com semelhante maravilha, de que alguns crédulos não se desenganaram senão depois de ter experimentado inutilmente um processo tão simples, restaria outro problema da mesma espécie a propor aos lapidários.
São as esmeraldas arredondadas, polidas e furadas por dois buracos cônicos, diametralmente opostos num eixo comum, tais como ainda hoje se encontram no Peru, nas margens do Rio de Santiago, na Província das Esmeraldas, a quarenta léguas ([5]) de Quito, com diversos outros monumentos da indústria de seus antigos habitantes. Quanto às pedras verdes, elas se tornam cada vez mais raras, já porque os índios, que lhes dão grande importância, delas se não desfazem de boa vontade, já porque grande número delas foi enviado à Europa. (CONDAMINE)
Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 30.03.2021 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.
Bibliografia
ACUÑA, Christóbal de. Nuevo Descubrimiento del Gran Rio de las Amazonas – Espanha – Madrid – Ed. García, 1891.
BERREDO, Bernardo Pereira. Annaes Históricos de Berredo – Itália – Florença – Typographia Barbera, 1905.
CONDAMINE, Charles-Marie de La. Viagem na América Meridional Descendo o Rio das Amazonas – Brasil – Brasília, DF – Editora do Senado Federal, 2000.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
- Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
- Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA) (2000 a 2012);
- Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
- Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
- Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
- Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
- Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
- Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
- Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
- Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
- Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
- Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
- Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
- E-mail: [email protected].
[1] Cidade do Pará: Belém.
[2] 40 léguas = 264 km.
[3] Doze léguas = 79,2 km; quarenta léguas = 264 km.
[4] Ervadas: envenenadas.
[5] Quarenta léguas = 264 km.
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