Ministério Público Federal ressalta que Constituição Federal não faz distinção entre os indígenas e que todos devem ter direito a vacinação prioritária
O Ministério Público Federal (MPF) está processando a União, o estado de Rondônia e a Agência Estadual de Vigilância em Saúde (Agevisa) para garantir que indígenas desaldeados tenham prioridade em receber vacinação contra a covid-19. Na ação, o MPF pede que a Justiça obrigue a União a cadastrar no Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena (Siasi) todos os indígenas localizados em áreas urbanas de Rondônia, ainda que não residentes em aldeias ou territórios indígenas, em até dez dias. Após o cadastramento, a União deve distribuir a esses indígenas o cartão do SUS e incluí-los na fase 1 da vacinação prioritária contra a covid-19.
Na ação, o MPF também pede que a Justiça determine ao estado de Rondônia, por meio da Secretaria de Saúde e da Agevisa, que assegure o fornecimento das doses de vacina a esses indígenas não aldeados, conforme números atualizados a serem informados pelos Distritos Sanitários Indígenas (Dseis) de Porto Velho e de Vilhena.
Antes de ingressarem com a ação na Justiça, as procuradoras da República Daniela Lopes de Faria, Tatiana Versiani e Gisele Bleggi já haviam tentado garantir o direito dos indígenas desaldeados por meio de uma recomendação. Mas a Secretaria de Atenção à Saúde Indígena (Sesai), os Dseis e a Agevisa não acataram efetivamente a recomendação. Atualmente, todos os indígenas que receberão as vacinas estão cadastrados no Siasi e não há ainda levantamento de indígenas desaldeados e quantas doses seriam necessárias para atendê-los.
Sem aldeia – Tanto a ação quanto a recomendação tiveram como ponto de partida a solicitação do povo indígena Puruborá para serem incluídos no grupo prioritário de vacinação contra covid-19, uma vez que o processo de demarcação de suas terras ainda está em andamento. Além desse povo, também solicitaram providências as etnias Cassupá, Salamãe, Guarasugwe, Oro mon, Migueleno, Murá, Karitiana, Paumari, Kaxinaua, Mucua, Karipuna, Guajajara, Kaxarari, Apurinã, Paritintin, Gavião, Pataxo rararã, Warao, Chuiquitano, entre outras.
O MPF ressalta na ação que muitos grupos que estão nas cidades foram expulsos de suas terras tradicionais por invasores (grileiros, madeireiros, garimpeiros, Estado brasileiro etc..), por insegurança econômica, ausência ou precariedade de serviços básicos como saúde e educação ou até mesmo para estudar ou trabalhar. Portanto, necessitam de amparo estatal diferenciado do não-índio.
“Há uma invisibilidade institucional desses indígenas. A noção de que o índio ‘urbanizado’ é menos índio que os demais é uma clara visão edílica do bom selvagem. Essa visão já foi abandonada pela Constituição Federal de 1988 e pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que garantiram o direito supremo à autodeterminação desses povos e o respeito à forma de sobrevivência e aos costumes que bem entenderem seguir, sem padronizações e estigmatizações externas. Não se pode exigir que o índio de hoje seja o mesmo de 500 anos atrás”, apontam as procuradoras na ação.
Na ação, o MPF também aponta que historicamente os povos indígenas sempre estiveram mais vulneráveis biologicamente a viroses, em especial a infecções respiratórias. Estas doenças sempre apresentaram altos índices de mortalidade causados pelas doenças transmissíveis que contribuíram com a redução do número de indígenas que vivem no território brasileiro. Os efeitos da pandemia somam-se às circunstâncias históricas que colocam esses grupos sempre próximos à linha da pobreza. Dados governamentais apontam para o fato de que as doenças do aparelho respiratório são a principal causa de mortalidade infantil na população indígena.
A ação será julgada pela Justiça Federal e pode ser consultada no site do Processo Judicial Eletrônico com o número 1002443-23.2021.4.01.4100.
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