Evento realizado pela internet contou com a participação de mais de 500 pessoas; discussão vai embasar atuação do MPF em relação a medidas do governo federal para fusão dos institutos
Com mais de 500 participantes, o Ministério Público Federal (MPF) realizou ontem (1°) a audiência pública “Fusão entre ICMBio e Ibama: impactos sobre a Amazônia”. O evento foi promovido pela Força-Tarefa Amazônia pela internet, com transmissão pelo canal do MPF no Amazonas no YouTube. A medida está sendo discutida no âmbito de um grupo de trabalho no Ministério do Meio Ambiente, alegadamente sem o debate público necessário para a discussão do assunto.
A audiência foi composta por dois painéis, com exposições orais de especialistas, servidores dos institutos, representantes de organizações da sociedade civil e de populações tradicionais. O Ministério do Meio Ambiente foi convidado a participar do evento, por meio da Secretaria Executiva do grupo de trabalho formado para tratar da fusão, assim como a presidência do Ibama e do ICMBio, que optaram por não ter assento à mesa e por não participar do debate.
O primeiro painel, com o tema “Ibama e ICMBio: razões para fundir ou não fundir e Impactos sobre a Amazônia”, foi mediado pelo procurador da República Rafael da Silva Rocha e trouxe diversas considerações sobre o comprometimento que a fusão dos dois institutos pode trazer para a atuação na defesa do meio ambiente. De acordo com o professor da Universidade Federal do Amazonas e doutor em Ecologia Henrique Pereira, os dois institutos ainda não atingiram o alcance pleno de suas atividades finalísticas. “A fusão seria uma escolha equivocada, especialmente nesse momento quando os novos modelos ainda não se desenvolveram plenamente e passam por retrocessos”, afirmou.
Foram destacados, inclusive, indicadores relativos aos resultados obtidos a partir da criação o ICMBio, que atua na gestão das unidades de conservação (UCs) federais. Em participação pelo chat do YouTube, Erika Guimarães informou que o número de UCs com planos de manejo aumentou de 250%, passando de 78 (em 2007) para 195 (em 2018). Segundo ela, o número de famílias cadastradas nas reservas extrativistas e categorias similares aumentou mais de 1200%, passando de três mil (em 2010) para, pelo menos, 52 mil (em 2020). Erika ainda registrou o aumento significativo no número de Planos de Ação Nacional para Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção (PAN), de mais de 1100% em uma década: eram sete até 2009 e chegaram a 85 em 2019.
Transparência e participação – No segundo painel, mediado pelo procurador da República José Gladston Viana, foi debatido o tema “Transparência e Participação: vozes sobre a fusão”, com diversas críticas ao modo como a fusão está sendo discutida, sem a participação de especialistas no assunto nem da sociedade. Entre os pontos abordados, estava a não disponibilização de estudos para embasar a medida e a falta de transparência no debate do grupo de trabalho.
O representante do site Política por inteiro, Fábio Ishisaki, citou, como exemplo da falta de transparência da discussão, o fato que de foram solicitadas, via Lei de Acesso à Informação, as atas da reunião do grupo de trabalho e que os documentos disponibilizados contêm apenas pautas gerais, não apresentando qualquer esclarecimento sobre os debates em andamento. “Todos que estão no GT são servidores públicos, exercem função pública e estão debatendo questões de ordem pública devem se atentar para princípio da publicidade e da transparência da Administração Pública”, destacou Fábio.
Apuração de possível desmonte – A audiência faz parte do contexto de apuração de dois inquéritos civis conduzidos pelo MPF que avaliam possíveis desmontes estruturais no Ibama e no ICMBio e o impacto desse possível desmonte sobre a Amazônia. A procuradora da República e coordenadora da Força-Tarefa Amazônia, Ana Carolina Haliuc Bragança, explicou que aspectos como a suficiência orçamentária, a disponibilidade de recursos humanos, a regularidade de trâmites administrativos e a continuidade em ações finalísticas são alguns dos critérios a serem observados na definição da existência ou não de uma desestruturação capaz de afetar a prestação de serviços públicos de proteção ao meio ambiente.
De acordo com a procuradora, o papel do MPF, após a audiência, é traduzir em termos jurídicos o conteúdo debatido no evento, avaliando as medidas cabíveis. Ela citou diversos deveres do Estado, no sentido de evitar o retrocesso na proteção do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o princípio da precaução, o princípio da informação e o princípio da participação, vigentes no direito ambiental.
Ana Carolina destacou ainda que os impactos na Amazônia da eventual fusão dos institutos são de interesse de todo o país. “Enfraquecer a população da Amazônia significa enfraquecer a proteção a toda a população brasileira, diante dos impactos que o bioma amazônico apresenta em outras áreas do país”, afirmou.
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