Porto Velho, RO/ Santarém, PA ‒ Parte LXXXIII
Descendo o Rio Madeira ‒ XIV
Passados 50 anos e várias prospecções, o Relatório Link tem-se mostrado, de maneira geral, correto, em cada uma de suas conclusões sofrendo, contudo, pequenas, mas inevitáveis, alterações com o tempo, em decorrência dos resultados obtidos e dos avanços tecnológicos.
Fábio Giambiagi, na obra intitulada “Petróleo: Reforma e Contrarreforma do Setor Petrolífero Brasileiro” faz as seguintes considerações a respeito da trajetória de Link na PETROBRAS.
Para a condução do recém-criado Departamento de Exploração [DEPEX], a PETROBRAS decidiu contratar um geólogo de grande experiência, Walter Link, ex-geólogo-chefe da Standard Oil Co. of New Jersey, que iniciou seus trabalhos no Brasil em outubro de 1954. Uma das primeiras decisões da diretoria da PETROBRAS em atendimento às recomendações de Walter Link foi a reformulação da política de formação de geólogos e geofísicos no Brasil, em nível de pós-graduação, substituindo a prática de envio dos profissionais da companhia para aperfeiçoamento em geociências no exterior, em um acordo com a Universidade de Stanford e o suporte da Universidade da Bahia, dando preferência ao preparo desses profissionais no Brasil, cabendo observar que não havia, na ocasião, cursos universitários dessa natureza no país.
Os cursos, destinados a engenheiros, tinham duração de dois anos e tiveram início em 1957, formando, a cada ano, cerca de 15 profissionais, até que, algum tempo depois, as universidades brasileiras passaram a formar geólogos em nível de graduação e os cursos dessa natureza foram extintos.
Essa política se estendeu também para outras áreas críticas, como a de perfuração – produção e a coordenação geral dessas atividades conferidas ao CENAP, o órgão da PETROBRAS, precursor do CENPES, o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento [P&D] da PETROBRAS. Esse zelo inicial da empresa na formação de seu pessoal se mantém até hoje, orientado para a preparação de um corpo técnico de alto nível, numa carreira estável, bem remunerada e com amplas possibilidades de desenvolvimento profissional, quer do ponto de vista estritamente técnico, quer do ponto de vista gerencial, com frequência em universidades no exterior. Sob o comando de Link, a PETROBRAS conduziu um intenso programa de exploração nas Bacias Paleozoicas do Amazonas [no Baixo, Médio e Alto Amazonas – hoje designado Solimões], e do Maranhão – hoje designado Parnaíba –, assim como nas Bacias costeiras terrestres de Barreirinhas, do Maranhão ao Espírito Santo.
Dois excelentes indicadores comparativos do nível de atividade conduzido e dos resultados obtidos podem ser cotejados nos 15 anos de atuação do CNP, entre 1939 e 1954, e nos 10 anos iniciais da PETROBRAS, entre 1954 e 1964: o CNP perfurou 217 poços exploratórios e de desenvolvimento e a PETROBRAS, 679 poços exploratórios; o CNP contabilizou, ao fim de seu período de atuação, 51 milhões de barris de petróleo de reservas, e a PETROBRAS, ao fim do período mencionado, 674 milhões de barris.
Mas, historicamente, os pontos mais importantes acham-se registrados nos três relatórios apresentados pelo DEPEX no segundo semestre de 1960, de certo modo resumindo a posição dos geólogos, encabeçada por Link, que ficaram conhecidos como “Relatório Link”, o último deles emitido em 22.08.1960, pouco antes de Link deixar o Departamento, sintetizando resultados e refletindo o pessimismo pela ausência de descoberta de campos gigantes de petróleo, “ausência de Bonanza Oil”, nas Bacias investigadas. Um ponto relevante desses relatórios é a classificação das Bacias sedimentares brasileiras, de acordo com sua prospectividade e perspectiva de sucesso, em quatro categorias, de A [Bacia com produção comercial] a D [Bacias consideradas sem possibilidades, onde a exploração deve cessar]. Houve inclusive a sugestão de que seria melhor a PETROBRAS ir para o exterior ou para o “offshore” brasileiro ([1]). Essas avaliações evoluíram com o tempo, de acordo com resultados obtidos, de um ou outro modo, e os avanços tecnológicos. O Médio Amazonas, por exemplo, foi classificado como C+, e o Alto Amazonas, como C-, embora justamente neste último petróleo de excelente qualidade tenha sido descoberto e desenvolvido anos depois [1986]. […] Talvez o principal legado de Link tenha sido, como ressaltou o geólogo Giuseppe Bacoccoli, a introdução na equipe de exploração de:
importantes princípios que, contagiando as outras equipes de Exploração e Produção [E&P] e até toda a PETROBRAS, acabaram se transformando num dos pilares que contribuíram para o sucesso da empresa.
Entre eles não se poderia deixar de mencionar:
- O entusiasmo e a dedicação ao trabalho;
- A necessidade de estudar sempre;
- A modéstia de aprender com quem sabe;
- A disciplina; e
- O estabelecimento de claros procedimentos de trabalho. (GIAMBIAGI)
Relatório Link
DEPEX – 1032/60, 22 de agosto de 1960.
Ao: General Idálio Sardenberg […]
De: Walter K. Link.
Senhores,
Na semana compreendida entre 15 e 19 de agosto, tivemos discussões preliminares sobre os programas de trabalho para 1961. Todos os geólogos de distritos, seus assistentes e o “staff” técnico do DEPEX estiveram presentes às reuniões. Um total de 6 geólogos brasileiros e 8 estrangeiro tomaram parte na reunião. […] As avaliações finais das Bacias designadas como A, B, C e D, acham-se sintetizadas na primeira folha anexa a esta carta, e consiste em duas médias. A primeira inclui a avaliação de todos os técnicos e a segunda exclui a do missivista.
Bacia “A” – indica produção comercial, e a exploração deverá continuar.
Bacia “B” – apresenta todos os requisitos necessários e os fatores geológicos indicam que se deverá encontrar óleo e quantidade comercial, garantindo a continuação da exploração ativa.
Bacia “C” – é uma Bacia marginal que foi feito grande esforço exploratório sem sucesso comercial. Tais Bacias pedem diminuição da exploração sem necessariamente exigirem completa cessação da mesma.
Bacia “D” – não apresenta possibilidades e a exploração deverá cessar.
Nesta base, julgamos que a área terrestre de Sergipe tem uma avaliação “B+” e a exploração deverá continuar em larga escala. O Médio Amazonas tem avaliação “C+” e a exploração deverá continuar em escala reduzida, Barreirinhas, Maranhão, a área terrestre de Alagoas e o Sul do Brasil podem ser classificadas tanto em “C” como abaixo, porém mais do que “D”. As possibilidades de óleo não se mostram favoráveis e as oportunidades de se encontrar o “Óleo Bonanza” que o Brasil necessita, são poucas. O Baixo e Alto Amazonas, Acre, São Luiz e a faixa terrestre do Espírito Santo, São todas “D+” ou menos e a exploração não é aconselhável. […]
Sinceramente, Walter K. Link.
Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 21.12.2020 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.
Bibliografia
GIAMBIAGI. Fábio. Petróleo: Reforma e Contrarreforma do Setor Petrolífero Brasileiro – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Elsevier Editora Ltdª, 2013.
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;
- Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
- Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
- Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
- Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
- Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
- Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
- Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
- Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
- Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
- Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
- Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
- Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
- Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
- E-mail: [email protected].
[1] Offshore brasileiro: afastado da costa brasileira.