Procurador considera muito positiva a decisão, mas discorda da isenção dada ao empreendimento hidrelétrico pelos danos causados
O Governo Federal tem 15 dias para comprovar nos autos, perante o Juízo, que adotou as providências necessárias à manutenção e funcionamento satisfatório dos Sistemas Simplificados de Abastecimento de água localizados nas aldeias São Benedito, Tucumã, Dinossauro, Kururuzinho, Barro Vermelho, Teles Pires, Papagaio, Bom Futuro, Posto Velho, Caroçal Teles Pires, Ariramba Teles Pires, Vista Alegre, Mayrowi e Burutanga. A decisão, em caráter liminar, é do juiz federal da 1ª Vara de Mato Grosso, Ciro José de Andrade Arapiraca e foi publicada na última sexta-feira (18), atendendo ao pedido, do Ministério Público Federal (MPF), feito em Ação Civil Pública ajuizada em 2014, na qual pede a condenação da Companhia Hidrelétrica Teles Pires (CHTP) e do Governo Federal, para o efetivo abastecimento de água potável aos povos indígenas atingidos pelo empreendimento, tanto em Mato Grosso quanto no Pará.
Além disso, a Justiça Federal determinou que a União comprove nos autos, no prazo de 30 dias, que tomou as providências para a instalação dos Sistemas Simplificados de Abastecimento de água para atender as comunidades indígenas Coelho, Lage, Kawaiwete, Siqueirinha, Remanso, Aximari, Minhocoçu, Waremat, Akopak, Três Marias I e Três Marias III, além de outras aldeais eventualmente identificadas posteriormente, por ocasião da efetivação da medida.
A decisão foi tomada após a realização de uma audiência judicial, no dia 2 de dezembro, que tratou sobre os impactos na água do rio Teles Pires causados por uma das hidrelétricas que operam na região, a usina de Teles Pires (UHE Teles Pires). Pela primeira vez os indígenas foram ouvidos por um juiz federal sobre como estão vivendo e as dificuldades que estão sofrendo desde quando os empreendimentos foram instalados na região.
“A partir dos depoimentos das testemunhas colhidos em audiência, a despeito da instalação de 9 (nove) Sistemas Simplificados de Abastecimento de água, é possível consignar que tais medidas não foram suficientes para assegurar, à população indígena local, a qualidade da água e seu abastecimento permanente, haja vista que se observa que tais métodos necessitam de rotineira manutenção, além da disponibilização de combustível para o seu funcionamento, razão pela qual, à luz dos subsídios encartados ao feito, denota-se que a União, por intermédio de seus DSEIs, não vem cumprindo com a sua missão de fazer funcionar adequadamente referidos sistemas de abastecimento de água potável. Prova disso são os relatos das testemunhas inquiridas em audiência”, destaca o juiz Ciro de Andrade em trecho de sua decisão.
Além do depoimento dos indígenas, o juiz levou em consideração o laudo da perícia judicial, que afirma que as águas do rio Teles Pires e seus afluentes “não se enquadram nos padrões mínimos estabelecidos para consumo humano sem prévio tratamento”.
O procurador da República, titular do Ofício de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais em Mato Grosso, Ricardo Pael Ardenghi, ressaltou que a decisão é algo a se comemorar, pois é uma liminar para que seja fornecida água potável aos indígenas que estão passando por dificuldades devido a construção das hidrelétricas no Rio Teles Pires. Destacou como os Juízes Federais estão cada vez mais sensíveis a essas questões e compreendendo a dimensão dos impactos caudados pelos empreendimentos.
Por outro lado, manifestou preocupação com o que chamou de “privatização dos lucros e socialização dos prejuízos” no enfrentamento desses impactos socioambientais causados pelos empreendimentos hidrelétricos.
Pael lembrou que o problema da falta de água potável é causado por empreendimentos hidrelétricos, que sequer fornecem energia para os próprios indígenas afetados, que dependem de geradores abastecidos por óleo diesel, que eles mesmos têm que comprar, para tirar a água do poço. “E agora, quem terá que abastecê-los de água potável é a União, por meio da Sesai. Então, a hidrelétrica vai lucrar com o empreendimento, vai causar dano aos indígenas, mas quem vai arcar com o prejuízo é a população de uma forma geral, por meio da União. A decisão vem em muito boa hora, mas não se pode isentar a empresa da responsabilidade pelos danos causados”, concluiu.
Impactos – Há mais de uma década as comunidades denunciam as mudanças negativas no rio, que afetam a segurança alimentar e a cultura dos povos indígenas. Além da hidrelétrica de Teles Pires, outras três grandes usinas operam ao longo do rio. A UHE Sinop, UHE São Manoel e UHE Colíder passaram a operar simultaneamente com a UHE Teles Pires, a partir de 2019, ampliando ainda mais os impactos na região.
O Teles Pires é o rio mais impactado por grandes hidrelétricas na Amazônia. O agravamento dos efeitos negativos causados pelas quatro usinas que operam simultaneamente no rio é sentido de forma mais intensa pelas comunidades indígenas que vivem às margens do Teles Pires, que é um dos formadores da Bacia do Tapajós.
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