Estudo mostra que gastos na área caíram cerca de 30% entre 2019 e 2020 e que números do próximo ano são ainda piores

O Ibama, responsável pelas operações de fiscalização, teve queda nos investimentos de quase 30% nos orçamentos entre 2019 e 2021- Divulgação/Ibama

Especialistas preveem quadro caótico das políticas ambientais do País diante da redução do orçamento do Ministério do Meio Ambiente em 2020 e 2021. O tema foi debatido nesta quarta-feira (28) em reunião virtual da Frente Parlamentar Ambientalista.

O pessimismo se deve à baixa execução orçamentária deste ano e à previsão de recursos ainda menores no projeto da lei orçamentária (PLN 28/20) de 2021, que chegou ao Congresso em agosto. O consultor de orçamento da Câmara Tiago Almeida apresentou estudo que mostra a queda acentuada de recursos destinados às despesas não obrigatórias (discricionárias) do Ministério do Meio Ambiente a partir de 2016.

“Até 2019, o orçamento total do ministério, quanto às despesas discricionárias, ficava por volta de R$ 811 milhões (em 2016), R$ 814 milhões (em 2017 e 2018) e R$ 807 milhões (em 2019). A partir de 2020, teve uma abrupta redução e foi para R$ 562 milhões.”

 

Para 2021, a proposta do governo é ainda menor: R$ 534 milhões. Considerando o período entre 2019 e 2021, há recuo de 29,1% (R$ 107,3 milhões) nos recursos do Ibama e de 40,4% (R$ 120,1 milhões) no ICMBio. Ainda em relação ao orçamento do próximo ano, a assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Alessandra Cardoso, cita o volume elevado de despesas condicionadas a uma futura autorização de deputados e senadores para que o governo desrespeite a chamada “regra de ouro”, ou seja, a proibição de o Estado se endividar para arcar com despesas correntes.

“As despesas que estão condicionadas à aprovação de medidas legislativas por maioria absoluta, em função da regra de ouro, crescem muito: R$ 877 milhões. Esse é um cenário de apagar das luzes da política ambiental”, observou.

Sem fiscalização

Tudo isso se soma a uma baixa aplicação dos recursos que já estavam aprovados no orçamento deste ano, como explica a ex-presidente do Ibama Suely Araújo, atual analista do Observatório do Clima.

“No controle e fiscalização do Ibama, até o dia 21 de outubro, só foram liquidados 40% do (orçamento) autorizado. Para a fiscalização do Ibama, isso é inaceitável. Significa que não tem operação em campo.”

A preocupação é ainda maior em relação ao ICMBio, responsável pela gestão das unidades de conservação. Diretora da Rede Pró UC, Ângela Kuczach avalia que a baixa previsão orçamentária está ligada à intenção do governo promover o que chamou de “ambientalismo de mercado”.

“É muito cruel jogar na mão da iniciativa privada ou do terceiro setor a responsabilidade de cuidar do patrimônio natural do Brasil quando o governo, dia após dia, faz o serviço de desmonte de tudo que pode estruturar esse patrimônio, à mercê desse orçamento pífio, medíocre, ridículo.”

Potencial econômico

Ângela citou estudos que apontam o potencial de as unidades de conservação movimentarem R$ 168 bilhões, se bem geridas e protegidas pelo Estado. Para o diretor-executivo do Instituto Escolhas, Sérgio Leitão, o orçamento da União está sendo usado para sacramentar o desmonte da política ambiental. “É o obituário da estrutura do sistema ambiental.”

Para reverter esse quadro, Leitão citou até a estratégia de buscar recursos para o meio ambiente em outros ministérios, como os da Agricultura e de Minas e Energia, que têm certa ligação com temas ambientais.

“Para mostrar que não estamos condicionados pela agenda de apenas um ministro. Essa é uma questão de sobrevivência política do tema. Ou nós o fazemos ou ficaremos cerceados e presos a uma agenda única.”

Orçamento 2021

Mas a estratégia imediata para garantir mais recursos passa pela mobilização dos parlamentares em busca de mudanças profundas na proposta de lei orçamentária de 2021. O Inesc e outras 17 entidades apresentaram um documento em que sugerem a ampliação de recursos para as ações de combate ao desmatamento e a garantia, sem condicionamento, de pelo menos R$ 80 milhões a mais para as ações e funcionamento do ICMBio.

As emendas parlamentares ao orçamento e a futura reforma tributária também foram citadas como possíveis soluções. O coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), alertou sobre os riscos do baixo orçamento para a estrutura do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama) e para a repetição de tragédias ambientais.

“Nós estamos diante de uma crise muito grave e, por isso, estamos fazendo esse debate, porque isso precisa ser escancarado. Não dá para aceitar que a gente entre em 2021 com essa proposta de orçamento. Isso é um escândalo e precisamos ter a estrutura mínima de funcionamento do Sisnama, sob pena de a gente assistir todas as tragédias que a gente viu este ano se repetirem no ano que vem.”

O estudo de consultores da Câmara apontou que um dos poucos programas do Ministério do Meio Ambiente que apresentaram elevação de recursos na proposta orçamentária de 2021 foi “A hora do turismo”, com 37% a mais de orçamento em relação a 2020 (mas com valor – R$ 97 mil – relativamente baixo em relação aos demais programas).

Reportagem – José Carlos Oliveira
Edição – Roberto Seabra

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“O orçamento da União está sendo usado para sacramentar o desmonte da política ambiental”, informa a Agência Câmara – Instituto Escolhas