Estudo feito em área de manejo em Paragominas (Pará), ao longo de 20 anos, mostrou que algumas espécies se tornam mais raras, como o ipê, e outras mais abundantes, como a embaúba
Mesmo empregando técnicas de impacto reduzido, o manejo de florestas tropicais para extração de madeira no Brasil pode estar impactando a quantidade de algumas espécies de árvores. Algumas se tornam mais raras, como é o caso do ipê (Handroanthus spp.), que tem alto valor comercial, e outras ficam mais abundantes, como algumas espécies popularmente conhecidas como embaúba (Cecropia spp.), comuns de áreas degradadas. O resultado faz parte de um trabalho de campo realizado por pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, no município de Paragominas, estado do Pará, durante duas décadas. O manejo consiste em extrair comercialmente produtos da floresta com o mínimo de alteração em sua estrutura, para que posteriormente ela consiga se recuperar.
O estudo é importante para entender o manejo de florestas tropicais com vistas a minimizar os impactos ambientais provocados por essa atividade comercial, explica a bióloga Rafaela Naves, uma das pesquisadoras que trabalha na análise dos dados dessa pesquisa. Desde a década de 1990, o Brasil vem adotando práticas de exploração de impacto reduzido para manejo de florestas. A legislação brasileira define critérios e parâmetros técnicos para a exploração da floresta e o descumprimento dessa lei é passível de punição, informa a bióloga ao Jornal da USP.
“A pesquisa buscou compreender a organização e a manutenção da biodiversidade dessas áreas legalmente exploradas, uma vez que a Amazônia é uma importante fonte de madeira para o Brasil e comércio exterior”, relata. Um artigo sobre esse assunto, Tropical forest management altered abundances of individual tree species but not diversity, será publicado na Forest Ecology and Manangement em novembro.
Segundo o professor Edson Vidal, do Laboratório de Silvicultura Tropical, da Esalq, as indústrias madeireiras e as associações comunitárias que desejam fazer o manejo florestal precisam empregar técnicas que garantam a colheita cuidadosa das árvores. Antes de iniciar, é preciso fazer um levantamento das espécies existentes e aprovar um plano de manejo em órgão ambiental que estabelece quatro limites para controlar a intensidade da exploração.
Esses limites levam em conta o diâmetro e a altura das árvores; o volume de extração; 10% das árvores de tamanho comercial devem ser deixadas em pé para servir de matrizes; e, para proteção das espécies raras, não é permitido extrair se a densidade for inferior a três árvores de tamanho comercial por 100 hectares.
Durante vinte anos, pesquisadores sob a coordenação do professor Edson Vidal acompanharam a regeneração da floresta em duas áreas privadas (5,25 hectares, cada) permanentemente demarcadas, onde foram efetuadas coletas periódicas de dados (1994, 1998, 2000, 2006, 2009 e 2014), para avaliar os impactos decorrentes do manejo. Uma dessas áreas foi submetida ao manejo e a outra ficou intocada para controle e comparação com a área que tinha sido explorada. O trabalho teve início em 1993, considerado como ano zero e quando também ambas as áreas foram avaliadas em seu estado original.
As coletas ainda devem continuar ocorrendo, mas os dados já são utilizados para responder questões a partir de diferentes perspectivas (econômicas e biológicas). Em 2017, por exemplo, em seu doutorado, Rafaela fez um recorte e observou que embora o manejo da floresta não afetasse a distribuição das espécies arbóreas e nem sua composição, impactava a quantidade de algumas espécies na região.
Segundo a bióloga, essas constatações ficaram mais evidentes no levantamento de 2014. Comparando os dados da área que houve manejo e a área controle, as espécies mais abundantes que surgiram nesse período foram as embaúbas (Cecropia spp.), e duas árvores de menor porte com características arbustivas: a Vismia guianensis (Aubl.) Choisy e a Byrsonima aerugo Sagot. “Antes do manejo, elas não representavam nem 1% das árvores da floresta e duas décadas depois passaram a ser 19%”, diz. Rafaela diz que essas espécies são pioneiras e típicas de florestas tropicais e são comuns em clareiras e áreas degradadas, mas são ausentes ou raras em florestas primárias (mata intocada).
Com relação ao decréscimo das árvores de interesse comercial, como o ipê (Handroanthus sp.) e o jatobá (Hymenaea spp.), Rafaela disse que o estudo concluiu que essas espécies acabaram se tornando mais raras pelo fato delas serem derrubadas para captação da madeira. E como seu ciclo de vida é longo e de crescimento lento, podendo levar até cem anos para se chegar à vida adulta, o período do estudo (20 anos) não abarcou o ciclo total de vida delas, explica. Como as medidas consideravam 10 centímetros (cm) o diâmetro do tronco para coleta de dados, poucos indivíduos de espécies comerciais tiveram tempo para alcançar esse tamanho, completa.
Para a bióloga,
essa escala temporal é longa em termos de esforço de pesquisa e recursos, mas não tão longa considerando o ciclo de vida das árvores. No entanto, essa deficiência de escala temporal não impede que se conclua que o manejo de florestas tropicais tem que ser mais bem estudado porque essa atividade pode causar perturbações ambientais de longo prazo”, relata.
A pesquisa foi financiada inicialmente pela U.S. Agency for International Development e, mais recentemente, pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e Norwegian Research Council.
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Mais informações: e-mails [email protected], com Rafaela Pereira Neves, ou [email protected]
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