Aprovada em 1989, a Convenção Nº 169 sobre os Povos Indígenas e Tribais busca superar práticas discriminatórias que afetam os povos indígenas e assegurar que participem da tomada de decisões que impactam suas vidas

No Dia Internacional dos Povos Indígenas, 9 de agosto, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) relembra a Convenção Nº 169 sobre os Povos Indígenas e Tribais em tempos de COVID-19. Aprovada em 1989, a Convenção busca superar práticas discriminatórias que afetam os povos indígenas e assegurar que participem da tomada de decisões que impactam suas vidas.

Convenção Nº 169 baseia-se no respeito às culturas e aos modos de vida dos povos indígenas e reconhece os direitos deles à terra e aos recursos naturais, e a definir suas próprias prioridades para o desenvolvimento. Dessa forma, os princípios fundamentais de consulta e participação constituem a pedra angular da Convenção.

A Convenção sobre Povos Indígenas e Tribais (Nº 169) é um tratado internacional adotado pela Conferência Internacional do Trabalho da OIT em 1989. Ela representa um consenso alcançado pelos constituintes tripartites (governos, organizações de trabalhadores e de empregadores) da OIT sobre os direitos dos povos indígenas e tribais nos Estados-membros em que vivem e as responsabilidades dos governos de proteger esses direitos.

A Convenção Nº 169 trata da situação de mais de 5.000 povos indígenas, constituindo uma população de mais de 370 milhões de pessoas, que vivem em mais de 70 países em todas as regiões do mundo. Esses povos possuem diversas línguas, culturas, práticas de subsistência e sistemas de conhecimento.

Como Norma Internacional do Trabalho na forma de uma Convenção, ela é um instrumento que, para ter vigência em um Estado-membro da OIT, necessita de um ato formal por este Estado, comprometendo-se a cumprir os requerimentos estabelecidos nesta convenção. No caso do Brasil, este ato formal de ratificação foi registrado em 25 de julho de 2002, seguindo a decisão do Congresso Nacional do Decreto Legislativo número 143, de 20 de julho de 2002.

Processo de aprovação

Desenvolvida em um processo de duas leituras nas Conferências Internacionais do Trabalho realizadas em 1988 e 1989, a Convenção 169 foi adotada pela Conferência Internacional do Trabalho, ocorrida em Genebra, em junho de 1989.

A Convenção Nº 169 não é o primeiro instrumento da OIT tratando de questões relacionados a povos indígenas e tribais. Já em 1957, a Conferência tinha adotado a Convenção Sobre os Povos Indígenas e Tribais de 1957. No entanto, em 1986, um comitê de especialistas convocado pela OIT concluiu que “a abordagem integracionista da Convenção (de 1957) era obsoleta e que sua aplicação era prejudicial no mundo moderno”.

Desde sua adoção em junho de 1989, 23 países ratificaram a Convenção Nº 169. Destes 15 países são latino-americanos: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Dominica, Equador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Paraguai, Peru e Venezuela.

A Convenção Nº 169 é o único tratado no sistema multilateral aberto à ratificação que trata de forma específica e abrangente dos direitos dos povos indígenas e tribais. A ratificação requer dos Estados-membros, que ratificaram a Convenção, se assegurarem que as leis e práticas nestes Estados estejam em concordância com todos os requerimentos da Convenção. Além destes efeitos para os Estados ratificantes, a Convenção também incentivou vários outros países a adotar leis, políticas, instituições ou programas para tratar dos direitos e bem-estar dos povos indígenas e tribais em todo o mundo.

Quando a Conferência Internacional do Trabalho em 1989 adotou a Convenção, estava ciente do fato de que as histórias dos povos indígenas foram marcadas por discriminação, marginalização, etnocídio ou genocídio. Dessa forma, a Convenção Nº 169 reafirma que os povos indígenas e tribais têm direito aos mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que todos os outros seres humanos. Ao mesmo tempo, isso implica também que os costumes indígenas não podem ser justificados, se violarem os direitos humanos universais.

A Convenção Nº 169 prevê, portanto, medidas especiais para garantir uma igualdade efetiva entre os povos indígenas e todos os outros setores da sociedade. No entanto, a exigência de medidas especiais não significa que a Convenção exija que os povos indígenas recebam privilégios especiais em relação ao restante da população.

A importância da Convenção Nº 169 em tempos de pandemia

No mundo inteiro continuam a existir desafios para uma implementação completa da Convenção Nº 169. Esse é um tema de grande importância para a OIT, que tem como uma de suas funções, não somente a supervisão da aplicação de convenções ratificadas, mas também a obrigação de assistir os Estados-membros a encontrarem possibilidades para aprimorar a aplicação da norma.

Até hoje, os povos indígenas e tribais, onde quer que vivam, estão entre os mais pobres, enfrentando exclusão e marginalização. No mundo inteiro, os povos indígenas enfrentam barreiras e desvantagens no mercado de trabalho, pois, comumente, têm acesso limitado à educação e à formação profissional e seus conhecimentos e suas habilidades tradicionais não são necessariamente valorizados ou demandados. Frequentemente, os povos indígenas também enfrentam discriminação contra seus meios de subsistência tradicionais.

Esse conjunto de diferentes vulnerabilidades socioeconômicas, de saúde e ambientais existentes antes da pandemia foi posto em evidência pela crise da COVID-19, cujos impactos se traduzem em consequências particularmente graves para 55 milhões de mulheres e homens indígenas que vivem na América Latina e no Caribe, de acordo com uma análise da OIT divulgada em junho passado.

Com relação ao impacto sobre o emprego, dezenas de milhões de mulheres e homens indígenas também trabalham em setores particularmente afetados pela crise causada pela COVID-19, de serviços, incluindo o trabalho doméstico, hospitalidade e turismo, até comércio, transporte, manufatura e construção. Como a perda de renda afeta os(as) trabalhadores(as) em geral, suas consequências são especialmente graves para homens e mulheres indígenas, pois são mais propensos a trabalharem em condições de informalidade.

A Convenção Nº 169 compreende uma seção completa sobre o direito dos povos indígenas ao emprego, treinamento vocacional e proteção de seus direitos trabalhistas. Além disso, a OIT e seus constituintes estão abordando cada vez mais a situação dos povos indígenas e tribais por meio das convenções fundamentais sobre trabalho, que tratam da não-discriminação; da liberdade de trabalho forçado e de trabalho infantil; e da liberdade sindical e direito à negociação coletiva.

Direito de consulta e de participação

O direito de consulta e de participação na tomada de decisões constitui a pedra angular da Convenção Nº 169 e é a base para a aplicação do conjunto mais amplo de direitos consagrados na Convenção. A consulta e a participação são objetivos importantes em si mesmos, mas também são os meios pelos quais os povos indígenas podem participar das decisões que os afetam.

Consulta e participação não são direitos exclusivamente atribuídos aos povos indígenas. A consulta é um princípio fundamental que pode ser encontrado em todas as outras convenções da OIT, que determinam consultas entre governos, organizações de empregadores e de trabalhadores, bem como aquelas especificamente relacionadas a uma determinada convenção. O requisito geral de consultar os povos indígenas está refletido no artigo 6 (1) da Convenção Nº 169.

Assim, a consulta aos povos indígenas surge como uma obrigação geral nos termos da Convenção Nº 169, sempre que medidas legislativas ou administrativas as afetem diretamente. Tais medidas podem, por exemplo, dizer respeito à elaboração de legislação nacional referente a consultas ou à construção de infraestrutura viária nas terras de uma comunidade indígena específica.

Além disso, a Convenção Nº 169 enfatiza particularmente a necessidade de consultar sob certas circunstâncias, inclusive antes da exploração dos recursos da superfície e antes de uma possível realocação e alienação de terras. A principal área de aplicação dos conceitos de consulta e participação está no contexto das relações entre os povos indígenas e os Estados.

Por fim, a consulta e a participação são princípios fundamentais da governança democrática e do desenvolvimento inclusivo. No Dia Internacional dos Povos Indígenas, celebrado em 9 de agosto, a OIT recorda que os povos indígenas e tribais são parceiros fundamentais para assegurar a construção de um “normal melhor”, que respeite seus direitos e garante o seu acesso a um trabalho decente.

ONU Brasil 

PUBLICADO EM:      JORNAL DA CIÊNCIA