Liminar pedida pelo MPF foi deferida parcialmente, assegurando proteção para terras indígenas que já tenham sido delimitadas
A Justiça Federal em Altamira concedeu liminar parcial em ação do Ministério Público Federal (MPF) suspendendo os efeitos da instrução normativa n.9/2020 da Fundação Nacional do Índio (Funai), que liberou a grilagem em terras indígenas não homologadas pelo governo brasileiro. Com a decisão, as terras indígenas ainda não homologadas na região abrangida pela subseção judiciária de Altamira voltam a integrar o Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) e o Sistema de Cadastro Ambiental Rural (Sicar) e ficam impedidos registros de propriedades rurais dentro dos seus limites.
Pela decisão, terras indígenas ainda em processo de demarcação devem ser mantidas no sistema a partir do momento em que são delimitadas, o que exclui aquelas em que não tenha ocorrido a declaração de limites por parte do governo federal. O MPF havia pedido que todas as terras indígenas na região de Altamira, mesmo as que ainda estejam no início do processo administrativo demarcatório, fossem protegidas.
Para a Justiça Federal, ao permitir que particulares recebessem declarações de propriedade sobre áreas já caracterizadas como terras indígenas, a instrução normativa no. 09 cria situação de insegurança jurídica para os particulares, “gerando expectativa de direito (…) que tende a ser totalmente solapada pela posterior homologação da terra indígena, porquanto a Constituição prevê a nulidade de quaisquer atos relativos à posse, domínio e ocupação”.
A decisão judicial afirma ainda que a insegurança jurídica gerada pela Instrução Normativa da Funai é tal que deve “potencializar os conflitos fundiários sobre as terras indígenas em processo de demarcação com limites traçados, aumentando a situação de vulnerabilidade destas populações.”
“Ainda sobre a vulnerabilidade, não se olvida que a atual pandemia pode afetar dramaticamente as comunidades indígenas, cujo contágio pela Covid-19 pode ocorrer em decorrência da pressão demográfica sobre as terras indígenas, com o contato desprotegido com terceiros. Diante deste contexto, utilizar como parâmetro para expedição de declarações aos particulares somente terras indígenas homologadas, reservas indígenas ou terras de domínio indígena, excluindo deste filtro aquelas cujos procedimentos estão em curso (sendo notória a complexidade de tais processos), é medida que coloca em risco todos os valores até aqui elencados”, diz a liminar.
A ação judicial de Altamira é uma das oito iniciadas pelo MPF em junho para suspender os efeitos da instrução normativa. Além da Funai, o Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) também é réu nas ações do MPF. As ações judiciais pediram, em regime de urgência, que a Justiça obrigasse a Funai e o Incra a manterem ou incluírem no Sigef e no Sicar, além das terras indígenas homologadas, terras dominiais plenamente regularizadas, reservas indígenas e também todas as terras em processo de demarcação nas seguintes situações: área formalmente reivindicada por grupos indígenas; área em estudo de identificação e delimitação; terra indígena delimitada (com os limites aprovados pela Funai); terra indígena declarada (com os limites estabelecidos pela portaria declaratória do Ministro da Justiça); e terra indígena com portaria de restrição de uso para localização e proteção de índios isolados.
Pela instrução normativa da Funai, todas essas terras indígenas seriam ocultadas no Sigef, “permitindo que particulares obtenham declarações, realizem negócios jurídicos (sem qualquer menção à natureza da área e a sobreposição com terras indígenas) e coloquem em risco indígenas e o meio ambiente”, narra o MPF nas ações judiciais. Para os procuradores da República que atuam nos municípios de Santarém, Redenção, Altamira, Itaituba, Marabá, Tucuruí, Belém e Castanhal, se a portaria não for suspensa com urgência, haverá aumento dos conflitos fundiários e do risco de disseminação da covid-19 entre os indígenas.
O MPF, assim que houve a publicação da IN 09/2020, encaminhou uma recomendação à presidência da Funai para que a normativa fosse anulada e, ao Incra, para que não a cumprisse. A recomendação, assinada por 49 procuradores e procuradoras da República de 23 estados da federação, não foi cumprida pela Funai. Diante do descumprimento da recomendação, o MPF teve que acionar a Justiça Federal.
Íntegra da liminar
Números dos processos:
1001942-03.2020.4.01.3907 – Tucuruí
1001635-55.2020.4.01.3905 – Redenção
1002109-38.2020.4.01.3901 – Marabá
1004106-53.2020.4.01.3902 – Santarém
1000826-56.2020.4.01.3908 – Itaituba
1002093-78.2020.4.01.3903 – Altamira
1014155-62.2020.4.01.3900 – Belém
1002552-77.2020.4.01.3904 – Castanhal
Ministério Público Federal no Pará
Assessoria de Comunicação
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