A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) apoia um hospital de campanha em Boa Vista, Roraima, construído pela Operação Acolhida – resposta governamental ao fluxo de refugiados e migrantes venezuelanos no Brasil – que tem capacidade para receber até 1.782 pacientes confirmados ou suspeitos da COVID-19. Até o momento, o hospital atendeu 625 venezuelanos e muitos brasileiros, incluindo indígenas.

Dialisa Mata, indígena Warao de 25 anos e mãe de três filhos, se recuperou da COVID-19 no hospital de campanha em Boa Vista. Foto: Allana Ferreira/ACNUR

O ACNUR está ciente de pelo menos 19 mortes relacionadas à COVID-19 entre refugiados, dos quais nove eram venezuelanos indígenas, e mais de 570 pessoas se recuperaram da doença. Conheça a história da indígena venezuelana, Dialisa Mata, que se recuperou da COVID-19 neste hospital em Boa Vista.

Quando seu teste para COVID-19 voltou positivo, Dialisa Mata não conseguiu conter as lágrimas. Ela ouvira o quão perigoso o vírus poderia ser e, como uma mulher indígena cujo povo foi duramente atingido por doenças infecciosas por séculos, Dialisa estava particularmente angustiada.

“Pensei que ia morrer”, disse ela, que tem 25 anos e três filhos. Vivendo com a família em um abrigo no norte do Brasil, ela apresentou sintomas típicos da COVID-19, como falta de ar extrema e fadiga. “Comecei a pensar na minha família, meus filhos… O que aconteceria com eles? O que aconteceria comigo?”

“Comecei a chorar muito, porque tinha tanto medo”, disse ela, acrescentando que também se preocupava com a possibilidade de transmitir a doença para outras pessoas no abrigo onde ela e sua família vivem desde que foram forçados a deixar a Venezuela, em 2018.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 70 mil casos da COVID-19 e mais de 2 mil mortes pela doença foram relatados no início de julho entre a população indígena do mundo, e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) divulgou que há aproximadamente oito mil casos da COVID-19 e 177 mortes entre os povos indígenas que vivem no Brasil.

Para salvar vidas, a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), apoia um hospital de campanha em Boa Vista, capital do estado de Roraima, na fronteira norte. Construído pela Operação Acolhida (resposta governamental ao fluxo de refugiados e migrantes venezuelanos no Brasil), o hospital tem capacidade para tratar e isolar até 1.782 pacientes confirmados e suspeitos da COVID-19. Até o momento, 625 venezuelanos e muitos brasileiros – incluindo indígenas – receberam atendimento no hospital.

O ACNUR está ciente de pelo menos 19 mortes relacionadas à COVID-19 entre refugiados, dos quais nove eram venezuelanos indígenas. Mas, graças aos cuidados oportunos que recebeu nas instalações, a Dialisa estava entre as mais de 570 pessoas que se recuperaram. Felizmente, seus familiares, que estavam em quarentena no hospital, escaparam da infecção.

Para os povos indígenas, a COVID-19 é o capítulo mais recente da longa série de dificuldades que remonta ao período colonial, quando as populações originárias das Américas foram dizimadas por doenças como sarampo e gripe comum.

Nos últimos anos, à medida que a crise da Venezuela se aprofundava, milhares de Warao se juntaram aos cerca de cinco milhões de refugiados e migrantes venezuelanos que foram forçados a deixar seu país por causa da escassez generalizada de alimentos e medicamentos, inflação galopante e insegurança. Estima-se que 3,3 mil Warao buscaram segurança no país vizinho, juntamente com quase 1,7 mil outros indígenas venezuelanos, de grupos étnicos como Pemon, E’ñepa e Kariña.

Muitos vieram por conta das dificuldades econômicas para viver em bairros populosos ou mesmo nas ruas, onde medidas de prevenção ao novo coronavírus, como lavar as mãos e manter a distância social, são bem difíceis. Também viram sua renda despencar em meio ao isolamento social imposto pela COVID-19, e muitos que vivem em acomodações alugadas temem serem despejados.

A escassez e a crescente insegurança finalmente levaram Dialisa e sua família a abandonar sua pequena e outrora pacífica vila na região norte de Monagas.

“Os mercados começaram a fechar e não havia mais nada para comer”, lembrou. “Quando as pessoas começaram a ficar com mais fome, muitos roubos começaram a acontecer e a comunidade não estava tão segura quanto costumava ser”.

Em 2018, sua família vendeu seus pertences para pagar a viagem ao Brasil, juntamente com várias outras famílias Warao. Eles chegaram a Boa Vista e conseguiram segurança em um dos abrigos da Operação Acolhida, gerenciados pelo ACNUR e seus parceiros.

Mais da metade dos refugiados e migrantes indígenas no Brasil recebeu algum tipo de apoio do ACNUR, incluindo itens básicos, abrigo e acesso a serviços de saúde – uma ajuda fundamental em contexto de pandemia.

Para o representante do ACNUR no Brasil, José Egas, a saúde é uma das principais prioridades na assistência humanitária às comunidades indígenas. “É uma das maneiras pelas quais o ACNUR está trabalhando em conjunto com a Operação Acolhida do governo brasileiro, que oferece assistência com a recepção e integração local de refugiados e migrantes venezuelanos e é reconhecida como um exemplo a ser seguido por outros países da região”.

Enquanto Dialisa se recupera completamente, ela se preocupa todos os dias com o que a pandemia pode fazer para sua mãe, que ainda está na Venezuela.

“Eu sempre ligo para checar, e ela sempre me diz para ficar aqui com minha família porque lá está muito difícil”, disse Dialisa.

PUBLICADO EM:    ONU NAÇÕES UNIDAS