Negados recursos da União e da Funai. A nomeação depende de consulta prévia à comunidade indígena interessada

Arte sobre fundo coberto de folhagens verdes. Do lado direito uma mão segura uma folha vermelha. Em branco está escrito Direitos Indígenas

Arte: Ascom/ PRAC

Em decisão, nessa terça-feira (14), o Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF1) manteve a suspensão da nomeação de Adalberto Rodrigues Raposo para o cargo de Coordenador Regional do Xingu da Fundação Nacional do Índio (Funai), em Canarana, no Mato Grosso. A decisão segue entendimento do Ministério Público Federal (MPF), que apontou irregularidades na nomeação, entre outras razões, pela falta de consulta prévia à comunidade indígena interessada. Lideranças dos povos da região do Xingu se manifestaram contrários à mudança de gestão, em especial no contexto de combate ao avanço da epidemia de covid-19 entre os indígenas.

A determinação do Tribunal, a pedido do MPF, negou recursos apresentados pela União e pela Funai e manteve a decisão da primeira instância, que suspendeu os efeitos de portarias do Exército e do Ministério da Justiça e Segurança Pública, por meio das quais Adalberto Raposo foi nomeado para o cargo.

A União e a Funai alegavam, entre outros argumentos, que a nomeação de coordenadores regionais da Funai, por si só, não seria suscetível de afetar diretamente os indígenas, não havendo, portanto, desrespeito ao art. 6º da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que versa sobre a necessidade de consulta prévia, livre e informada dos povos interessados cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente.

Para o desembargador federal Jirair Aram Meguerian, relator do processo, a nomeação para o cargo de Coordenador Regional do Xingu enseja a obrigatoriedade de consulta aos indígenas, “na medida em que possui atribuição de elaboração de políticas públicas e implementação das medidas que se fizerem necessárias à promoção e proteção social dos povos indígenas”.

Para o MPF, o desrespeito ao dever estatal de consulta prévia poderia causar lesão grave e de difícil reparação. “Assegurar o direito à consulta prévia aos povos indígenas é prova de maturidade em uma sociedade democrática e o TRF1 soube fazer este direito prevalecer”, comentou o procurador regional da República Ubiratan Cazetta.

Em suas contrarrazões, o procurador da República Ricardo Pael Ardenghi apontou para uma interpretação equivocada das recorrentes quanto ao art. 37, II, da CF (investidura de cargos de livre nomeação e exoneração) em face do que preconiza a Convenção n. 169 da OIT. Para o órgão ministerial, seria admitir que toda uma jurisprudência sobre o dever estatal de consulta prévia, livre e informada estaria errada ou, por outro lado, que o ato de nomeação em questão possuiria uma “imunidade” ao dever de consulta.

Para evidenciar a ingerência do ocupante do cargo na execução de políticas públicas, o MPF fez referência à postura do novo coordenador, diametralmente oposta ao anterior, no que diz respeito à pesca no interior da Terra Indígena Pequizal de Naruvôtu. Conforme evidenciado nos autos originais, essa mudança de postura ocorre em um momento em que a presença de não-índios no interior de Terras Indígenas é contrária às medidas de combate ao avanço da epidemia de covid-19.

Nesse sentido, foram juntados aos autos, manifestações de lideranças do Xingu, contrárias à mudança de gestão na coordenação regional da Funai. Para os representantes dos povos indígenas do Xingu, o sucesso das estratégias de enfrentamento da covid-19, depende da experiência dos gestores públicos sobre as especificidades da região e de uma intensa articulação entre parceiros institucionais e as organizações indígenas do Xingu. A região abriga 16 povos indígenas, mais de 105 aldeias e uma população de 7,5 mil pessoas.

Além de suspensa a nomeação, conforme a decisão inicial, a União e a Funai devem se abster de realizar nova nomeação para a Coordenação Regional do Xingu, sem a realização de processo de consulta prévia, livre e informada com as comunidades indígenas atendidas pela Funai, na respectiva circunscrição, sob pena de multa no valor de R$ 10 mil, por dia de descumprimento.

Acesse a decisão.

ACP 1007473-21.2020.4.01.3600

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