Se vocês do “Governo” anunciam para toda a sociedade que vivemos em um estado democrático, não podem impor um único modelo de desenvolvimento, afirma a CARTA FINAL DOS POVOS INDÍGENAS DA RAPOSA SERRA DO SOL.
Com o tema: Vigilância e Monitoramento do Território Indígena, “Anna Pata, Anna Yan, que na língua macuxi significa “Nossa Terra, Nossa Mãe”, Povos Macuxi, Wapichana, Sapará e Taurepang realizaram a IV Assembléia Geral dos povos da T.I Raposa Serra do Sol, nos dias 17 a 20 de fevereiro de 2020, na comunidade Camará, região Baixo Cotingo, Município de Normandia.
No documento, as lideranças denunciaram a invasão da T.I por parte de garimpeiros e cada vez os problemas se agravam trazendo sérias conseqüências ao meio ambiente e as comunidades.
“Denunciamos o garimpo ilegal nas proximidades da comunidade Raposa II na região da Raposa, em outras áreas da T.I Raposa Serra do Sol: Wixi, Araçá da Serra, Mari Mari, Rio Kinor, Rio Maú, Mero, Mato Grosso, Mutum, Água Fria, Caju, Serra Verde, Flexal, Mina Seca, Rio Cotingo”.
As lideranças também criticaram postura do Governo por insistir em impor um único modelo de desenvolvimento aos povos indígenas.
“Nós, povos originários, queremos sim desenvolvimento, mas sem deixar ninguém para trás. O que vocês governantes querem é que os indígenas virem peões e mão de obra barata de suas fazendas e das empresas mineradoras; se vocês anunciam para toda a sociedade que vivemos em um estado democrático, não podem impor um único modelo de desenvolvimento, mas sim, proteger e fazer respeitar o nosso plano de vida como assegurado na Carta Maior”, afirmam.
As lideranças reafirmaram apoio a Deputada Federal Joenia Wapichana, “É a nossa voz na casa do povo e nos representa. Reconhecemos o trabalho dela no Congresso Nacional em prol dos direitos coletivos dos povos indígenas que vem desenvolvendo nesses primeiros anos de mandato”.
É finalizam a Carta exigindo que o Governo respeite a decisão da maioria das comunidades da Raposa Serra do Sol.
CARTA DOS POVOS INDÍGENAS DA RAPOSA SERRA DO SOL
Nós Tuxauas, coordenadores regionais, vaqueiros, agentes indígenas de saúde, professores, mulheres, jovens, pajés, conselheiros, operadores de direitos, agente de proteção territorial das (97) comunidades indígenas, dos povos Wapichana, Macuxi, Sapará, Taurepang, reunidos em nossa IV Assembleia da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, com o tema: “ Vigilância e Monitoramento do Nosso Território Indígena” , nos dias 17 a 20 de fevereiro, no Centro Regional Camará, Baixo Cotingo, TI Raposa Serra do Sol, chamamos atenção da grave agressão aos nossos direitos territoriais, garantidos pela Constituição Federal Brasileira de 1988 e reafirmados em tratados Internacionais de Direitos Humanos, em especial na Convenção 169 da OIT e na Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos indígenas:
1. Nossa Assembleia homenageou e lembrou das lideranças tradicionais que se foram, tuxauas: Viriato, Melquior, Odilon Malheiro, Raimundo Segundo, Bernaldo, Artur Laurentino Amambaru, Damazio Galé, Lino, Duarte, André, Lauro, Bento, Raimundo Alves, Afonso do Morro, Pedro, Geraldo, Maçaranduba, Mauro da Pedra Preta, Marcelino de Almeida e Tuxaua Gabriel Raposo, que iniciaram na década 60 a luta pela liberdade e demarcação da Raposa Serra do Sol, hoje demarcada e homologada. Também prestamos nossas homenagens aos líderes que estão em nosso meio, Tuxaua Jacir Macuxi, Nelino Galé, Agostinho, Tuxaua Orlando, Valdir Tobias, Clóvis Ambrósio e tantas outras lideranças entre homens e mulheres;
2. Refletimos sobre nossa caminhada para conquista da Raposa Serra do Sol e de outros direitos coletivos. Foram décadas de opressão, de invasão, violência às nossas comunidades. Hoje estamos livres, trabalhando em nossas roças, temos escolas e postos de saúde; nossos filhos foram formados e capacitados, além de várias atividades coletivas consolidadas. Não estamos parados: elaboramos nosso Plano de Gestão que é nosso Plano de Vida. Mas o cenário que se implantou neste País chamado Brasil tem nos preocupado, lembrando-nos dos tempos difíceis;
3. Declaramos que o projeto de gado “uma vaca para o índio” completou 40 anos no ano de 2020. É o único projeto pensado por nós e que foi importante para retomada de nosso território tradicional.
4. Manifestamos nosso apoio a Deputada Federal JOENIA WAPICHANA, que é nossa parente e tem nossa confiança. É a nossa voz na casa do povo e nos representa. Reconhecemos o trabalho dela no Congresso Nacional em prol dos direitos coletivos dos povos indígenas que vem desenvolvendo nesses primeiros anos de mandato.
5. Todo dia o governo brasileiro fala em desenvolvimento para os povos indígenas. Nós, povos originários, queremos sim desenvolvimento, mas sem deixar ninguém para trás. O que vocês governantes querem é que os indígenas virem peões e mão de obra barata de suas fazendas e das empresas mineradoras; se vocês anunciam para toda a sociedade que vivemos em um estado democrático, não podem impor um único modelo de desenvolvimento, mas sim, proteger e fazer respeitar o nosso plano de vida como assegurado na Carta Maior;
6. Externamos o nosso mais veemente repúdio contra as ações e omissão do Governo Federal sobre as questões ambientais, pois suas medidas e inércia só vem causando o aumento do desmatamento da Amazônia e pressão sobre as terras indígenas. Além disso, manifestamos a nossa preocupação com o aumento das invasões, e por isso nos solidarizamos com nossos irmãos Yanomamis e Yekuana que estão sendo ameaçados com a entrada de centenas de garimpeiros na T.I Yanomami;
7. Estamos preocupados com o aparelhamento e utilização dos órgãos como a FUNAI e SESAI pelo governo para colocar em prática seu plano de colonização, ideologia e implantar seu regime autoritário em nossas comunidades. O que estamos vendo é que o governo tenta cooptar nossos parentes dando empregos provisórios nesses órgãos apenas com intuito de causar divisão. FUNAI E SESAI não é do governo, é nossa!
8. Estamos construindo nosso protocolo de consulta como mecanismo de defesa de nossos direitos, tal como firma a Convenção 169 da OIT que o estado brasileiro se comprometeu cumprir e respeitar. O estado não pode continuar ignorando nossos planos e decidindo sobre nossas vidas.
9. Continuamos repudiando a política do governo brasileiro em querer tornar o país rico e desenvolvido a custo de sangue indígena e da exploração das terras indígenas. Por isso somos contra a construção da hidrelétrica na cachoeira do Tamanduá no rio Cotingo e outras cachoeiras, na Raposa Serra do Sol, porque isso só causará morte e destruição na nossa casa; temos o nosso projeto “CRUVIANA” sobre a geração de energia eólica, que é um modelo de geração de energia limpa e menos poluente;
10. Denunciamos o garimpo ilegal nas proximidades da comunidade Raposa II na região da Raposa, em outras áreas da T.I Raposa Serra do Sol: Wixi, Araçá da Serra, Mari Mari, Rio Kinor, Rio Maú, Mero, Mato Grosso, Mutum, Água Fria, Caju, Serra Verde, Flexal, Mina Seca, Rio Cotingo e em outros locais. Essas atividades criminosas estão causando graves problemas, como a entrada de pessoas estranhas, poluição de rios e igarapés e tráfego de veículos. Por isso decidimos ser contrário ao garimpo ou qualquer atividade exploração mineral na T.I Raposa Serra do Sol. E reforçamos mais uma vez que essa atividade não tem nenhum amparo legal no ordenamento jurídico brasileiro. Solicitamos o fechamento imediato destas atividades.
11. Que a FUNAI põe placas de identificação da Terra indígena e de proibição de garimpo nos locais acima citados.
12. Repudiamos a tentativa de arrendamentos e implantação do agronegócio, exploração mineral e hidrelétricas nas nossas terras indígenas, através do PL 191/2020. Essa Proposta visa apenas atender interesses de grandes empresários e do capital. Não precisamos de Lei para dizer como devemos produzir ou trabalhar em nossas terras. Se o Governo quer nos apoiar que respeite nosso Plano de Gestão Territorial e Ambiental – PGTA e o Protocolo de Consulta. Não é o governo que vai dizer o que é bom para nós, porque somos nós que sabemos que tipo de desenvolvimento que queremos.
13. O Governo deve respeitar a decisão da maioria das comunidades da Raposa Serra do Sol. Os indígenas que foram falar com o Presidente da República não falaram em nosso nome. Toda decisão é tomada em nossa Assembleia Geral da Raposa Serra do Sol.
Reivindicamos
a. Que o MPF, PF, IBAMA, Exército fechem o garimpo ilegal na Serra do Atola e outros que estão sendo instalados na Raposa Serra do Sol, e façam investigação para identificar os responsáveis dos maquinários, veículos e moinhos, e posteriormente serem punidos conforme a Lei.
b. Que o Presidente da Câmara Federal, Excelentíssimo Sr. Rodrigo Maia, devolva ou arquive o PL 191/2020. Esse PL levará a extinção de centenas de povos e causará retrocesso de nossos direitos;
c. Que seja respeitada a nossa organização social, especialmente o Regimento da T.I Raposa Serra do Sol e Protocolo de Consulta, porque são documentos que estão sendo construído pela maioria das comunidades indígenas;
d. Que o Governo Federal, Estadual e Municipal respeitem a decisão da maioria das comunidades da T.I Raposa Serra do Sol;
e. Que a pavimentação da BR 401 e qualquer Rodovia na T.I RSS seja feito de acordo com o protocolo de consulta, ouvidas as comunidades de forma previa, livre, de boa fé e culturalmente adequada;
f. Que o MPF e FUNAI intime as prefeituras de Normandia, Pacaraima, Uiramutã e Roraima Energia para explicarem sobre a cobrança da taxa de iluminação pública que as comunidade estão pagando;
g. Que O DNIT faça as sinalizações das BRs e RRs para coibir o trafego em alta velocidade de veículos evitando acidentes.
h. Que o Exército, FUNAI e Policia Federal façam fiscalização permanente nas rodovias, BRs e nas fronteiras em parceria com os agentes de proteção territorial (GPVIT) das regiões para coibir a entrada de pescadores, pessoas não autorizadas, turistas, traficantes e qualquer atividades ilícitas na Raposa Serra do Sol;
i. Que as Prefeituras de Normandia, Pacaraima, Uiramutã apliquem a emenda Parlamentar destinada pela Deputada Federal Joenia Wapichana conforme os planos das regiões e das comunidades;
j. Que o governo do estado de Roraima respeite o calendário específico e diferenciado das escolas indígenas conforme a realidade das comunidades indígenas, e que o PP inclua a história da Raposa Serra do Sol (identidade é essencial na construção de uma educação diferenciada); repudiamos a militarização das escolas indígenas; e solicitamos que o transporte escolar cumpra as normas de segurança, como a proibição de se transportar alunos na carroceria, e aumentar a frota de veículo para atender a demanda e as comunidades não atendidas.
k. Que os órgãos competentes retirem imediatamente os invasores indenizados e não indenizados de dentro da T. I. Raposa Serra do Sol (região da Raposa, Surumu e Serras).
l. Que a PF, FUNAI, MPF façam investigações de comércios dentro das comunidades indígenas: Placa, Contão, Raposa I, agua fria, Barro, Taxi II, Mutum, Cauê e Mato Grosso).
Diante de tudo que foi relatado, pedimos que o estado brasileiro cumpra com seu papel na proteção, promoção e defesa dos direitos dos povos indígenas de acordo com a constituição federal, as leis do país e os tratados e convenções internacionais.
Centro Regional Camará, T.I.R.S.S, 20 de Fevereiro de 2020
ABAIXO ASSINAMOS
FONTE: CIR – Conselho Indígena de Roraima – Povos indígenas divulgam carta contra o garimpo em T.I Raposa Serra do Sol – CIR – Conselho Indígena de Roraima
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