Yaripo. É assim que os Yanomami chamam o ponto mais alto do Brasil, o Pico da Neblina, que será aberto a turistas pela primeira vez desde 2003. A carta de anuência, que aprova o Plano de Visitação protagonizado pelos Yanomami da região de Maturacá (AM), foi assinada na última segunda-feira (30) pelo presidente Marcelo Xavier. O documento representa mais uma conquista indígena.

Yanomami Marcos Amend

Indígenas e servidores compartilham da conquista, resultado de cinco anos de trabalho intenso. Foto: Marcos Amend

A iniciativa é dos próprios Yanomami que primaram por uma atividade que promovesse a qualidade de vida das comunidades de maneira sustentável e respeitosa ao meio ambiente e à terra a qual pertencem. A conservação da sociobiodiversidade, combate a atividades ilegais na região e a proteção da fronteira brasileira são alguns dos vários pontos positivos do turismo gerido pelos Yanomami.

Serão beneficiados mais de 2,9 mil indígenas das seis comunidades envolvidas, de acordo com a Associação Yanomami do Rio Caruarus e Afluentes (AYRCA), proponente do projeto ao lado da Associação de Mulheres Indígenas Kumirayoma.

Floriza da Cruz Pinto, indígena Yanomami representante da Kumirayoma, destaca a participação feminina no processo de construção do projeto. “A ideia é mostrar o conhecimento das mulheres Yanomami para os napa, como nós chamamos os brancos. Apresentar a importância da floresta, da cultura e da tradição. Foi uma conquista das mulheres participar desse projeto. A assinatura da carta significa uma conquista de todos também: homens, mulheres e jovens”, pontua Floriza.

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Mulheres da aldeia Maturacá. Foto: Marcos Amend

“Anos de trabalho de indígenas e servidores agora poderão render os devidos frutos. A assinatura dessa carta em minha gestão é muito significativa. É, de fato, uma época em que os povos indígenas podem escolher as atividades que desejam promover em sua terra e nós respeitaremos e apoiaremos isso”, comentou o presidente Marcelo Xavier.

Com validade de dois anos, a carta de anuência define que as atividades turísticas acontecerão estritamente na localidade permitida pelos indígenas, que os turistas deverão ser certificados de que se trata de comunidade indígena de recente contato e de que a trilha envolve riscos por ser área de difícil acesso.

Agora, o próximo passo das associações Yanomami proponentes é formalizar o contrato com parceiros e operadoras de turismo de sua escolha. De acordo com o Plano de Visitação, cada expedição contará com o número máximo de dez visitantes que devem ter um bom preparo físico para encarar os oito dias de caminhada com considerável variação de altitude, de 95 a 2.995 metros. Os valores variam por número de pessoas no grupo, refeições e período de seca ou cheia.  

Processo

Marcos Amend

Foto: Marcos Amend

Região sagrada para os Yanomami, onde vivem os hekurapë, espíritos auxiliares dos Xamã, a visitação ao Yaripo tornou-se proibida desde 2003 devido a uma recomendação do Ministério Público Federal, que considerou que a atividade causava impactos ambientais decorrentes do turismo desordenado realizado por não indígenas e agências externas além de violar os direitos dos Yanomami.

Oficinas, cursos e muito diálogo foram fundamentais para a construção e aprovação do projeto encabeçado pela AYRCA e Kumirayoma e apoiado pela Funai, Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), Exército Brasileiro, Prefeitura Municipal de São Gabriel da Cachoeira e Instituto Socioambiental. Durante o processo, outros apoiadores da sociedade civil se juntaram à ideia.

Foram cinco anos de tratativas desde o primeiro encontro entre as comunidades indígenas para começar a construir o plano de visitação até assinatura da carta de anuência. Interessados em oferecer um serviço de segurança, qualidade e respeito à natureza, os Yanomami primaram pela capacitação e fizeram diversos cursos como primeiros socorros e resgate em áreas remotas, trilhas sustentáveis, Educação Ambiental voltada para os cuidados com o lixo e outros.

O ecoturismo no Yaripo faz parte do Plano de Gestão Ambiental e Territorial (PGTA) Yanomami e Ye’kuana, entregues ao governo brasileiro pelos indígenas em julho deste ano.

No âmbito da Funai, o trabalho é resultado do esforço conjunto das Coordenações-Gerais de Etnodesenvolvimento (CGETNO), de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC), de Gestão Ambiental (CGGAM), da Coordenação Regional do Rio Negro e da Frente de Proteção Etnoambiental Yanomami.

Kézia Abiorana
Assessoria de Comunicação/Funai