Um dos principais climatologistas do país, o pesquisador da USP é um dos 12 convidados especiais para fazer um pronunciamento hoje, na reunião convocada pelo papa Francisco para discutir o futuro da Amazônia.

Assim como ocorreu na elaboração de sua encíclica Laudato si’, o papa Francisco voltou a recorrer à ciência para entender os riscos atuais à Amazônia. No sínodo que começa hoje, pesquisadores brasileiros e estrangeiros estarão lá, entre religiosos, para ajudar a elaborar o texto final que vai sair do encontro. Com o tema Amazônia: Novos Caminhos para a Igreja e para uma Ecologia Integral, o sínodo deve trazer um posicionamento forte contra a destruição da floresta, mas também pode sugerir soluções com base no melhor conhecimento científico.

Um dos principais climatologistas do País, Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP), está no grupo de 12 convidados especiais que terão direito a fazer um pronunciamento de quatro minutos, na abertura. “O sínodo é um momento propício para não só discutir os riscos, não só revelar a pressão que as populações e floresta vêm sofrendo, mas também passar para o terreno das soluções.”

Em entrevista ao Estado, ele discute como a religião pode se tornar uma aliada da ciência na defesa de uma Amazônia preservada e desenvolvida.

Como será sua participação?

Fui chamado dentro de um grupo de convidados especiais, que inclui (o ex-secretário geral da Organização das Nações Unidas) Ban Ki-Moon e o (economista americano) Jeffrey Sachs (da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da ONU). Será a minha participação oficial, mas vou ficar por uma semana à disposição.

Qual é a mensagem que o senhor vai passar?

Em um primeiro momento minha intenção era falar dos riscos à Amazônia, mas eu fui um dos revisores do documento preparatório do sínodo e lá já está essa identificação do que está acontecendo, a alta do desmatamento, os riscos para o clima, e os organizadores não queriam que eu repetisse isso, mas lançasse alguma ideia nova. Então eu levo a defesa de que o potencial que existe na floresta, que é a biodiversidade, e o conhecimento das populações tradicionais podem levar a uma nova revolução na economia: uma bioeconomia da floresta em pé. Existe um enorme potencial de usar as tecnologias modernas para isso e desenvolver um novo paradigma que garanta que a floresta vale mais em pé que derrubada. Falo das tecnologias modernas que se tornaram acessíveis, amigáveis para as cadeias de produtos da floresta. E mostro o sentido de urgência que precisa pautar essa discussão. O futuro da Amazônia, das pessoas que vivem lá, depende de abandonarmos o modelo atual que destrói a floresta.

Há quatro anos, quando o papa lançou a encíclica Laudato si’, muitos cientistas que trabalham com mudanças climáticas receberam o texto com a esperança de que uma mensagem vinda do maior líder espiritual do mundo poderia ajudar a trazer um senso de moralidade para a questão. Ir além da ciência e mostrar que há um imperativo moral em combater as mudanças climáticas. Passados quatro anos, o senhor acha que isso fez diferença?

Acho que a Laudato si’, ainda que seja um texto religioso, extrapolou sua mensagem para além dos fiéis católicos ao trazer a visão da “nossa casa comum”. Acho que sim, fez diferença. A nossa capacidade de comunicar o risco é limitada. Mesmo com todos os relatórios do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), mesmo com toda a cobertura da imprensa sobre os riscos, sobre o papel das atividades humanas, as emissões de gases de efeito estufa (responsáveis pelo aquecimento global), continuam aumentando. Um setor com tamanha penetração na sociedade, que traga, além da preocupação com a qualidade de vida, mas também com o lado espiritual, é um aliado muito importante.

FONTE: ÉPOCA NEGÓCIOS – https://epocanegocios.globo.com/ 

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