Indígenas da etnia Akroá-Gamela, do município de Viana, no Maranhão, pediram apoio à Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (6CCR/MPF) para verificar a regularidade das investigações sobre o massacre contra a comunidade, ocorrido há mais de dois anos.
Segundo as lideranças do grupo, o inquérito instaurado pela Polícia Federal apresenta graves irregularidades. O encontro, que também contou com representantes do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), aconteceu nesta sexta-feira (23), na sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília.
O conflito aconteceu em maio de 2017, após a retomada de terras pelos indígenas, quando 250 moradores da região atacaram um grupo Gamela com facões, pedaços de madeira e armas de fogo. Cerca de 20 índios foram feridos e dois deles tiveram as mãos amputadas. Segundo o Cimi, desde o início houve resistência por parte da polícia. “Foi muito difícil fazer o delegado escutar os indígenas. Ele afirmou que, no contato visual, não existia semelhança física com índios, e que não existe comunidade indígena constituída naquele território”, relatou representante do órgão.
O Conselho Indigenista ressaltou que os indígenas que tiveram as mãos amputadas no ataque não foram ouvidos no inquérito e que não houve perícia no local do crime. A partir daí, as peças que constituem o inquérito foram feitas de modo a criminalizar os indígenas, tratados como “supostos índios”. Por acreditar que a investigação está sendo conduzida de forma errada, o Cimi pediu à Justiça o trancamento do Inquérito Policial 0495/2017, que ainda não foi finalizado. O processo tramita na 1ª Vara Federal do Estado de Maranhão.
Para Antonio Bigonha, coordenador da 6CCR, o caso é gravíssimo, uma vez que, aparentemente, “existiu omissão e má condução por parte da Polícia Federal”. O subprocurador-geral da República informou que irá “realizar ação conjunta com a Câmara de Controle Externo da Atividade Policial para investigar a conduta dos policiais envolvidos no inquérito”.
Os indígenas afirmaram que o massacre foi arquitetado pelos moradores da cidade de Viana, que não reconhecem os direitos da comunidade indígena. Segundo eles, horas antes do ataque, houve um ato público no município, com a participação de um deputado federal maranhense. A chamada “Marcha da Paz”, anunciada inclusive por uma rádio local, incitou o ódio dos moradores. Em seu discurso, o parlamentar teria afirmado que o evento era para “gente ordeira, que nunca tinha visto um índio ali”.
Reconhecimento e segurança – Os indígenas relataram que, desde o início da retomada de suas terras tradicionais, em 2015, os Akroá-Gamela são alvo de ameaças de moradores, políticos e lideranças religiosas da região. Após o massacre, a violência e hostilidade contra os indígenas de Viana aumentaram. De acordo com o Cimi, o Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos do Maranhão previu uma série de medidas protetivas e elaborou um plano de segurança, mas as medidas ainda não foram implementadas pelos órgãos envolvidos: Funai, Polícia Federal e Secretaria de Segurança Pública do Estado.
Os indígenas também demonstraram apreensão quanto ao reconhecimento das terras dos Akroá-Gamela por parte da Fundação Nacional do Índio (Funai), solicitado em 2015, mas sem previsão de concretização. Em 2016, a Procuradoria Regional do Maranhão ajuizou ação civil em que requereu à Funai a adoção das providências necessárias para apresentação do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) e das medidas para inserir os indígenas nos programas de serviços públicos específicos, especialmente de saúde. O coordenador da 6ª Câmara se comprometeu a acompanhar o cumprimento da decisão, favorável aos pedidos. “Enviaremos ofício para a Funai e para o Ministério da Justiça para que sejam vinculados os recursos necessários ao cumprimento da decisão nos autos da ação”, disse.
Bigonha asseverou ainda que a 6ª Câmara adotará medidas em relação à investigação do massacre e suas possíveis irregularidades, inclusive o envolvimento de agentes públicos. Além disso, afirmou que atuará junto aos órgãos responsáveis para garantir a segurança da população indígena na região.
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