Nesta semana, os povos indígenas do sul e sudeste do Pará promoveram, com apoio da Funai, associações indígenas e instituições parceiras, o I Fórum Regional de Educação Escolar Indígena, em Marabá.
O evento, que ocorreu entre os dias 18 e 20, teve por objetivo elaborar diagnóstico, criar documento com propostas para uma política pública que atenda aos anseios das comunidades no que diz respeito ao tema e formar uma associação de professores da região.
Cerca de 200 pessoas dos povos Aikewara, Amanaye, Anambé, Asurini, Atikun, Akrãtikatêjê, Kyikatêjê, Parkatêjê, Guajajara, Guarani, Kayapó, Parakanã, Xikrin compareceram ao evento, entre lideranças e professores. Também estiveram presentes representantes de instituições que acompanham e participam das discussões sobre Educação Escolar Indígena (EEI) na região, como universidades, órgãos municipais, estaduais e a Funai.
De acordo com Richelly Costa, chefe do Serviço de Promoção dos Direitos Sociais e Cidadania (Sedisc) da Coordenação Regional Baixo Tocantins, a criação do Fórum é um dos resultados do Grupo de Trabalho de Educação Escolar Indígena (GTEEI), uma iniciativa dos povos da região integrada por eles, pela Funai, Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) e por outras instituições de Ensino Superior. “Temos colaborado e debatido junto aos indígenas, considerando as problemáticas vivenciadas por cada etnia, a realidade dos municípios e as dificuldades que têm em considerar a política escolar indígena dentro de suas nuances. Participamos com empenho dessa construção porque ela qualifica especialmente a política indigenista da EEI”, ressalta a servidora.
Rosani Fernandes, indígena Kaingang de Santa Catarina e professora da Faculdade de Educação do Campo na Unifesspa, foi uma das mentoras do evento. Atuante no GTEEI, a professora comemora os resultados do I Fórum sobre o tema na região. “Foram três dias de muita conversa, atividades culturais, apresentações, diálogos, grupos de trabalho. Todos os objetivos foram alcançados. Conseguimos criar a Associação do Sul e Sudeste dos Professores Indígenas do Estado do Pará (APISPA) e elaboramos um documento com as principais propostas para uma política pública no Estado que vai ser encaminhado às secretarias de educação.
O diagnóstico mostrou o que já esperávamos: a situação muito precária das escolas tanto em relação à estrutura física, inexistência de materiais didáticos específicos nas línguas, como em relação aos contratos dos professores que é uma das coisas mais graves que foram apontadas. Tem professores, por exemplo, trabalhando 100 horas nos municípios e recebendo R$ 200. Muitas vezes o dinheiro do pagamento é repassado para uma pessoa que faz a distribuição, ou seja, totalmente ilegal”, pontuou.
De acordo com Ure, uma das principais demandas apresentadas no fórum foi a valorização dos professores indígenas, uma vez que as línguas e a cultura da população não aparecem como componente da matriz curricular da maioria dos municípios.
Winuru Suruí é testemunha ocular de aspectos da realidade comentada por Rosani Ure. Há sete anos atuando como professor de Ensino Religioso e Artes, Winuru é gestor da Escola Sawarapy Surui, na Terra Indígena Sororo, município de Brejo Grande do Araguaia.
A escola onde Winuru trabalha tem algumas características que a tornam exemplar, como o fato de todos os funcionários, sem exceção, serem indígenas, o que corrobora para que as especificidades sejam valorizadas. Para o gestor, isso é reflexo da crescente capacitação dos povos indígenas para trabalhar na área. “Nós estamos cada dia nos capacitando. Aqui a maioria dos professores são graduados. O desafio que enfrentamos é na manutenção de mão de obra qualificada dos professores. A base de tudo é a Educação Básica. Se ela não for de qualidade, lá na frente nossos alunos serão penalizados. Então a gente tem toda uma conversa para que, primeiro, possam ser supridas as necessidades da Educação Básica, mas para que isso possa vir a ocorrer de fato, tem que trabalhar na formação do professor”, alerta.
Mesmo se destacando pela atuação dos profissionais indígenas, a Escola Sawarapy Surui, que atualmente atende cerca de 190 alunos do Ensino Infantil ao Ensino Médio, com baixo índice de evasão, enfrenta uma dificuldade comum a outras da região: a falta de registro como uma escola diretamente vinculada à Secretaria Municipal de Educação. De acordo com Winuru, a maioria das escolas funciona anexa a uma outra não-indígena. “O que precisamos é correr atrás do reconhecimento dessa escola para que ela possa ser, de fato, indígena em tudo, desde sua gestão à parte burocrática-administrativa, tudo que funciona nela, sem que fique anexa a outra escola. Ela deve poder expedir documento sem passar por terceiros e ser registrada nos conselhos estadual e municipal de educação, mas respeitando toda a diferença das especificidades, garantida pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB)”, comenta o professor indígena.
Para Winuru, o que poderia viabilizar ainda mais a construção da escola indígena como espaço de formação que vise não só a educação formal meramente, mas também a cultura e a força do povo, seria a seleção específica para indígenas. “A tendência é que nós consigamos um concurso diferenciado específico para essa categoria de professores, para que nós, aqui do Pará, possamos concorrer só entre nós, do mesmo grupo. Porque aqui no Pará tem um grande número de populações indígenas que falam mais de 30 línguas indígenas, então deve ser priorizada a seleção específica para cada povo. Estamos contando com a ajuda de outros estados como Bahia e Acre para que esse tipo de concurso aconteça”, finalizou.
Kézia Abiorana
Assessoria de Comunicação/Funai
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