A morte da pajé Kuanap Kamayurá, uma senhora de 56 anos, por causa do ataque de uma onça pintada (dia 09/05), causou tristeza e preocupação em quatro comunidades indígenas do Alto Xingu, Mato Grosso. Nos últimos meses foram vistas muitas onças perto das aldeias, o que é raro de acontecer. Essas ocorrências levaram o ICMBio e a Funai a estabelecer ações conjuntas para coibir outros ataques.
Com o objetivo de planejar a captura e remoção de uma das onças, a que tem mais se aproximado das aldeias e que tem sido responsabilizada pelo ataque, o presidente substituto da Fundação Nacional do Índio e diretor de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável, Rodrigo Faleiro, recebeu o presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Paulo Carneiro, nesta quarta-feira (30). Estiveram presentes na reunião Rosana Subirá, coordenadora-geral de Estratégias para a Conservação, Rogério Cunha de Paula, coordenador-substituto do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros (CENAP/ICMBio), e servidores da Fundação.
Rodrigo Faleiro falou sobre a importância de parcerias entre o ICMBio e a Funai. “Ambos os órgãos estão trabalhando juntos no planejamento da captura e remoção daquelas onças, e também no estudo das condições que possam causar prejuízos à biodiversidade em consonância com a proteção das comunidades indígenas. Temos realizado a cooperação por meio de operações diretas em áreas cujas atuações governamentais se interpõem, como é o caso das Terras Indígenas e Unidades de Conservação”, disse Rodrigo.
A figura da onça envolve um universo místico para os povos indígenas do Alto Xingu
“Casos de ataque de onça a indígenas não são usuais. A gente conversa com as pessoas nas aldeias e elas dizem que morte por onça não acontece praticamente em nenhum lugar. É raríssimo. A morte da Sra. Kuanap trouxe um medo muito grande na região”, disse Rogério Cunha. “Depois dos recentes ataques, os indígenas começaram a perceber que estão vulneráveis”, conta o analista ambiental. Ele integrou a equipe que fez a identificação das onças nas aldeias Yawalapiti, Ipawu, Piyulaga e no Posto de Serviços Médicos Leonardo Villas-Bôas – local onde aconteceu o ataque à pajé Kuanap Kamayurá.
Por que os ataques?
A partir da informação de dois ataques feita pelo Instituto Socioambiental (ISA), a equipe do ICMBio buscou o contato com a Funai e começou a investigar as ocorrências envolvendo pessoas e onças na região. O propósito é tentar desvendar por que essas onças estão chegando tão próximas às aldeias e o quanto isso representa de risco para as comunidades indígenas.
Acompanhada por técnicos da Funai, A equipe do ICMBio avaliou as questões ecológicas e ambientais que pudessem ter influência sobre os ataques, o que não é normal no contexto da relações entre indígenas e animais silvestres. “Para muitos indígenas, a onça representa um elemento sagrado. Para outros, essa parte do sagrado se perdeu e eles passaram a considerar a onça como um problema a ser eliminado. Assim, nós trabalhamos tentando ver toda relação da onça com os povos do Alto Xingu. E também mapeamos o quanto que existia de relação negativa, da onça representando o medo”, relata Rogério Cunha.
Rogério Cunha, do ICMBio, instala armadilhas fotográficas acompanhado dos servidores da Funai
Lugares em que ocorreram os ataques:
(a área de amostragem foi de 300 Km²)
– Aldeia Piyulaga
– Aldeia Ipavu
– Posto Avançado Leonardo Villas-Bôas
– Saídão da Fumaça
Na expedição de identificação das onças, a equipe instalou, em 20 locais diferentes, as armadilhas fotográficas para avaliar,além da presença dos animais, a frequência de ocorrência desses bichos ao redor e entre as aldeias. Essas câmeras registraramquatro fêmeas de onça-pintada e um macho considerado animal-problema e suposto responsável pelo ataque à pajéKamayurá. Ele foi o animal mais registrado pelas câmeras rondando o perímetro das aldeias.
Locais onde as câmeras foram instaladas
– Posto de Serviços Médicos Leonardo Villas-Bôas: 4 câmeras
– Aldeia Piyulaga – Waurá: 5 câmeras
– Aldeia Ipawu – Kamayurá: 6 câmeras
– Aldeias Yawalapiti – Amary: 5 câmeras
Também foram feitas 29 entrevistas com indígenas da região onde aconteceram os acidentes envolvendo pessoas e animais domésticos, como os cães.
Crianças indígenas e cachorros das aldeias costumam passear nas áreas em torno das comunidades
As equipes consideraram quatro aspectos para avaliar o risco de ataques de onças:
1. o dia a dia dos indígenas: se eles saem para as roças juntos ou sozinhos, se elas vão acompanhados ou não para o banho na lagoa ou rio, ou se passam por muitos locais de mata fechada, os horários de atividades;
2. as ocorrências de onças: frequência com que elas rondavam as aldeias;
3. a distância em que as onças estiveram em relação às aldeias;
4. a quantidade de cães que haviam sido atacados pelas onças.
Manejo da onça-problema
No curto prazo, o analista ambiental do ICMBio afirmou que a providência a ser tomada é identificar, capturar e remover o animal-problema. A médio e longo prazos, deve-se buscar o manejo dos fatores que estão levando as onças a chegarem perto das aldeias. Pretende-se investigar melhor quais são eles. Entre as sugestões apresentadas estão o aumento do desmatamento e das queimadas nos limites do Parque Indígena do Xingu e a alta quantidade de cães domésticos.
Pretende-se dar continuidade à essas avaliações e monitorar as onças com coleiras de rastreamento por satélite para uma análise de risco mais precisa. A Funai e ICMBio também consideraram a necessidade de se realizar ações de educação com os indígenas para reduzir o medo perante às onças e retomar os valores sagrados da espécie para as etnias. Ambas instituições planejam continuar desenvolvendo as atividades de forma conjunta buscando promover a harmoniosa convivência milenar entre os indígenas do Alto Xingu e os grandes predadores.
(fotos: ICMBio)
FONTE: FUNAI
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