Evento reuniu mais de 200 extrativistas de 45 comunidades e 30 instituições.
As curvas do sinuoso rio Juruá, no estado do Amazonas, guardam uma imensa biodiversidade, riqueza compartilhada e protegida por povos tradicionais, que tem na natureza seu sustento, garantia do modo de vida e identidade cultural.
Por meio da gestão compartilhada dos territórios, quase 700 famílias, 4 mil pessoas vivem nas duas unidades de conservação contíguas, no município de Carauari (AM), nas margens Médio Juruá – a Reserva Extrativista do Médio Juruá (Resex federal) e a Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Uacari (RDS estadual).
Em busca de potencializar as cadeias produtivas já existentes e pensar em cadeias com grande potencial de serem implementadas, mais de 214 extrativistas, representando 45 comunidades, além de 30 instituições governamentais, privadas e ONGs, participaram do Seminário de Cadeias Produtivas da Sociobiodiversidade do Médio Juruá, durante os dias 17 e 19 de outubro.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), por meio da Coordenação Geral de Populações Tradicionais (CGPT), idealizou e articulou o seminário junto com a Associação dos Produtores Rurais de Carauari (Asproc) com a intenção de avaliar o que está sendo feito com as cadeias já existentes e como pensar em novas cadeias produtivas de acordo com as demandas locais, levantando desafios, oportunidades e troca de experiências entre atores envolvidos em cada processo.
Bruna De Vita, Coordenadora da CGPT, diz que sempre que o ICMBio visita as reservas extrativistas, o órgão potencializa também as parcerias. “Buscamos trazer os parceiros mais estratégicos para dentro da reserva, para que eles conheçam a realidade das comunidades e como estão organizados socialmente. O resultado foi que ao longo do seminário muitos parceiros estreitaram laços e trocaram experiências sobre os trabalhos desenvolvidos”.
Para Manuel Siqueira, presidente da Asproc, o seminário foi fundamental para pensar em novos mercados para os produtos extrativos e em como os parceiros e instituições que já trabalham com essas cadeias possam ajudar os coletores do Médio Juruá com novas informações e na busca pela constante melhora na produção.
Outro destaque do seminário foi o debate sobre acesso às políticas públicas pelas associações do Médio Juruá, como a PGPM-Bio, que garante o pagamento de preços mínimos para alguns produtos da sociobiodiversidade. “nossa expectativa com o Seminário é tentar colocar o açaí no PGPM-Bio, porque hoje o valor pago pelo produto na região está abaixo do que é comercializado”, diz Raimundo Notato, Presidente da Associação dos Moradores Extrativistas da Comunidade de São Raimundo.
PARCERIA INTERNACIONAL
Além de instituições brasileiras, dois representantes do Parques Nacionales Naturales de Colombia também estavam presentes durante o seminário para aprender mais sobre como o Brasil executa políticas de fomento às atividades de desenvolvimento sustentável em unidades de conservação de uso sustentável.
Jeronimo Pulido, chefe do Parque Nacional Natural de Chiribiquete, comenta a experiência de ter participado do Seminário: “é muito bom para nós conhecer como o Brasil e suas reservas extrativistas conseguem realizar um trabalho articulado entre as instituições e as comunidades tradicionais, que permitem conservar a biodiversidade, mas que também possibilitam o uso sustentável para melhorar a vida das comunidades.” A visita faz parte de um acordo de colaboração internacional entre a Colômbia e o Brasil.
USO MÚLTIPLO DOS RECURSOS
Pirarucu, murumuru, andiroba, cuúba, açaí, farinha e borracha. São muitos os produtos obtidos com o extrativismo no Médio Juruá, e as populações tradicionais sabem que o manejo correto é a melhor forma de garantir o sustento e ao mesmo tempo preservar a floresta.
Com o tempo, as comunidades se fortaleceram e aprenderam que juntos podem construir uma rede orgânica capaz de fortalecer todo processo de trabalho, aprimorando as cadeias produtivas e agregando valor ao que é extraído da floresta. Isso possibilitou, por exemplo, que aumentasse a oferta de óleos vegetais, como o murumuru, que hoje é vendido integralmente à empresa que utiliza a matéria-prima para produzir cosméticos.
Em 2016, com o apoio da Fundação Banco do Brasil, a Cooperativa de Desenvolvimento Agroextrativista e de Energia do Médio Juruá (CODAEMJ) começou a construção de uma nova planta física e adquirir novos equipamentos para melhorar a produção e a capacidade de processamento de óleos vegetais. Com isso, pretende-se expandir a produção e a qualidade dos produtos, propiciando maior retorno financeiro aos coletores de sementes.
A presença de outras instituições também é fundamental para pensar as cadeias atuais, trazendo empresas que buscam estabelecer uma cadeia sustentável da borracha, com base em modelos de negócios inovadores que promovam condições sustentáveis de produção florestal, ao mesmo tempo que contribuem para a preservação da cultura e desenvolvimento das comunidades extrativistas, de forma a garantir um preço de venda mais justo ao extrativista.
Roberto Wickert, representante da Mercur no seminário, diz que é muito importante ter participado dos debates, para contar a experiência da empresa comprando borracha nativa na região da terra do meio e no Acre. “Ficamos extremamente felizes em chegar em um espaço como esse, do médio Juruá, e ver uma comunidade que já está há quase 30 anos fazendo um trabalho de organização, testando modelos e usando tecnologias sociais que permitem que seja uma comunidade engajada, com boas práticas de gestão e planejamento” complementa.
Além das cadeias já existentes, há uma demanda da comunidade em diversificar as cadeias, como o manejo do jacaré, de quelônios e de madeira. A participação de extrativistas de outras reservas, professores, técnicos e instituições ajudaram as comunidades do médio Juruá a pensar como desenvolver um plano de trabalho levando em consideração os desafios logísticos, legais, mercado e processamento das novas cadeias produtivas.
Bruna De Vita comenta sobre as possibilidades de ampliar as cadeias produtivas na região “quando pensamos no manejo dos quelônios, com uma regulamentação da criação dos quelônios pelas comunidades, também fortalecemos a conservação da biodiversidade. Podemos usar o manejo do Pirarucu como exemplo, onde podemos observar o crescente número de indivíduos ao longo dos anos a partir do manejo”.
Com a possibilidade do manejo, as próprias comunidades passam a vigiar e controlar mais os territórios, extraindo apenas a cota autorizada, inibindo a pesca e coleta ilegal de recursos da região e fazendo também o monitoramento das espécies, de forma a garantir o equilíbrio de todo o ecossistema.
Comunicação ICMBio – Médio Juruá recebe seminário de cadeias produtivas — Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (www.gov.br)